NOTÍCIA

Edição 238

Diretora da Escola da Vila fala sobre venda e novos rumos da instituição

Sonia Barreira conta em entrevista como ela e suas quatro sócias chegaram à decisão de negociar 80% da escola com uma empresa de investimentos e relata perspectivas futuras

Publicado em 10/04/2017

por Rubem Barros

_MOR1497 Educadora Sonia Barreira, da Escola da Vila | Foto: Gustavo Morita

Diretora da Escola da Vila fala sobre venda e novos rumos da instituição

Crédito: © Gustavo Morita

Quando, em meados de fevereiro último, a venda de 80% da Escola da Vila a uma empresa de investimentos ganhou o noticiário, houve um misto de estupefação e desânimo por parte de muitos pais e educadores simpáticos à visão mais humanista proposta pela instituição, um dos símbolos do construtivismo na cidade de São Paulo.

Houve muitos questionamentos após a venda e mostras de insatisfação nas redes sociais. Em meio às negociações e sua repercussão, Sonia Barreira, diretora-geral e única sócia fundadora remanescente, tem buscado conciliar análise de mercado, perenização do projeto e a construção de garantias para os pais dos quase 1,6 mil alunos divididos em três unidades na região metropolitana de São Paulo.

Segundo ela, a venda aos investidores foi a saída para a escola manter a capacidade de investimento e para enfrentar concorrentes sem perder a identidade. Leia, a seguir, a entrevista que ela concedeu para falar do atual momento de sua escola e seus horizontes.

O que levou a Escola da Vila a associar-se ao grupo Bahema?
Quando a Escola da Vila nasceu, em 1980, tinha oito, nove sócias e funcionava quase num regime de cooperativa. O crescimento trouxe um conjunto de situações novas que fizeram com que alguns sócios saíssem. Hoje, a única sócia fundadora sou eu. A escola viveu um primeiro momento de dificuldade quando precisou se profissionalizar. Vimos que precisava se constituir como empresa, percepção que não tínhamos antes. Tivemos uma primeira assessoria e fortalecemos os nossos conhecimentos para gerenciar a escola de forma mais profissional.

Isso no final dos anos 80?
Exatamente. Mais tarde houve uma nova onda de crescimento, e entendemos que precisaríamos ter mais poder de investimento. Para isso, decidimos crescer e, em 1995, compramos o Colégio Fernando Pessoa, que estava falido, e viemos para esta unidade [Morumbi] para manter os alunos de fundamental 2 que saíam, garantir o crescimento e ter uma sustentabilidade maior. Mais tarde, fizemos esse mesmo movimento em relação à Granja Viana. Naquele momento, já havia uma reflexão interna, estratégica, de que a escola enfrentaria dificuldades de investimento para o futuro. Fomos para a Granja porque não havia investimento. Nos demos conta de que a concorrência estava acirrada – fazemos pesquisa para saber para onde vão os alunos que desistem da vaga – e notamos que a força do projeto pedagógico da escola continuava, era um diferencial importante, mas, no frigir dos ovos, acabávamos perdendo alunos em função de infraestrutura, oferta de serviços complementares. Vimos um enfraquecimento da escola nesse sentido.

Como era a concorrência?
No Butantã, havia escolas com o mesmo discurso e um alto poder de investimento. No Morumbi, a mesma coisa: escolas com alto poder de investimento subsidiadas por outros governos, religiosas, escolas que são associações ou fundações com isenção fiscal. E a nossa escola, como poucas outras, não tem isso. Começamos a ver também que nossa condição de remunerar adequadamente os professores estava ficando fragilizada. Nossa responsabilidade é pensar estrategicamente. Dois anos atrás, começamos a nos abrir para a possibilidade de ter um sócio-investidor. Fomos procurados por dois grupos ingleses. Descartamos o primeiro, pois iriam querer dar um choque de gestão e imediatamente revender a escola, o que seria sua morte. O segundo grupo tinha à frente da negociação uma educadora interessante, que nos seduziu com a possibilidade de acrescentar coisas novas ao projeto da escola. Essa negociação durou mais, até que entendemos que a cultura geral do grupo não era compatível com a escola. Nesse processo, aprendemos uma série de coisas. Ao mesmo tempo, foi uma negociação longa, cansativa, e vimos que, num certo sentido, estávamos apoiando um movimento de chegada de grupos internacionais à educação brasileira, que não era aquilo no que acreditávamos. E que não nos daria as três garantias de que essa escola precisava.

