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Ensino 223

O desafio de formar para o mercado

Em um cenário de acirrada concorrência, as iniciativas para aumentar a empregabilidade dos alunos se diversificam e passam a incluir desde atendimento psicológico até a realização de eventos para gestores de RH

Publicado em 20/10/2017

por Marina Kuzuyabu

mercado-capa Guaracy dos Santos e

Guaracy dos Santos e Diego Meyer: programa de mentoria da FMU ajudou a estudante a trilhar os próximos passos da carreira

No mês de junho, a estudante Elize Delabrida Gonçalves, de 19 anos, trocou por duas semanas a fábrica da Mercedes-Benz de São Bernardo do Campo pela de Wörth, na Alemanha.

Estagiária da montadora, a aluna da Faculdade Termomecanica (FTT) foi convidada a fazer o intercâmbio por apresentar um desempenho acima da média. Mérito pessoal e também da instituição em que estuda.

Como a própria Elize reconhece, a elevada carga de atividades práticas na faculdade tem sido fundamental para o seu aproveitamento enquanto estagiária. “Nós lidamos com situações reais o tempo todo e isso faz a diferença”, diz.

As aulas de inglês, que fazem parte da grade curricular, bem como a atitude dos professores, que exigem dos estudantes empenho, dedicação e postura profissional, também são elementos importantes nessa história, ressalta a aluna. “Além das cobranças, os professores ainda incentivam muito os alunos. Eles falam do nosso potencial e, realmente, nos jogam para a frente”, analisa.

De olho na possibilidade de permanecer na montadora e, quem sabe, ter outras vivências internacionais, a estudante retomou as aulas de alemão e já planeja uma pós-graduação. O futuro lhe parece animador.

Foco na empregabilidade

De fato, há todo um suporte na FTT para que alunos como Elize tenham um bom futuro profissional. Como ressalta a diretora Regina Giannotti, todos os cursos têm carga horária acima da exigida pelo MEC e 100% das disciplinas são ministradas presencialmente.

A adoção da prática como componente curricular é outro aspecto importante, bem como a realização de visitas a gestores de RH e eventos com profissionais do mercado.

Ciente da necessidade de ir além das competências técnicas, a instituição ainda mapeia, por meio da aplicação de questionários e da observação dos professores, quais habilidades precisam ser reforçadas. “Recentemente, fizemos uma atividade para que os alunos trabalhassem mais o ‘foco no cliente’”, exemplifica.

Elize Delabrida, da Faculdade Termomecanica: estágio na fábrica da Mercedes na Alemanha foi conquistado com a ajuda da instituição

As competências socioemocionais, aliás, estão em alta nas rodas de discussão sobre empregabilidade. Muitas instituições já perceberam que, além de conferir uma boa formação técnica, é preciso garantir que os jovens cheguem ao mercado sabendo trabalhar em equipe, com facilidade para se comunicar, receptivos às novidades e responsáveis.

O Instituto Mauá de Tecnologia é mais uma das instituições que trabalham nessa linha, tanto que até reformulou seu currículo para acomodar atividades que pudessem desenvolver as soft skills, como também são chamadas as competências socioemocionais.

Além de mexer no currículo, a instituição está reformando seus laboratórios para que os conteúdos sejam trabalhados de forma interdisciplinar e os alunos tenham outras vivências. “Estamos investindo R$ 30 milhões em novos laboratórios para adequar nossa estrutura física a essa nova visão”, conta o pró-reitor Marcello Nitz.

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Atuação em múltiplas frentes

Em tempos de acirrada concorrência, as ações para melhorar a empregabilidade dos alunos se diversificaram; as IES estão promovendo desde acompanhamento psicológico até a realização de programas de mentoria.

“Eu sabia que queria dar um novo rumo para a minha carreira, mas não sabia por onde começar a mudança. Isso agora está claro para mim”, conta Guaracy dos Santos Oliveira Andrade Silva, estudante de Administração do Complexo Educacional FMU|Fiam-FAAM.

No 1º semestre do ano, a aluna de 32 anos participou do programa-piloto de mentoria criado pela instituição. Na média de uma vez por mês, Guaracy se reuniu com Diego Meyer, de 31 anos, para ouvir conselhos e esclarecer dúvidas.

O egresso se formou em Administração há dois anos e desde 2011 trabalha na Deloitte. “Acho importante oferecer esse tipo de suporte para os alunos, pois nessa fase de formação é muito comum aparecerem dúvidas do tipo: ‘será que eu escolhi a carreira certa?’ ou ‘como me insiro nesse mercado?’”, analisa o auditor, que ajudou a aluna Guaracy a perceber o que a motivava e quais caminhos podem levá-la ao seu objetivo. “Em algum momento, eu chegaria às mesmas conclusões, mas isso levaria muito mais tempo”, resume a aluna, contente com o resultado da experiência.

Já a realização de feiras anuais de recrutamento e o convite para que empresários deem palestras aos estudantes são eventos mais recorrentes.

