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Opção pelas públicas

Novo diretor de Educação Básica da Capes diz que prioridade da Política Nacional de Formação de Professores é consolidar os fóruns e a proposta do governo a partir da rede pública de ensino superior

Publicado em 10/09/2011

por Marta Avancini



Prevista para ser lançada oficialmente neste mês de abril, a consolidação da Política Nacional de Formação de Professores consiste em um processo que deverá se dar ao longo do tempo e envolve não somente a oferta de vagas para licenciaturas, mas também políticas e ações de valorização do magistério e da escola. Essa é a visão do novo diretor de Educação Básica da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) que, desde 2007, é o órgão responsável pela formação de professores.


Engenheiro de formação, Teatini, secretário de Educação a Distância do Ministério da Educação (MEC) durante a gestão Cristovam Buarque, assumiu o cargo em 1° de fevereiro.


Por isso, somente após o fortalecimento da estrutura da Política, a qual se assenta sobre o sistema público de ensino superior, as instituições de ensino superior privadas poderão ser integradas – apesar das reivindicações de vários segmentos da área de formação docente durante o processo de consulta pública da minuta de decreto que deu origem à proposta, realizado em final do ano passado. Leia, a seguir, a íntegra da entrevista concedida por Teatini à revista
Educação

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Quais os principais pontos da Política Nacional de Formação de Professores, nos termos do decreto sancionado pelo presidente Lula no final de janeiro?



A Política, cujo decreto de criação foi sancionado pelo presidente em 20 de janeiro de 2009, se assenta sobre dois pilares. O primeiro é o fortalecimento do regime de colaboração entre os três níveis de governo (federal, estadual e municipal) e o segundo são os fóruns permanentes estaduais de planejamento estratégico, no qual são definidas as necessidades de cada Unidade da Federação em termos de professores licenciados e as estratégias para suprir a demanda. Antes da publicação do decreto, ele foi colocado em consulta pública, mas, mesmo nessa fase, vários estados se anteciparam e começaram a criar os seus fóruns. O Ministério da Educação (MEC) estimulou esse processo para tornar mais ágil a implantação da Política.



Qual é o balanço mais recente sobre as necessidades do país com relação à formação de professores?



O MEC estima, com base nos dados do Educacenso de 2007, que existe um déficit de professores que chega a um número que varia de 700 mil a 900 mil. Por falta de formação adequada, entende-se que o docente não possui nível superior na área em que atua. Destes, 300 mil a 400 mil possuem licenciatura em área diferente daquela em que lecionam e outros 300 mil a 400 mil não têm curso superior. O restante, 100 mil aproximadamente, é graduado e, apesar de não terem licenciatura, atuam como professores na Educação Básica. São, por exemplo, médicos que dão aula de biologia.



Com o decreto, como está o andamento do processo de implantação da Política?



Os estados estão planejando suas estratégias com a assistência do MEC. Esse processo foi coordenado pela Secretaria de Educação a Distância (SEED) a partir do ano passado. Fiz parte da equipe que prestou assessoria técnica aos estados e, em 1° de fevereiro, assumi a diretoria da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) por determinação do ministro [Fernando Haddad] para concretizar esse processo. Isso traduz um esforço nunca antes realizado no país no sentido de articular órgãos e IES (Instituições de Ensino Superior) públicas em torno da questão da formação de professores. Os arranjos variam muito. Há estados, como São Paulo, que não estão participando e há outros, como o Rio de Janeiro, que aderiram recentemente. Em 29 de janeiro, 19 estados já haviam concluído seus planos estratégicos. No total, 20 estão participando, considerando o Rio, que acabou de aderir. Entre os que não estão participando da Política, Acre e Distrito Federal alegam que já têm políticas para suprir suas necessidades, as quais são, de fato, pequenas. Com Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Rondônia  estamos negociando.



E São Paulo e Minas Gerais?



São Paulo e Minas Gerais declararam que não querem nem precisam de recursos federais para formação de professores. Apesar disso, temos recebido demandas de universidades e de municípios nesses dois estados.  A Universidade de São Paulo (USP) nos informou que vai se articular com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) e a Universidade do Estado de São Paulo (Unesp) para participar da Política, pois recebem muitas demandas de municípios.Terminada a fase de adesões, o mês de março foi um período para se fazer a "sintonia fina" nos 20 estados que estão participando.



O que significa fazer a "sintonia fina"?



Realizamos um ciclo de reuniões com representantes dos fóruns e das IES de cada estado, a fim de definir responsabilidades: qual instituição assume quantas vagas, em que região etc. Estamos analisando a distribuição de vagas nas várias regiões dos estados. Em meados de abril, deverá ocorrer a solenidade para a assinatura dos acordos de cooperação técnica com os governadores, reitores e demais autoridades formalizando o início da Política.



Como fica a participação das instituições privadas de ensino superior na Política?