Quais seriam?
Perenização, sustentabilidade e resolução de questões sucessórias, pois quando um sócio-sênior sai, a escola precisa remunerá-lo. Pelas nossas características, não é possível vender a um terceiro sócio que venha a ficar por um pequeno período. Ou há uma sociedade de trabalho, ou um sócio-investidor. Nos recolhemos e pensamos: “vamos nos organizar e criar novos modelos”. Um ano depois, veio a crise, os pais começaram a ficar desempregados. No ano passado [2016], a situação ficou alarmante, com o crescimento de pedidos de bolsas, muitas famílias com gente desempregada. Tivemos de fazer concessões, pois não iríamos deixar um aluno com sete, oito anos de escola terminar o curso em outro lugar. Temos um diálogo próximo com as famílias. Essa situação fez com que nos abríssemos de novo. Em meados do segundo semestre de 2016, conhecemos o grupo Bahema e seus dois responsáveis, o Guilherme e o Fred, que vieram conhecer a escola. Fizemos uma apresentação, eles tinham a ideia de fazer um grupo de escolas com determinadas características. De imediato, dissemos que não estávamos interessados. Mas passamos a funcionar quase como uma consultoria [falando sobre o perfil de escolas do mercado que conheciam]. Em algum momento desse processo, analisando com minhas [quatro] sócias o planejamento estratégico da escola, como íamos nos virar daqui pra frente, falei: “esse grupo pode dar para a gente exatamente o que precisamos. Por que não abrimos um diálogo com eles?”. E começamos a negociar. Por que eles? Porque nos garantiam coisas de que precisávamos. Como empresa, eles têm tradição de ficar dentro do negócio 25, 30 anos; como pessoas, traziam a convicção de, não sendo do mercado, depender exclusivamente da nossa atuação e da nossa linhagem interna; como propósito, tinham a clareza de que era esse tipo de projeto que queriam.

Algo mais ajudou na definição?
Começamos a dialogar e definimos a nossa possibilidade real de fazer o negócio quando eles nos disseram que estavam em tratativas com a Escola Parque, do Rio de Janeiro, e a Escola Balão, de Belo Horizonte. São duas escolas-irmãs históricas da Escola da Vila, ambas dez anos mais velhas do que nós. Logo que começamos, nas primeiras atividades no Centro de Formação, eram nossas parceiras. Fazíamos muitas coisas juntas e temos muita identidade. Esse foi outro componente que nos seduziu, pois, além de resolver um problema dessa instituição, fortaleceria o modelo pedagógico, que tem sido amea­çado pelo movimento dos grupos e concorrências no cenário educacional. Poderíamos, então, fortalecer escolas mais artesanais, com propostas construtivistas e forte compromisso com a formação dos professores. A partir daí, ficamos todos mais confortáveis de entrar nesse projeto.

Em que momento vocês abriram a negociação para além do grupo de sócias?
Informalmente, em situações em que analisava novas demandas que a escola tem, eu vinha acenando para muitas pessoas da equipe a necessidade de um sócio-investidor. Oficialmente, para os pais, só pudemos avisar no começo deste ano, quando o negócio foi feito. Tínhamos uma cláusula de sigilo pelo fato de a Bahema ser uma empresa de capital aberto.

O contrato tem algum termo que dê garantia de continuidade da linha pedagógica da escola?
Um aspecto importante, que tenho dito aos pais, é que pode haver garantias por escrito, contrato, compromissos públicos, mas para transformar uma escola como essa, para modificá-la, não se faz isso de forma sorrateira, tem de ser de forma muito visível. Seria preciso mandar embora metade dos professores e demitir a equipe técnica. A escola é muito comprometida com seu projeto. Outro fator básico é que se houvesse interesse da parte desses investidores de comprar três escolas com esse DNA forte para modificá-las, eles seriam no mínimo maus avaliadores, estariam jogando dinheiro fora. Seria muito mais fácil comprar escolas que têm rentabilidade, disponíveis no mercado – eu poderia dar a eles dez nomes – facilmente passíveis de serem submetidas a um projeto apostilado, a diferentes diretrizes pedagógicas e educacionais porque já são mais alinhadas com outro modo de pensar. Se há real­mente uma intenção de ter retorno financeiro e de fazer esse grupo ter força, a única saída possível é fortalecer o ativo que eles compraram. Não tenho dúvida de que isso vai acontecer. O fato é que no processo comunicacional se gerou insegurança para os pais. Então, tratamos de organizar um conjunto de reuniões – já fizemos 11 em 15 dias – para de fato garantir a eles a nossa presença e o nosso compromisso. Não dediquei 37 anos da minha vida a um projeto em que acredito, para, na hora de garantir a sua perenidade, entregar nas mãos de quem iria destruí-lo. Seria no mínimo insensatez.

E como avalia a digestão dessas informações por parte dos pais neste momento?
Depois dessas reuniões muitos pais ficaram mais tranquilos, estão tentando se agrupar para definir de que garantias gostariam. Recebi um grupo de 10 pais [que falavam em nome de outros 150] que trouxe propostas interessantes sobre o que eles gostariam de ter como parâmetros para analisar a mudança ou não do projeto. Imediatamente, dei a eles uma solução melhor: estamos desenvolvendo um documento, que são os 12 pontos que caracterizam o projeto pedagógico da Escola da Vila, com indicadores, para que eles possam monitorá-los. Isso fortalecerá a presença dos pais.

Qual a natureza desses indicadores? Pedagógica ou variada?
Pedagógica, administrativa, número de alunos por classe, porcentagem de alunos com bolsa, porcentagem de alunos de inclusão, tendência de crescimento desses números, processos de composição de equipe, critérios de contratação, instâncias de participação no projeto pedagógico… Não terminei ainda, são 12 pontos, mas temo que virem 14. Devemos lançar brevemente, pois nosso compromisso com os pais é, depois dessas reu­niões, oferecer mecanismos e documentos que sejam mais do que a nossa palavra e leitura da situação.

Como fica o Centro de Formação?
O Centro vem sofrendo o enfrentamento de uma concorrência severa, dificuldades maiores do que na escola. Fizemos cortes no Centro, coisa que não precisamos fazer na escola, e acho que agora não vamos mais precisar. Nos últimos anos apareceu uma oferta enorme de cursos e atividades formativas de todo tipo, às vezes cursos muito rápidos, oferta de técnicas para os professores. Mas o professor às vezes tem pouco poder aquisitivo e pressa, e é seduzido por esse tipo de solução, pois se atualiza rapidamente. No ano passado, tivemos de congelar o valor da hora/aula do nosso formador, o que estava sendo difícil para nós, pois o professor da Escola da Vila tem uma perspectiva formativa, de crescimento profissional, que passa pelo Centro de Formação. Isso complementa a renda do professor. Ainda não temos um novo planejamento estratégico para o Centro, mas há algumas preocupações.

Quais são?
Os nossos professores já nos demandaram se o Centro vai mudar de perfil, se vai empacotar, vender em massa, virar sistema. Não temos intenção nem talento para fazer isso. O curso que a gente dá é modificado no ano seguinte, pois já mudamos a nossa prática. O que talvez a gente possa fazer é tentar atingir novos públicos e ter uma oferta maior de vagas para a escola pública, porque perdemos esse público em função do preço. Mas isso é desejo, não planejamento. São algumas opções estratégicas que o centro pode fazer para fortalecer a oferta estando integrado à escola. Na nossa perspectiva, não haverá mudança em relação aos produtos que ele oferece.

O processo de concentração ocorrido no ensino superior pode se repetir na educação básica privada e empobrecer a oferta?
Vejo isso com preocupação. Nossa opção por esse grupo se deve ao fato de o projeto deles ser diferente. Tanto que entraram em escolas onde isso é quase impossível de ser feito, pois são artesanais, sensíveis a corte de pessoal. Mas isso acontece em outros grupos, que têm projeto não só de corte de custos, mas de empacotamento, de padronização, de soluções prontas e retirada de autonomia do professor no processo educacional, com tudo estruturado e pronto. Por isso, gostaríamos de mostrar que é possível sobreviver, dar resultado e continuar formando cidadãos críticos.

Que tipo de interação haverá entre as três escolas?
Desde o começo montamos um comitê interescolar para analisar e propor uma agenda de atividades que favoreçam a troca de boas práticas e potencializem certos projetos. Queremos conhecer projetos interessantes que são feitos em uma escola e não na outra. O projeto de sustentabilidade da Escola da Vila não é muito bom, já o da Parque é muito forte. O contrário também: nosso projeto de formação de leitores e escritores é modelo, poderia ser objeto de troca e investigação. E também podemos fazer eventos comuns. A escola tem um simpósio interno que cresceu e poderia contar com a participação das outras escolas. Tudo isso será analisado nesse comitê, com representantes das três escolas e uma pedagoga contratada pela Bahema para fazer a articulação.

