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O plano B

Na escola ou fora dela, jogos e métodos milenares ajudam a desenvolver ou estimular capacidades

Publicado em 10/09/2011

por Henrique Ostronoff

Professores e educadores são praticamente unânimes em indicar recursos alternativos ou complementares para o ensino da matemática, principalmente nos níveis médio e fundamental. Não só como meios para incrementar o desenvolvimento do raciocínio matemático, como para tornar mais interessantes as aulas da matéria, nas quais muitos alunos vêem certa aridez e apresentam dificuldades para acompanhá-la. Também há cursos extracurriculares com métodos que prometem suporte para estudantes e não-estudantes que queiram melhorar seu desempenho em matemática ou aprimorar o raciocínio lógico.

Uma ferramenta muito utilizada nas salas de aula são os jogos, que podem ajudar o aluno desde os anos iniciais da escola a obter as primeiras noções de matemática, como as operações. A educadora Kátia Stocco Smole, coordenadora do Grupo Mathema, especializado em pesquisas e projetos na área de ensino de matemática, costuma sugerir a aplicação desse recurso em cursos de formação de professores. "O jogo tem diversas vantagens, pois abre espaço para o aluno aprender muita matemática, conviver com o outro, interpretar o significado de regras e desenvolver valores." Ela dá como exemplo o pega-varetas, que incentiva operações de adicionar para o aluno saber quantas varetas pegou, quantos pontos fez e se perdeu ou ganhou. No entanto, Smole, doutora em Ensino de Matemática pela Faculdade de Educação da USP, observa que não é possível ensinar a disciplina em todos os níveis apenas com jogos ou livros e apostilas. "O ideal é que se lance mão de muitos recursos para fazer o aluno aprender", afirma.

O professor Carlos Matumoto introduziu jogos para os alunos da 5a à 8a série do Colégio Equipe: Torre de Hanói (tipo de quebra-cabeça com três colunas e discos de diâmetros diferentes, que devem ser movimentados da primeira à ultima coluna sendo proibida a colocação de discos maiores sobre menores), o hoje popular sudoku (espécie de versão matemática das palavras cruzadas, composta de nove blocos divididos em 9 grades de 3×3 quadrados cada, cujo objetivo é preenchê-los com algarismos de 1 a 9, evitando-se repetições em determinadas posições) e xadrez. A importância dos jogos nas aulas de matemática está em fazer com que cada aluno construa seu próprio raciocínio: "Você não mostra qual é a melhor estratégia de ataque necessária no jogo de xadrez. Ele desenvolve jogando. Mas também não é simplesmente jogando. Ele vai ter de redigir uma estratégia. Aconteceu com o sudoku e a torre de Hanói também", diz. O processo, segundo Matumoto, é depois transferido para a resolução de problemas. "Quando o aluno constrói uma estratégia, ele tem passos desenvolvidos para obter um resultado eficiente. Ele sabe que vai ter de fazer isso quando tiver de aprender um conceito novo de matemática. Ele não precisa receber isso de uma forma preparada e passiva", explica.

O Colégio São Sabas, de São Paulo, desenvolveu o Projeto Akatu, um programa interdisciplinar que tem a matemática como base. Grupos de 5 a 6 alunos do 9o ano do ensino fundamental são incumbidos de criar empresas fictícias e administrá-las.

No início do ano letivo, são abertas empresas com um capital virtual que deve ser utilizado em áreas como mar­keting, publicidade, compra de matérias-primas e maquinário, salários de empregados e também na aplicação na bolsa de valores. Os alunos ficam responsáveis por todas os ações necessárias para a geração e manutenção de uma fábrica de sucos – se dedicam a pesquisas de mercado e levantamentos de preços para definir os produtos mais promissores em termos de vendas, projetam as instalações industriais, buscam as localizações com os melhores aluguéis, estabelecem organogramas, desenvolvem marcas e rótulos, calculam os valores nutricionais dos sucos, entre outras atividades. O fluxo de caixa é registrado em planilhas e cada grupo de "empresários" compartilha com a classe suas experiências. O objetivo do projeto é fazer com que, simulando negócios reais, as empresas obtenham lucro e a mais bem-sucedida é considerada a vencedora. Apesar da determinação de que não podem falir, em 2007, das 16 fábricas, cinco tiveram esse fim.

