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O difícil encaixe

Parecer 13 do Conselho Nacional de Educação faz ressurgir debate sobre educação inclusiva no país; MEC fica dividido entre forças políticas envolvidas na questão

Publicado em 10/09/2011

por Beatriz Rey


Atendimento a necessidade especiais exige profissionais preparados nas escolas regulares

A ampliação da oferta do Atendimento Educacional Especializado (AEE) foi decidida há mais de um ano, com a promulgação do decreto nº 6.571. Em linhas gerais, o texto estabelece que, a partir de janeiro de 2010, os estudantes que recebem AEE em escolas ou instituições especializadas e estão matriculados em escolas regulares serão computados duas vezes. Isso significa que, no âmbito do Fundeb, haverá duplo repasse de verba. Além disso, a legislação previu que o AEE pode ser prestado pelos sistemas de ensino ou por instituições especializadas conveniadas com os governos estaduais ou municipais – é o caso, por exemplo, das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apaes).

Em junho deste ano, o Conselho Nacional de Educação (CNE) aprovou o parecer número 13, cujo objetivo era oferecer as diretrizes operacionais para a mudança prevista no decreto. Aprovado por unanimidade, o documento coloca como obrigatória a matrícula de alunos com deficiência, transtornos do desenvolvimento e superdotação nas escolas regulares. Mais: o sistema público de ensino deveria ofertar o AEE, que teria caráter complementar ou suplementar.

O texto levantou polêmica considerável em torno do assunto, a ponto de não ser homologado pelo Ministério da Educação. O ministro Fernando Haddad pediu ao CNE que analisasse novamente o parecer "à luz da Lei de Diretrizes e Bases e do decreto 6.571".

"Não estamos tratando da matrícula na educação especial. Estamos tratando de atendimento especializado, da contagem do aluno do ponto de vista do Fundeb", explica Clélia Brandão Alvarenga Craveiro, relatora do parecer. Para viabilizar a dupla contagem do aluno com deficiência para o Fundeb, o CNE tornou obrigatória a matrícula do mesmo no ensino regular.

A ideia, segundo Clélia, era que o aluno estivesse matriculado de manhã numa escola pública e à tarde em uma instituição de AEE – seja especializada ou a própria escola. "Para você ser contado duas vezes, como prevê o decreto, você precisa estar matriculado duas vezes. Isso significa mais chance: o sistema está oferecendo recurso para que o aluno seja atendido de uma maneira melhor", coloca.

De qualquer forma, o debate dividiu as forças envolvidas na educação especial. De um lado, ficou quem defende a matrícula na escola regular como um direito fundamental. De outro, aqueles que fazem ressurgir as deficiências das escolas públicas, que não teriam estrutura para atender alunos com necessidades especiais. "O MEC fica numa posição difícil. Há a pressão pela inclusão e a pressão por parte das instituições. As Apaes e as Associações Pestalozzi têm muita voz no Congresso Nacional", diz Cláudia Grabois, presidente da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down.
Do lado da inclusão, ela defende a matrícula nas escolas regulares como "construção de um novo olhar". "A escola especial acaba sendo uma caixa. Numa Apae, a criança continua excluída. Quem não tem um período escolar não existe para a sociedade", avalia. Cláudia acredita que a escola é o lugar onde se aprende a lidar com as diferenças – o que funciona como um reflexo da sociedade. "Defender a separação é defender que as pessoas vivam separadas, sem conhecer o outro", diz. Sobre a questão da falta de estrutura das escolas públicas, ela garante que o problema passa pela boa vontade do professor na sala de aula.

Em entrevista ao Observatório da Educação, da ONG Ação Educativa, o presidente da Federação Nacional das Apaes e deputado federal Eduardo Barbosa (PSDB-RJ) disse que o parecer dá a entender que não existirá mais a possibilidade de matrícula de pessoas com deficiência em escolas especiais. "As escolas especiais poderão oferecer apenas Atendimento Escolar Especializado (AEE) em contra turno. Atendimento não é escola, é algo complementar", defendeu. Segundo Eduardo, a escola especial ainda é necessária, principalmente para deficientes com comprometimentos mais severos e múltiplos. "O decreto faz a referência de que o AEE pode ser dado tanto na escola comum, como especial. Ele não restringe a escolarização apenas à escola comum. A resolução foi além do que diz o decreto", comentou.

Para o professor Marcos Mazzotta, do Laboratório de Estudos sobre Deficiências da USP e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o problema não é tão simples como parece. Ele faz um alerta: uma vez que a criança esteja matriculada no sistema público de ensino, o poder público precisa garantir um atendimento diferenciado. A lei não prevê, por exemplo, o que fazer com crianças que não têm condições físicas para passar o período inteiro na escola. Há situações extremas de deficientes com comprometimentos múltiplos, diz o professor, que impossibilitam o aluno de frequentar as aulas da mesma maneira que os outros colegas.  "Para alguns alunos, será necessário organizar um serviço educacional especializado. Um professor sozinho não resolve essa imensidão de problemas", afirma.

Marcos aponta outra restrição, relacionada à família: ela deve ter o direito de decidir para onde vai encaminhar seus filhos. "Devemos ouvir as posições e propostas vindas das famílias. Elas têm esse direito", coloca. Mesmo com as críticas, ele é taxativo: afirma que é na escola que o aluno se configura como cidadão – a matrícula se faz necessária nesse sentido. "Se ele não aparece na escola, muitas vezes não sai nem de casa", alerta. 

Autor

Beatriz Rey


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