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Guia prático para iniciantes

Nas horas de insegurança, vale recorrer à companhia imaginária de seus antigos professores, mas não a seus conselhos

Publicado em 10/09/2011

por Julio Groppa Aquino

Nos próximos dias, milhares de novos professores pisarão em uma sala de aula pela primeira vez. Para eles, algumas recomendações de caráter eminentemente prático, sem, contudo, qualquer intenção prescritiva: 

Caso vocês não sejam parentes ou conhecidos de algum proprietário, diretor ou coordenador de escola particular, ou não tenham sido selecionados em nenhum concurso público, preparem-se para o périplo das substituições e contratos temporários. Se, por um lado, vocês serão obrigados a enfrentar, de supetão, as circunstâncias pedagógicas mais esdrúxulas e desgastantes, por outro, vocês terão a chance única de conhecer os intestinos da história recente do país. Laboratório antropológico melhor não há.

Esqueçam tudo o que vocês imaginaram ou ouviram dizer sobre a profissão. Levem consigo apenas seus cinco sentidos, acompanhados de nenhum alarmismo ou maledicência. A despeito das tantas convocações em contrário, permaneçam atentos apenas ao que se passar ao seu redor e suas frestas de oportunidade. Arrisquem-se ao máximo, sempre tendo em mente que as salas de aula não transformam o mundo, mas tampouco o espelham. No raio daquelas quatro paredes, vidas menos ordinárias podem ser compartilhadas, esculpidas quiçá.

Nas horas de insegurança, vale recorrer à companhia imaginária de seus antigos professores, mas não a seus conselhos. Isso porque eles não são portadores de nenhum saber excepcional sobre os mistérios do ofício. Também para um professor tarimbado, as inquietações primeiras permanecem em aberto. Somos órfãos de luz, todos e sempre. Some-se a isso o fato de que toda aula que se preze nunca deixa de ser enigma; só se saberá de fato o que ali se forjou muito tempo depois; décadas, talvez.

Precavenham-se contra a toxicidade premonitória dos colegas veteranos. Eles zombarão de sua inocência e de seu entusiasmo, atribuindo à experiência por eles acumulada o ônus inconteste da prova. Não confiem em seus argumentos, já que não há evidências de segunda mão. A vida não se repete, afortunadamente. E, se ameaçar se repetir, algo de embuste estará ali pedindo passagem. 

Acostumem-se à solidão intrínseca ao ofício. Alunos parceiros haverá, mas sempre de modo contingente. Não se iludam ao querê-los como iguais (eles estão de passagem); não se atrevam a querê-los como rivais (eles são infinitamente mais fortes do que vocês).  Esforcem-se por estabelecer uma relação de simpatia intelectual, precisamente. Cumpram com sua parte, mas não esperem a exata contrapartida deles. Eles estarão ocupados com um sem-número de apelos outros e mais urgentes.

Se, ao cabo do primeiro ano de exercício, vocês tiverem certeza de que seu destino profissional deveria ser outro, mas não se sentirem confortáveis em nenhum outro lugar além daquele entre carteiras, lousa e cadernos, vocês estarão prontos para se tornar professores. Pensando bem, ainda não.



Julio Groppa Aquino – Professor da Faculdade de Educação da USP –



juliogroppa@editorasegmento.com.br

Autor

Julio Groppa Aquino


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