A professora de matemática Alice de Souza, coordenadora da proposta, explica que por meio do projeto os alunos se vêem envolvidos com operações de matemática financeira, estatística e produção e interpretação de gráficos. "É o uso da matemática na prática. E o que pode ser chato para os alunos na teoria fica mais fácil quando levado para o dia-a-dia", diz. A coordenadora pedagógica do São Sabas, Marta Isabel Marchetti, professora de matemática por 20 anos, acrescenta que o programa não foi criado para substituir as aulas convencionais. "O projeto tem de correr em paralelo. Apenas uma parte das aulas era usada para discuti-lo com os alunos", afirma. O colégio usa também outros recursos para ensinar a matéria, como jogos, concursos de ampliação e redução de quadros com a utilização de conceitos de geometria e a criação e produção de maquetes e plantas de imóveis.


Kumon e ábaco

O método Kumon foi criado em 1954 no Japão pelo professor de matemática Toru Kumon para que seu filho, então no 2o ano do ensino fundamental, dominasse a técnica de cálculo diferencial e integral e encontrasse menos dificuldades quando ingressasse no ensino médio e nos exames de admissão para a universidade. O Kumon acredita no aprendizado por meio do autodidatismo – a partir do nível em que o aluno se encontra na disciplina, determinado por testes de avaliação, são definidas as etapas que deverá seguir. Por meio da repetição de séries de exercícios, o objetivo é fazer com que o aluno entenda e domine totalmente as técnicas de resolução, até chegar a cálculos mais complexos. 


Para o professor Carlos Matumoto, aplicação de jogos como o sudoku estimula o aluno a construir seu próprio raciocínio

De acordo com Érico Hiyoshi Iwata, responsável pelo departamento de Orientação do Instituto Kumon, o material didático oferecido ao aluno é auto-instrutivo: "Sempre que aparecem novos assuntos ou uma mudança de grau de dificuldade na resolução dos exercícios, o material apresenta um exemplo resolvido e depois um exemplo semi-resolvido para que a pessoa, por meio da análise desses exemplos, consiga resolver os demais exercícios". Com isso, o professor torna-se praticamente dispensável, a não ser quando o aluno encontra dificuldades insuperáveis, o que pode ocorrer ao enfrentar conteúdos desconhecidos. "A orientação é dada para fazer com que o próprio aluno chegue ao raciocínio para resolução do exercício e, dessa forma, vá se tornando mais autônomo, mais independente. Fazê-lo chegar à conclusão é bem diferente de dar a resposta diretamente ao aluno." O domínio total do conteúdo acontece quando a pessoa passa a resolver os exercícios de cálculo sem nenhum erro, ou com a nota 100, o que alcança por meio da correção e da autocorreção.

Iwata conta que o instituto já foi muito procurado por alunos com problemas de aprendizagem na escola, mas com o tempo passou a atrair também pessoas que pretendem melhorar o desempenho na matéria para se preparar para concursos e vestibulares ou para treinar o raciocínio. Em setembro de 2007, o Kumon tinha 4,1 milhões de alunos, sendo 100 mil no Brasil. Desde sua chegada ao país, em 1977, 1,5 milhão de pessoas já experimentaram o método. No mundo, foram 30 milhões.

Já o ábaco é um instrumento utilizado para realizar operações de adição, subtração, multiplicação e divisão, que se supõe ter sido criado há 5.500 anos na Mesopotâmia. Apesar de ainda muito utilizado em países asiáticos, como China, Tailândia e Japão, o soroban – como é chamado em japonês – não compete mais com calculadoras modernas em termos de velocidade para encontrar resultados de contas. "O ábaco continua hoje não como uma ferramenta-fim para fazer conta, mas como uma ferramenta-meio para desenvolver capacidades e competências", afirma Antonio Carlos Guarini Perpétuo, idealizador da escola Método Supera, que também utiliza jogos em seu programa. "As principais capacidades que o ábaco desenvolve são a concentração, a velocidade de raciocínio e o raciocínio lógico", diz. Para Perpétuo, o uso da ferramenta não é uma alternativa ao ensino de matemática, mas um complemento, na medida em que trabalha o cálculo mental e ajuda a compreender o processo de contas. "Sem contar o aspecto mais direto que é o domínio completo da tabuada", diz o engenheiro aeronáutico.

De acordo com Perpétuo, o método usa o ábaco e exercícios lógicos para o desenvolvimento da inteligência lógico-matemática. "Eu diria que hoje a matemática é a disciplina mais importante porque é uma das poucas que desenvolvem esse raciocínio. Por isso a engenharia é hoje uma das profissões mais genéricas do mercado. O engenheiro passou cinco anos trabalhando muita matemática e física e desenvolveu o raciocínio lógico. Por conseqüência, trabalha em áreas como bancos e em administração", explica Perpétuo, formado em engenharia aeronáutica.

Autor

Henrique Ostronoff


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