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Pressão por resultado

Como trabalhar de forma oposta à regulação e controle e usar os dados das avaliações para conhecer melhor os processo de ensino-aprendizagem

Publicado em 02/04/2015

por Marta Avancini

pexels-george-pak-7972659 Como trabalhar de forma oposta à regulação e controle e usar os dados das avaliações para conhecer melhor os processo de ensino-aprendizagem

Os resultados obtidos por uma escola no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou na Prova Brasil podem definir seu acesso a recursos públicos, a programas de formação docente e sua imagem perante as famílias e a comunidade. Diante dessa situação, os coordenadores pedagógicos se veem frente ao desafio de equacionar a demanda pelo bom desempenho com o projeto político-pedagógico da instituição onde atua. Não se trata, entretanto, de virar as costas para os dados ou considerar a avaliação como uma prática negativa.

“A avaliação é constitutiva da educação, pois sempre existiu uma forte interlocução entre educação e avaliação. A questão que se coloca é em relação a uma concepção de avaliação entendida como regulação e controle”, afirma a psicóloga e psicopedagoga Sylvia Helena Souza da Silva Batista, professora da Universidade Federal de São Paulo no campus da Baixada Santista.

É esta característica das avaliações externas que coloca o coordenador pedagógico sob pressão e em risco de pautar todo o seu trabalho apenas por essa métrica. “Todo o trabalho acaba sendo influenciado pela perspectiva regulatória das avaliações”, reitera a professora da Unifesp.

Segundo Sylvia Helena, o desafio é o de trabalhar os resultados das avaliações externas de modo que os dados que elas aportam produzam “solidariedade de aprendizagem”, ou seja, a utilização dos dados para conhecer mais e melhor os processos de ensino e aprendizagem, a fim de fortalecê-los – e não divisão entre bons e maus professores e alunos ou o ranqueamento de escolas, como vem acontecendo.

Relativizar os dados

Para isso, é preciso interpretar os dados com relatividade e usá-los com sabedoria, a fim de que eles sirvam de insumo para os professores e demais profissionais implementarem o projeto pedagógico da escola, defende Vera Placco, pedagoga e professora do programa de pós-graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Isso não significa usar os resultados como único parâmetro para definir as atividades em sala de aula, adaptando o currículo da escola aos conteúdos e ao formato da avaliação. Ou seja, a melhor postura é não acatar o resultado – seja ele bom ou ruim – como uma sentença. É preciso interpretá-lo, a fim de identificar o que ele informa sobre o que pode ser melhorado e sobre como está funcionando na escola. “O coordenador pedagógico, por ter um papel de articulação na equipe da escola, deve manter isso em mente sempre”, recomenda Vera.

Nesse sentido, é preciso manter vivos os canais de diálogo e discussão com os professores sobre os aportes que as avaliações possam trazer, levando informações relevantes aos docentes, ao mesmo tempo que os escuta e acolhe suas demandas.

A pressão desencadeada pelas avaliações externas está presente tanto nas escolas públicas quanto nas da rede privada. Para Sylvia Helena, a questão que se coloca é escapar da lógica do ranqueamento e da padronização, buscando alternativas negociadas em conjunto pela equipe de gestão da escola.“Não adianta discutir a avaliação externa. Ela faz parte do projeto maior da sociedade para a educação e a escola tem de responder a ele e ao mesmo tempo manter-se fiel a seu projeto pedagógico”, diz Vera Placco.

Na percepção da psicóloga, essa característica tende a ser mais forte na escola privada, em virtude da concorrência, que intensifica a necessidade de sustentar a imagem de “escola de qualidade” na sociedade. Nessas instituições, acentua-se o papel do coordenador pedagógico para articular ações que fortaleçam práticas pedagógicas que promovam a autonomia, a criatividade, ao invés da assimilação dos conteúdos valorizados pelas avaliações externas.

Este não é um caminho simples, admite a professora da Unifesp, pois exige da equipe encontrar um caminho próprio em meio às contradições que caracterizam o ambiente escolar, composto por pessoas que desempenham papéis diferentes, com visões, funções e responsabilidades distintas.

O fortalecimento do trabalho em equipe é uma chave para lidar com as avaliações externas. “O coordenador não é um profissional em si. Ele está situado numa equipe, numa escola”, enfatiza Sylvia Helena. Nesse contexto, reciprocidade, autonomia e respeito devem ser três eixos do trabalho da equipe pedagógica numa escola.

Paralelamente, essa perspectiva implica o fortalecimento de uma visão de gestão coletiva, na qual os integrantes da equipe pedagógica interagem de maneira horizontal, em detrimento de condutas hierárquicas, ainda predominantes em boa parte das escolas brasileiras.

 “Busco uma educação de qualidade”
© Gustavo Morita

Renata Borges, coordenadora pedagógica da EE Maria Paula Marcondes Domingues, em São Paulo (SP)

“No início de cada ano, sempre existe uma expectativa muito grande com relação aos resultados da escola nas avaliações externas. Quando eles chegam, a equipe é invadida por uma torrente de emoções e ansiedades. Se o resultado é positivo, a harmonia coletiva serve como mola propulsora para o ano letivo, mas, se for negativo, a primeira reação é buscar culpados pelo fracasso. Por isso, procuro realizar um trabalho constante de reflexão com o grupo. Os resultados das avaliações são de extrema importância para o planejamento das ações e do direcionamento dos professores. Após a apropriação desses resultados, elaboramos o plano de intervenção pedagógica.Tento evidenciar que as avaliações externas não são medidoras absolutas do desempenho da equipe, mas tão somente indicadores, recortes, do processo de aprendizagem. Elas devem servir como norte para uma educação de qualidade. Em contrapartida, elas  não podem ganhar proporções descabidas e substituírem outras preocupações formativas que compõem o projeto de trabalho pedagógico global.”

 

Autor

Marta Avancini


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