Qual sua opinião sobre a reforma do ensino médio?
Acho que qualquer educador diria que há aspectos fundamentais e relevantes na reforma do ensino médio. De fato, a etapa, em nível nacional, carece de transformação. A questão dos itinerários ainda não está suficientemente clara, a Base ainda não saiu. Portanto, não fica claro se serão completamente separados, se haverá pontos comuns, qual o grau de autonomia das escolas (ainda a ser regulamentado pelos estados). Nesse ponto, essa ação interescolar pode ser muito favorável. Podemos preparar discussões conjuntas, assessorias comuns para que cada escola possa tomar decisões em função do seu público. De nossa parte, temos algumas convicções. Por exemplo, as ciências humanas e as artes são fundamentais para a formação de um cidadão crítico. Precisamos entender o que é a obrigatoriedade para poder articular com essas convicções, pois não vamos abrir mão de dar uma formação humanística aos nossos alunos.

E quanto aos itinerários?
Cinco itinerários me parece impossível que ofereçamos. Não vejo como, pelo número de alunos que temos. Em tese, temos condição de oferecer três.

Quais?
Isso depende de construção com a equipe, que tem de abraçar esse projeto. Temos um processo de análise, de discussão, de proposição e de alinhamento a uma proposta que dê continuidade à formação em que acreditamos.

Como vê o currículo dividido por áreas do saber?
É uma questão complicada, talvez nem tanto para a nossa equipe porque temos uma trajetória intensa de projetos interdisciplinares. Os professores gostam de projetos em que haja parceria, conexão entre o que se faz em uma e outra disciplina. Do ponto de vista do aluno, acho que a gente inflaciona muito as tarefas dele com muitas provas e trabalhos. Ele pode fazer um trabalho a ser avaliado por saberes distintos, algo que a gente já faz. Chamamos isso de tarefas complexas, com dois ou três professores para avaliar. Mas essa será uma grande questão para as escolas. A capacitação, a formação dos professores, para eles atuarem numa perspectiva diferente. Não basta a reforma no papel. Ela vai ter de se concretizar em dez anos.

Isso sem abrir mão de algo fundamental que é a especialização do professor. Por mais que desejemos que o professor possa navegar e abordar diferentes aspectos, vemos que, quando ele tem uma formação muito boa dentro de sua a área, ele cresce aos olhos dos alunos, consegue encantá-los com o conhecimento. O valor desse conhecimento fica explicitado para o aluno, não só porque ele gosta do que está aprendendo, mas porque admira a sua potência. Isso não pode ser perdido. Então, além de projetos integrados, temos de considerar o papel, o lugar do conhecimento especializado. Será preciso um projeto de muitos anos para saber como isso vai ser resolvido no plano da formação.


Confira abaixo o complemento da entrevista, conteúdo exclusivo do site da Revista Educação:

Que diferenças assinalaria entre o jovem de hoje e aquele de quando a Escola da Vila começou, nos anos 80?

Em linhas gerais, a adolescência ganhou muita importância na nossa sociedade, passou a ocupar um espaço de destaque. As crianças pequenas querem logo ser adolescentes, as pessoas adultas querem fazer coisas parecidas com os adolescentes, como colocar piercing, tatuagem etc. Os filhos passaram a ter uma centralidade na vida dos pais muito distinta do que nós tivemos. Não é uma questão de serem mais ou menos amados. Há um desejo de que eles não se frustrem. Talvez lá atrás os pais contassem com a frustração como algo formativo. Hoje, temos um jovem que é poderoso, reflexivo, participativo, não aceita qualquer coisa. E, como todo jovem, curioso, que quer aprender. Se ele encontra um projeto formativo que faça sentido para ele, embarca, abraça, convive bem com o adulto. Se encontra um projeto que o trata como um ser não é pensante, como um sujeito a ser adestrado, reage. A diferença é essa. Como são assim, eles trazem temas novos. Todos os anos há algum tema com o qual não sabemos lidar.

Hoje há um discurso dominante sobre metodologias ativas e sobre um professor mediador. O quanto isso é efetivamente novo? E quanto um professor com ótima formação ainda pode fazer da aula tradicional algo motivador e interessante?

Hoje, todos os setores da sociedade são especializados em educação. Os economistas sabem como deve ser a educação do professor, os tecnólogos inventaram metodologias incríveis, que desconhecíamos… O que vejo é uma grande parcela da sociedade descobrindo que as metodologias precisam ser mais motivadoras, desenvolvendo técnicas superficiais que têm como base um imenso conjunto de coisas que já fazíamos – e que basicamente têm uma única função: fazer o sujeito pensar. E você pode fazer o sujeito pensar fazendo uma aula expositiva. Há duas ou três coisas de que você tem de cuidar, mas é evidente que é possível. Você tem de achar uma fórmula, um mecanismo de devolver o sujeito à tarefa da reflexão. Agora flipped classroom, trabalhos em dupla – fui assistir a uma palestra de um profissional que veio dos Estados Unidos para falar da importância do trabalho em dupla. Falamos disso há 30 anos, nossos alunos só sentam em dupla. Nos nossos ginásios experimentais, referência importantíssima que perdemos, a interação entre os alunos era a base da reflexão. A Escola da Vila é herdeira desse tipo de pensamento e criou seu modelo por esse caminho. Hoje, há na sociedade uma descoberta de algumas coisas que já eram conhecidas dos educadores, mas que agora têm novos nomes. Na educação infantil, a pedagogia do afeto, a importância do brincar. Vejo isso com crítica, mas tem sua importância, pois as pessoas estão se aproximando da ideia de que o aluno na escola tem uma função, que é a de ser sujeito, refletir, analisar, discutir, pensar, fazer o trabalho intelectual. Se você consegue fazer o sujeito fazer o trabalho intelectual, o aprendizado faz sentido para ele. E, sim, quem é que não ama assistir a uma palestra,uma exposição bem feita, com lógica interna, questionamento, com motivação? Todo mundo aprende com uma boa aula expositiva, não há nenhuma razão de não haver aula expositiva. Isso que as pessoas falam: “a sala de aula de hoje é igual à sala de aula do século 19” é uma bobagem de senso comum que você vê em todas as palestras. A escola sempre trabalhou tendo um valor essencial que é a cooperação. Agora, os tecnólogos chamam de colaboração. Colaborar é ajudar, não é cooperar. Há uma diferença abismal entre cooperar e colaborar. Então, é uma tentativa de usar uma série de metodologias complexas, difíceis, que demandam estudo e aprofundamento, de uma forma superficial, baseada em técnicas americanas.

No caso da educação pública, quais fatores você acredita que possam ser os grandes diferenciais para fazê-la deslanchar?

Não sou a pessoa mais adequada para fazer uma análise sobre a educação pública, apesar de já ter atuado muito em projetos de formação de professores da rede pública, mas no passado. É uma tarefa hercúlea melhorar a educação básica no Brasil. Se eu tivesse de apostar minhas fichas em uma coisa, faria o contrário do que todo mundo está dizendo: apostaria em aumentar o salário dos professores, pois isso leva à valorização da carreira. As pessoas dizem: “ah, mas os professores hoje não valem isso”. Ok, mas isso atrai novas pessoas, com formação melhor, cria a carreira. O professor tem uma condição profissional muito precária na escola pública. Quando os municípios conseguem pagar um salário maior e há mais competitividade, atraem gente mais bem formada para a profissão, há resultados melhores. Não acredito que seja o material estruturado, acho que a formação e os projetos de formação continuada são importantes, mas a valorização do professor é essencial. E é a coisa mais difícil de ser feita.

O fundamental 2 tem sido um calcanhar de Aquiles na educação brasileira. Por quê?

Eu não ousaria explicar. Mas, se você olhar a Base Nacional, ela tem uma proposta muito interessante e inovadora para a educação infantil, tem essa preocupação de reforma no ensino médio, e no fundamental 1 e 2 ela é muito conteudista. Não sei como vai ser a terceira versão. Mas é interessante como esse meio do caminho, tão essencial e fundamental, não está sendo objeto do mesmo tipo de preocupação que se está tendo nas pontas. O fundamental 2, em especial, tem o mesmo conjunto de disciplinas excessivas; tem a figura do professor especialista, graduado na sua disciplina e, portanto, com menos formação pedagógica, já para a criança aos 11 anos de idade. É um segmento que demanda muita atenção. Aqui na nossa escola é o segmento que tem mais processo formativo, mais atenção com o professor que está recebendo aquela criança. O do fundamental 1 é polivante e já tem essa formação; o de ensino médio, o menino já está mais fortalecido nas suas relações interpessoais. O fundamental 2 demanda um processo formativo muito intenso e uma equipe muito sensível a esse momento de desenvolvimento da criança que não é mais criança nem adolescente, é pré-adolescente. Então há uma preocupação que não está posta e precisa de mais atenção. Aqui na escola dedicamos uma atenção imensa ao fundamental 2. Até porque todo mundo sente a passagem, os alunos, os pais, os professores sentem o recebimento do aluno, é um momento de fato bastante sensível.

Autor

Rubem Barros


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