Revista Ensino Superior | Camelos e beija-flores... - Revista Ensino Superior
Personalizar preferências de consentimento

Utilizamos cookies para ajudar você a navegar com eficiência e executar certas funções. Você encontrará informações detalhadas sobre todos os cookies sob cada categoria de consentimento abaixo.

Os cookies que são classificados com a marcação “Necessário” são armazenados em seu navegador, pois são essenciais para possibilitar o uso de funcionalidades básicas do site.... 

Sempre ativo

Os cookies necessários são cruciais para as funções básicas do site e o site não funcionará como pretendido sem eles. Esses cookies não armazenam nenhum dado pessoalmente identificável.

Bem, cookies para exibir.

Cookies funcionais ajudam a executar certas funcionalidades, como compartilhar o conteúdo do site em plataformas de mídia social, coletar feedbacks e outros recursos de terceiros.

Bem, cookies para exibir.

Cookies analíticos são usados para entender como os visitantes interagem com o site. Esses cookies ajudam a fornecer informações sobre métricas o número de visitantes, taxa de rejeição, fonte de tráfego, etc.

Bem, cookies para exibir.

Os cookies de desempenho são usados para entender e analisar os principais índices de desempenho do site, o que ajuda a oferecer uma melhor experiência do usuário para os visitantes.

Bem, cookies para exibir.

Os cookies de anúncios são usados para entregar aos visitantes anúncios personalizados com base nas páginas que visitaram antes e analisar a eficácia da campanha publicitária.

Bem, cookies para exibir.

Notícias

Camelos e beija-flores…

As estórias nunca aconteceram. Elas fazem acontecer...

Publicado em 10/09/2011

por Rubem Alves


Rubem Alves

A revisora informou delicadamente que era norma do jornal que todas as “estórias” deveriam ser grafadas como “histórias”. Assim os gramáticos decidiram e escreveram nos dicionários.

Respondi, também delicadamente: “Comigo não. Quando escrevo ‘estória’, quero dizer ‘estória’. Quando escrevo ‘história’, quero dizer ‘história’. Estória e história são tão diferentes quanto camelos e beija-flores…”

Escrevi um livro baseado na diferença entre “história” e “estória”. O revisor, obediente ao dicionário, corrigiu minhas “estórias” para “história”. Confiado no rigor do revisor, não li o texto corrigido. Aí, um livro que era para falar de camelos e beija-flores, só falou de camelos. Foram-se os beija-flores, engolidos pelo camelo…

Escoro-me no Guimarães Rosa. Ele começa o Tutaméia com esta afirmação: “A estória não quer ser história. A estória, em rigor, deve ser contra a história.”

Qual a diferença? É simples. Quando minha filha era pequena eu lhe inventava estórias. Ela, no final, perguntava: “Papai, isso aconteceu de verdade?” E eu ficava sem poder responder porque a resposta seria de difícil compreensão para ela. A resposta que lhe daria seria a seguinte: “Essa estória não aconteceu nunca para que aconteça sempre…”

A história é o reino das coisas que aconteceram de verdade, no tempo, e que estão enterradas no passado. Mortas para sempre. Ler a história é caminhar por um cemitério. Ali os mortos nos contam suas lições. É importante ouvir os relatos para aprender dos seus equívocos e não repeti-los no futuro.

Mas as estórias não aconteceram nunca. São invenções, mentiras. O mito de Narciso é uma invenção. O jovem que se apaixonou por sua própria imagem nunca existiu. Aí, ao ler o mito que nunca existiu, me vejo hoje debruçado sobre a fonte que me reflete nos olhos dos outros. Toda estória é um espelho. A estória da Bela Adormecida nunca aconteceu. Mas aí leio o poema do Fernando Pessoa, Eros e Psique. E, quando o faço, a estória sai do espaço imaginário e entra dentro do meu corpo. E essa é a razão por que as estórias pedem para serem repetidas. Nem sei quantas vezes já li o poema Eros e Psique. E toda vez que o leio é como se fosse a primeira vez, como se eu já não o soubesse de cor. A estória de Romeu e Julieta nunca aconteceu. Mas toda vez que é lida ressuscita dos mortos e toma posse do corpo da pessoa que a lê.

Os relatos históricos são informações que levamos num embornal pendurado no ombro da memória. As estórias, ao contrário, as levamos dentro da nossa própria carne. Reinterpreto o evangelho: “E as estórias se fazem carne…”. Não é outra a razão por que as crianças desejam que as estórias sejam sempre repetidas, do exato jeito como são conhecidas.

A história nos leva para o tempo do “nunca mais”, tempo da morte. As estórias nos levam para o tempo da ressurreição. Se elas sempre começam com o “era uma vez, há muito tempo” é só para nos arrancar da banalidade do presente e nos levar para o tempo mágico da alma.

Essa é a delícia da literatura: saímos da banalidade do dia-a-dia e entramos num mundo de fantasias que nos possuem. E ficamos diferentes. Essa é a virtude paradoxal da literatura que consiste em fazer-nos abstrair do mundo para lhe encontrarmos um sentido… (“Como um romance”, Daniel Pennac).
As estórias nunca aconteceram. Elas fazem acontecer…



Rubem Alves






Educador e escritor –



rubem_alves@uol.com.br



 

Autor

Rubem Alves


Leia Notícias

pexels-thisisengineering-3861969

Inteligência artificial pede mão na massa

+ Mais Informações
pexels-george-milton-6953876

Mackenzie cria estratégia para comunicar a ciência

+ Mais Informações
Doc Araribá Unisagrado

Projeto do Unisagrado na Ti Araribá faz 26 anos e ganha documentário

+ Mais Informações
pexels-andrea-piacquadio-3808060

Mais de 100 IES foram certificadas com selo de incentivo à Iniciação...

+ Mais Informações

Mapa do Site

Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga. Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga.