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Da teoria na formação docente

A experiência do trabalhador e suas concepções sobre o trabalho não são supérfluas

Um jornal paulistano publicou recentemente uma série de matérias sobre problemas da educação brasileira contemporânea. Dentre elas uma que gerou grande polêmica na comunidade acadêmica. Sua tese central era a de que o excesso de aportes teóricos – e a falta de elementos práticos – seriam os elementos responsáveis pela má formação de professores. As reações indignadas, contudo, pouco cooperaram para elucidar a complexidade do tema e a peculiaridade do desafio da formação de professores.
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É um fato inegável que o objetivo último de um curso de formação de professores é a preparação de profissionais cuja tarefa será a de resolver problemas práticos. Tal como no caso de um médico ou de um engenheiro, um professor demonstra sua excelência profissional não pela posse de proposições teóricas, mas por sua capacidade de resolver problemas práticos no exercício cotidiano de sua profissão. E tanto é assim que não necessariamente um professor de didática é alguém cujas aulas devam ser tomadas como um modelo a ser emulado. A posse de “verdades teóricas” sobre o ensino não capacita aquele que as detém a ser qualificado como um bom professor. Não é raro que um especialista em Emília Ferreiro não saiba alfabetizar; nem que alguém que dela jamais tenha ouvido falar possa vir a ser considerado(a) um(a) grande alfabetizador(a). Mas, da constatação dessa verdade trivial para a desqualificação do lugar da teoria na formação de professores há um abismo.


Há, de fato, profissões em que as concepções daquele que trabalha pouco interferem no resultado final de suas atividades. Tomemos o exemplo de um pintor de automóveis. Uma mesma técnica adequadamente aplicada por duas pessoas diferentes produz resultados iguais ou pelo menos muito semelhantes. Isso porque a chapa de aço reage ao que a ela se faz, independentemente de quem o faça. E assim parece ser para a produção de qualquer objeto a partir de técnicas industriais. Por essa razão a indústria automobilística pode substituir um operário por outro sem que se note grande mudança na qualidade do produto final. A técnica padronizada torna supérflua a experiência do trabalhador e suas concepções sobre o trabalho que realiza. Mas o mesmo não se passa no processo educativo.


Um professor não produz objetos, mas interage com sujeitos. E esses reagem não simplesmente ao que a eles se faz ou se propõe, mas também a quem o faz. O êxito de uma aula depende tanto dos procedimentos adotados como da singularidade pessoal daquele que os executa. Daí porque dois professores que recorrem à mesma técnica podem ter resultados tão díspares. Daí porque dois professores radicalmente diferentes em seus procedimentos podem ser considerados igualmente excelentes. O êxito do ato educativo depende tanto da adequação de técnicas e procedimentos como da visão de um professor sobre o sentido da ação educativa, sobre a igualdade (ou desigualdade) das inteligências de seus alunos, sobre o papel da avaliação no processo educativo.


*José Sérgio Fonseca de Carvalho
Doutor em filosofia da educação pela Feusp e pesquisador convidado da Universidade Paris VII
jsfc@editorasegmento.com.br

Autor

José Sérgio Fonseca de Carvalho


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