Essas ocasiões têm suas vantagens e oferecem aos jovens oportunidades para que eles escutem as expectativas dos empregadores e adquiram uma visão realista do mercado. Porém, essas ações pontuais não são suficientes para a construção de um relacionamento de qualidade, avalia Luiz Edmundo Rosa, diretor de Desenvolvimento de Pessoas da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH) Brasil.

Em sua opinião, os representantes das IES têm de visitar com mais frequência os gestores de RH para apresentar seus estudantes, falar de seus diferenciais, enfim, divulgá-los.

“Acho que na maioria das IES não há ninguém no organograma responsável pelo relacionamento com as empresas. O marketing não é o departamento mais adequado para isso, até porque essa área tem um foco muito grande no vestibular”, pontua. “A realização dessas feiras uma ou duas vezes por ano segue a lógica do vestibular. Mas os relacionamentos não funcionam assim ”, acredita.

Essa proximidade também poderia abrir uma nova frente de negócios para as IES, alerta o especialista. Tendo em vista que as empresas gastam uma boa parte de seus orçamentos com treinamento de funcionários, muitas vezes por meio de universidades corporativas, uma parte desses recursos poderia ser destinada à criação de cursos customizados. “Há uma frente enorme de parcerias nesse campo”, enfatiza.

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O lado das empresas

Flávio Balestrin, vice-presidente de marketing, RH e canais da Totvs, conta que a empresa é constantemente convidada a dar palestras e participar de feiras de recrutamento.

A companhia ainda mantém relações de proximidade com diversos centros acadêmicos, para onde envia informações sobre vagas abertas e iniciativas como o programa trainee. Mas, além dessas ações, o executivo enxerga espaço para a evolução do relacionamento. “Existe aí um campo fértil para a produção de conhecimento em conjunto; as parcerias podem avançar”, resume.

Na avaliação de Luis Norberto Paschoal, presidente da DPaschoal, as empresas ficam esperando que as IES melhorem a formação dos alunos, dando-lhes mais carga prática, e as IES, por sua vez, esperam que as empresas façam mais programas de trainee para dar aos jovens a oportunidade de aprender na prática. Nesse quase empurra-empurra de responsabilidades, quem se prejudica é o estudante, em sua visão.

O executivo, que assumiu pela primeira vez a presidência da companhia aos 23 anos, concorda que mais empresas deveriam investir em programas trainee. Porém, ele também concorda que as IES, de maneira geral, precisam mudar fundamentalmente a metodologia de ensino.

“É preciso realizar oficinas práticas em praticamente todas as aulas para que os alunos saiam da escola sabendo fazer projetos, sabendo pesquisar, sabendo fazer investigações. Os problemas abordados devem ser reais e as soluções, objetivas. Imagine um estudante de medicina ou de odontologia sem as aulas práticas? Essa formação é inviável. O mesmo pensamento deve valer para as outras carreiras”, pontua.

Enquanto as IES vão tentando dar conta de estreitar o relacionamento com o mercado – algumas com mais sucesso que outras –, vão surgindo iniciativas de agentes intermediários.

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O CIEE, entidade que ajuda os estudantes a encontrar estágios, oferece cursos para ensinar os jovens a trabalhar em equipe, administrar melhor o tempo, melhorar a participação em dinâmicas de grupo, entre outros. Segundo Luiz Gustavo Coppola, superintendente do CIEE, trata-se de cursos comportamentais, pensados para complementar a formação técnica que o aluno recebe no ensino superior.

O Grupo A, holding de soluções educacionais, trouxe ao Brasil a Simplicity, empresa com mais de 20 anos de atuação nos Estados Unidos. Seu foco é melhorar a empregabilidade dos alunos, colocando-os em contato com empresas por meio de uma plataforma on-line.

Nesse canal, as empresas podem publicar vagas e as IES, disponibilizar modelos de currículos, programas de simulação de entrevistas, serviços de mentoria, entre outros produtos.

De acordo com Rodrigo Madeira, gerente da empresa, a vantagem do serviço é a centralização de uma série de ações que, geralmente, são gerenciadas por departamentos diferentes dentro da instituição de ensino – algumas iniciativas são conduzidas pelo marketing, enquanto outras pela central de estágios, por exemplo. A ferramenta também automatiza diversos processos, garante o executivo.

Fora do Brasil, uma iniciativa de destaque é a Demola, organização internacional que aproxima empresas e universidades para desenvolverem projetos em conjunto.

Uma companhia que esteja precisando de uma solução para o seu negócio pode desafiar os estudantes a resolver o problema. Uma vez aceita, a “encomenda” é tratada de forma profissional, com o estabelecimento de prazos e a definição clara dos papéis de cada um. Se bem-sucedido, o projeto pode evoluir e até ser licenciado pela empresa.

Fundada na Finlândia, a organização já está presente em Portugal, França, África do Sul, México e outros países. Não há atuação no Brasil – ainda. No site, há uma convidativa chamada para interessados em operar centros Demola mundo afora.

Autor

Marina Kuzuyabu


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