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A cultura do puxadinho

Pequenas obras, adaptadas, são realidade da escola brasileira

Publicado em 10/09/2011

por Rubem Barros

A manutenção do espaço escolar costuma deixar gestores públicos e privados de cabelo em pé. Não é fácil manter em bom estado um espaço usado por grande contingente de pessoas – a maioria crianças com alta carga de energia física – e que requer sempre adaptações a novas demandas. Por isso, a maioria das escolas brasileiras acaba virando adepta do “puxadinho”, um pequeno acréscimo, geralmente irregular, que se faz à obra original.

“Há um decreto que diz que a escola, para fazer obras, tem de assinar um convênio com o Estado. Na prática, o que ocorre é que a escola consegue doações com a comunidade e constrói sem seguir as normas técnicas. Depois, pedem para regularizar a construção”, conta Selene Barreiros, gerente de projetos da FDE, órgão responsável por prédios novos e reformas no Estado de São Paulo.

Mas as escolas também sofrem com o vandalismo e o mau uso. De janeiro a outubro de 2007, a FDE fez 964 intervenções em escolas, das quais apenas em torno de 30 eram unidades novas. No total, a rede paulista tem 5.220 escolas. Roubo de cabos elétricos, fechaduras, lâmpadas e torneiras estão entre os prejuízos mais freqüentes, ao lado de problemas elétricos, de hidráulica e nos telhados.

Muitos desses problemas podem ser evitados com bons projetos, planejamento das obras e no processo de gestão. Por isso, a FDE trabalha com listagem de componentes predeterminados, já testados quanto à durabilidade.

José Carlos Sussekind, engenheiro que acompanhou Oscar Niemeyer nas obras dos Cieps, conta que a constatação de que “sempre existe verba para construir e inaugurar, mas nunca para manter” foi decisiva para a escolha de alguns componentes nas escolas fluminenses. “Buscamos coisas que não quebrassem, como esquadrias basculantes de alumínio, sem vidro, e o piso do tipo granilit, que só precisa lavar”, lembra.

Ezequiel Teodoro, ex-secretário municipal de Educação de Campinas e atual presidente da Associação de Leitura do Brasil, levanta outra questão: “Normalmente, quem constrói não é a secretaria de Educação, é a de Obras. Quando fui secretário, vi creches em que não se conseguia acomodar um berço”.

João Honório de Mello Filho introduziu alguns princípios para a construção de edifícios públicos enquanto estava à frente da Conesp, órgão que antecedeu à FDE. Os principais são que cada escola tenha um projeto individualizado, acompanhado por um arquiteto responsável, e que as unidades sejam pequenas, de no máximo 12 classes, o que facilita a gestão. “Um projeto bem feito leva de 4 a 5 meses para ser definido, e não 20 dias, como andam querendo que os arquitetos façam.” Para ele, os prédios estão sujeitos à obsolescência funcional, o que não se deve confundir  com o colapso físico. “Não se pode fazer tudo com os materiais mais baratos, como manda a lei de licitações.”

Ao lado do projeto arquitetônico e pedagógico, o projeto de gestão foi um dos eixos centrais da concepção dos CEUs construídos pela prefeitura paulistana na gestão de Marta Suplicy. Para Alexandre Delijaicov, um dos responsáveis pela articulação dessas praças de equipamentos sociais, a gestão conjunta com a comunidade é fundamental. “Usamos um esqueleto pré-fabricado, mas fizemos as vedações com sistema construtivo convencional. Dessa forma, arregimentávamos de 500 a 600 pessoas da vizinhança em cada obra. Gerávamos empregos na região e fazíamos com que as pessoas se sentissem parte daquele espaço”, diz. O projeto também foi concebido para permitir ampliações futuras, decorrentes das demandas locais. “A idéia dos puxadinhos está escancarada nos CEUs”, conclui Delijaicov.



Espaço da maturidade

A faixa etária de cada criança determina o espaço físico. A partir dessa relevante premissa da pedagogia Waldorf, a Escola Waldorf Rudolf Steiner, que neste ano completa 50 anos, tem um arranjo bastante particular de seu espaço.

Baseada nos princípios da antroposofia do austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), a Waldorf é uma das novas pedagogias que despontaram na virada do século 19 para o 20. Um de seus pontos-chave é a divisão da vida humana em setênios, ou períodos de sete anos. Assim, a vida escolar compreenderia três setênios (0 a 7 anos, 7 a 14 anos e 14 a 21 anos). Ao final de cada um deles, a criança atingiria um certo grau de amadurecimento em relação a uma questão central: escolar, no primeiro; sexual, no segundo; social, no terceiro. Isso significa que pode começar a, de alguma forma, vivenciá-la.

O primeiro reflexo tangível disso é que as crianças das escolas Waldorf só são alfabetizadas a partir dos 7 anos. Antes disso, trabalham com a imitação e com a absorção de ritmos que dão sentido temporal. “Nessa fase, a atenção está voltada aos membros, por isso há muitas atividades físicas”, explica Helena Birai, professora do 6º ano.

Até o 8º ano, os alunos seguem com professores generalistas. Só no último ano do Fundamental II, ao entrarem no 3º setênio, passam a ter professores especialistas.

A tradução espacial mais evidente do percurso acontece no pátio da escola. No 1º ano do fundamental, os alunos ficam em um pátio redondo, mais fechado. No 2º ano, passam para um pátio duplo; do 3º ao 5º ano, têm uma área comum, e assim sucessivamente, até o 3º ano do ensino médio.

“As áreas têm um formato de caracol que desembocam nesse grande pátio que é o centro da escola, para onde convergem todos os prédios. Em cada um deles, está refletido o desafio pelo qual as crianças daquela idade têm de passar. A cada ano conquistam um degrau nessa trajetória, que culmina com a chegada ao centro”, explica Helena. Esse desenho, como alerta a professora, é próprio da Rudolf Steiner. “Ele reflete a nossa história”, diz.

Autor

Rubem Barros


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