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A nova realeza pedagógica

Com verniz intelectual de fachada, esses novos "educadores" oferecem mais do mesmo, geralmente o substrato do pior da indústria cultural

Publicado em 10/09/2011

por Julio Groppa Aquino


"Xuxa sim! Na proposta de nossa escola, prezamos pelo ecletismo dos conteúdos e das abordagens. Temos sempre o cuidado de estar apresentando os recursos relacionados ao tema trabalhado, de acordo com um planejamento prévio no sentido de estar promovendo o pleno desenvolvimento infantil. Mas não temos preconceito ou proibições. Apenas procuramos explorar a vivência de cada criança no que se refere à construção do conhecimento. Não descartamos o que a criança traz de casa. E, muitas vezes, é Xuxa sim!"

A declaração acima se deu como réplica às interpelações de uma mãe indignada com a "pedagogia" praticada em uma escola de educação infantil onde matriculou seu filho pequeno.

Mais do que um caso isolado, trata-se de uma mostra das distorções a que se pode chegar quando os prestadores de serviços educacionais, sobretudo os particulares, optam por reverberar os chavões de época, a título de bom-mocismo pedagógico. É mostra, também, da associação perniciosa entre ação educativa e indústria cultural.

Piaget, Vygotsky, Wallon, Freinet, Montessori, Ferreiro? Esqueçamo-los. A nova realeza pedagógica agora é constituída por personagens outras, mormente as midiáticas. Não que a nobreza anterior tenha sido guilhotinada por completo; ela sobrevive, mas apenas como chamariz mercadológico. Seus brasões, desprovidos de qualquer significado ulterior, restringem-se à fachada das "propostas pedagógicas" de algumas escolas. Uma logomarca, e olhe lá.

Alardeiam-se noções genéricas de teor construtivista ou ativista, apregoa-se o bem-estar físico e emocional da criança, promete-se desenvolvimento integral de suas capacidades, mas o que lá se pratica é tão-somente a superexposição dos alunos aos repertórios intelectivos de que já dispunham. Saturação pura, jamais diferença e conflito.

Trata-se de uma pedagogia de tipo jabaculê, comprometida com a rendição da curiosidade infantil às produções culturais de última hora – leia-se, o lixo do lixo televisivo, radiofônico, virtual etc. Aquele mesmo que impetra os gerundismos, os bordões propagandísticos, a alegria de viver baseada em ditames de novela das oito. Uma ética de rebanho, enfim. 

Munida de uma versão de mundo de histórias em quadrinhos (imagética, volátil e para sempre infantilizada), a nova realeza pedagógica vai conquistando seus territórios com braço forte, erigindo-os sobre a indigência intelectual de seus súditos, travestida em livre arbítrio democrático, quando não em moralização rasteira.

Aqui e acolá, alguma resistência há, mas invariavelmente em estado de dispersão. Trata-se do gesto daqueles bravos guerreiros que, por meio de combates dissonantes, insistem em assoprar o pó acumulado das estantes das bibliotecas. Aquele gesto pálido que costumávamos denominar docência: substantivo módico, sem pompa, nem elevação.



Julio Groppa Aquino Professor da Faculdade de Educação da USP –



juliogroppa@editorasegmento.com.br


Autor

Julio Groppa Aquino


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