A participação das IES privadas, neste primeiro momento, ficará restrita a dois estados, Santa Catarina e Goiás, que reivindicaram isso e tiveram a reivindicação aceita. Goiás, por exemplo, tem um programa com a Universidade Católica de Goiás (UCG) para oferecer 700 vagas em filosofia para segunda licenciatura. A concordância do MEC se deve ao fato de que esses estados informaram ser necessário recorrer à rede privada. Na avaliação do MEC, apesar da enorme demanda, não será necessário incluir as IES privadas neste primeiro momento, embora, com a evolução da Política, as IES privadas venham a ser incluídas. Mas a prioridade agora é consolidar os fóruns e a Política assentando-se na rede pública.



Por quê?



Em parte, porque somente com o sistema público conseguimos atender uma parte significativa da demanda. As primeiras estimativas dão conta de que, neste primeiro momento, já se tem uma oferta de 300 mil vagas, considerando somente as IES federais, estaduais e os Ifets (Institutos Federais de Educação Tecnológica). Estão previstas três entradas – no segundo semestre de 2009, no primeiro semestre de 2010 e no segundo semestre de 2010. Ao todo, são 72 IES públicas, incluindo Ifets, que fazem parte da rede. É importante centrar fogo na construção de uma política forte e consistente com base nas IES públicas, para num segundo momento, se for necessário, incluir a rede privada. Só com as IES públicas, já é um trabalho enorme. São 72 IES envolvidas em todo o país.



Mas, durante a consulta pública, várias entidades reivindicaram a inclusão do sistema privado que, aliás, oferece a maior parte das vagas de licenciatura, não é mesmo?



Há problemas como os mecanismos de repasses de recursos para as IES privadas. Há algumas instituições que, de fato, poderiam participar, mas outras talvez não. A definição deve passar pelo Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes). A Política ainda está na fase inicial, vai levar algum tempo até efetivarmos a afinação com outras áreas do MEC, com a Secretaria de Ensino Superior (Sesu), com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). A construção vai se dar em etapas.



Como serão os repasses?



Para as federais, os recursos serão repassados automaticamente. Para as estaduais, serão firmados convênios. Com a formalização dos acordos de cooperação técnica, prevista para abril, a Capes já estará autorizada a começar a fazer os repasses. Uma via que pode possibilitar a inclusão das IES privadas são os Programas de Financiamento Estudantil (Fies) e Universidade para Todos (ProUni), desde que os indicadores e parâmetros oficiais de qualidade dos cursos sejam atendidos. Dentro dessa questão, é importante mencionar que está sendo montado um grande sistema integrado de informações para reunir dados e indicadores das IES e dos cursos e que serão utilizados como referência para os repasses de recursos.



Qual é o montante destinado à política de formação de professores?



Algo em torno de R$ 1 bilhão, incluindo recursos para programas do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e do Plano de Ações Articuladas (PAR) na área de formação. No âmbito da Capes, os programas e linhas por meio dos quais serão repassados os recursos estão na fase de finalização. Alguns já são conhecidos, Programa de Consolidação das Licenciaturas (Prodociência), o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid) e o Observatório da Educação. Um programa novo, que está sendo delineado também, é o Mobilidade Acadêmica no Brasil, para promover intercâmbio entre professores no campo da licenciatura, e permitirá suprir carências de estados onde há falta de mestres e doutores.
O funcionamento desses programas vai seguir os critérios e parâmetros de qualidade já adotados pela Capes, além do Sinaes, do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), entre outros. Paralelamente, no âmbito da Política será oferecido, aos professores que precisam de formação, um catálogo de cursos disponíveis, a fim de que possam escolher aqueles que melhor atendam às suas necessidades. Com isso, também está sendo criado um currículo Lattes do professor, que deverá ser preenchido a partir do momento em que ele se matricular em um dos cursos oferecidos no âmbito da Política. Esse currículo será atualizado e público e a expectativa é que, com o tempo, todos os professores brasileiros criem seu currículo.



Uma reivindicação importante feita por diversos segmentos na área de formação docente é a ênfase na formação em cursos presenciais. Como isso está sendo pensado agora, depois da publicação do decreto?



O peso da Universidade Aberta do Brasil (UAB) vai depender da realidade local. Dependendo da realidade local, a UAB poderá oferecer mais vagas do que a formação presencial. Em várias partes, os pólos estão sendo revitalizados.



Uma discussão que parece estar ausente do debate, até o momento, é a da qualidade das licenciaturas e dos currículos, além do perfil do professor que se pretende formar. Não há uma preocupação excessiva com a logística?



O sucesso da Política não depende apenas de oferecermos vagas, embora isso seja um aspecto central. É preciso haver o estímulo e a valorização da docência. Isso já está sendo feito por meio do piso salarial do magistério. Ao mesmo tempo, por meio do PDE, está havendo uma melhoria das condições das escolas, dos laboratórios.

Sobre os currículos, na Capes, no Observatório e no Prodociência, existem iniciativas e ações no sentido de promover uma discussão com a finalidade de tornar os currículos mais atrativos. Ou seja, existe todo um contexto que tende a estimular o ingresso de jovens no magistério.

Autor

Marta Avancini


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