NOTÍCIA

Edição 272

Iniciação científica é estratégica para o país

22ª edição do Conic foi vencida por oito jovens mulheres

Publicado em 20/02/2023

por Sandra Seabra Moreira

iniciação científica Estudantes de iniciação científica do IESB (Foto: divulgação/IESB)

Kelly, Ingrid, Maressa, Karina, Amanda, Ana Carolina, Rafaela e Vitoria. Oito jovens mulheres que têm algo em comum. Elas foram as vencedoras, em suas categorias, da 22ª edição do Conic, o Congresso Nacional de Iniciação Científica, organizado pelo Semesp, ocorrido em novembro passado. A representatividade masculina foi garantida por Ricardo Henrique Freire Vieira, do Centro Universitário Eniac, em Guarulhos, com o Prêmio especial – Incentivo à preservação ambiental (veja quadro). Suas pesquisas foram escolhidas entre os 1.401 projetos inscritos. Destes, 1.251 foram aprovados e apresentados ao longo do congresso. O evento virtual reuniu 2.240 alunos e 922 docentes. Com mais de duas décadas, o Conic é um congresso pioneiro no setor do ensino superior particular.

Os congressos de iniciação científica são momentos de alta tensão positiva para os estudantes da graduação. São a oportunidade de encarar, pela primeira vez, uma banca de professores, antes mesmo da conclusão do curso e da apresentação do TCC. As pesquisas têm o prazo de um ano para sua realização, período em que o estudante pode descobrir suas aptidões acadêmicas, seus focos de interesse relativos ao conhecimento, dentro do escopo de sua área, e à própria carreira.

A iniciação científica é uma vivência estimulante para os alunos e relevante para o país. O presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Renato Janine Ribeiro, afirma: “A iniciação científica é muito importante porque permite fazer com que os mais jovens, além do curso regular, já se empenhem no mundo da pesquisa. Sabemos que o futuro da sociedade atual está, em boa parte, dependente do conhecimento rigoroso, científico. Quanto mais tivermos pessoas que pesquisem, que trabalhem com ciência e conhecimento de qualidade, mais a sociedade tem condições de se desenvolver, de crescer”.  

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Os congressos de iniciação científica acontecem em todo o país no segundo semestre, internamente ou em parceria com outras IES. Em dezembro, por exemplo, estudantes de oito universidades do Distrito Federal apresentaram 2.527 trabalhos no 28º Congresso de Iniciação Científica da Universidade de Brasília (UnB) e 19º do Distrito Federal. A sede da premiação foi o Centro Universitário do Instituto de Educação Superior de Brasília (IESB), que recebeu estudantes e docentes da Universidade Católica de Brasília (UCB), do Centro de Ensino Unificado de Brasília (Ceub), dos institutos federais de Brasília (IFBs) e de Goiás (IFG), da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF) e da UnB.

Nesse evento, entre estudantes do IESB, mais uma jovem pesquisadora se destacou. Vivyane Graça Mello de Oliveira recebeu menção honrosa pela pesquisa Instituto Mãos Amigas (IMA): o estudo de caso de uma entidade sem fins lucrativos que atua no atendimento ao sofrimento psíquico no Distrito Federal. A professora Zeli Ambros, coordenadora da iniciação científica e da pós-graduação do IESB, atesta que a maioria são mulheres. Ela também conta que, durante o período de pesquisa, os estudantes frequentam seminários para aprender a elaborar artigos, resenhas, saber o que é o Qualis, da Capes, entre outros aprendizados. “E para os professores orientadores, é a possibilidade de desenvolver pesquisa com o apoio da instituição.”  

Incertezas no mestrado

“É sensacional!”, diz Kelly Queiroz Carvalho da Silva acerca da hegemonia feminina na lista de estudantes vencedoras do Conic – Semesp. Com 24 anos, é aluna do curso de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade São Judas, em São Paulo. No último semestre, seu projeto, Espaços públicos urbanos, qualidade de vida e saúde: uma revisão integrativa, venceu na categoria Ciências sociais aplicadas. Moradora de Taboão da Serra, teve a infância marcada por praças e parques de outro bairro, o Campo Limpo, no extremo sul da capital paulista, onde residia sua avó. “Durante a pesquisa, eu lembrei muito dela, que sempre dizia ‘preciso descer e tomar um sol’”. Kelly realiza estágio remunerado num escritório de arquitetura à tarde e tem aulas à noite, em curso que era presencial e acabou por se tornar híbrido após a pandemia. A disciplina de iniciação científica é optativa. A pesquisa foi realizada nas madrugadas e às quartas-feiras, quando a universidade determina um horário livre para cursos extracurriculares. Pesquisa selecionada, o desconto de 5% na mensalidade foi um incentivo.

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“Meus professores, Sergio Salles e Aníbal Montaldi, dizem que a iniciação científica é uma forma de entrar de cabeça na universidade. Sair do modo passivo e ir para uma atitude mais ativa, de realmente pesquisar.” Kelly também menciona a orientadora, Renata Ferraz de Toledo. “Os três me incentivaram muito. Minha orientadora disse para eu me inscrever no Conic. Eu tinha medo. Sou tímida, prefiro o presencial ao vídeo. Eu pensava ‘ai, vão me ler, me avaliar’. Foi a primeira apresentação que fiz na vida. É como pular em água fria, o primeiro momento é meio tenso, depois a gente se acostuma. A banca foi simpática comigo.”

Para o futuro, ela quer lecionar na universidade. “Quero ser professora, não consigo fugir muito disso, eu amo essa área.” Mas esbarra naquilo que foi seu maior aprendizado ao longo de um ano de pesquisa. “Ganhei mais noção do desafio. Por exemplo, eu tenho vontade de emendar mestrado e doutorado, mas eu penso no valor da mensalidade. Mesmo que eu consiga uma bolsa, como vou me manter nesse período desenvolvendo o mestrado? Como equilibrar uma carreira de arquitetura – que demanda tempo – e um mestrado que também demanda? Faltam incentivos financeiros para os pesquisadores conseguirem se manter.”  

Craqueamento catalítico

  Era final do dia quando Ingrid de Castro Durans, 21 anos, se aprontava para sair de casa com seu pai, rumo à balsa, no Guarujá. De lá, seguiria para a aula na Universidade Santa Cecília (Unisanta), em Santos. O celular tocou. “Era o pessoal do Semesp pedindo para eu assistir ao anúncio dos premiados. Nem acreditei!”. Em 2022, Ingrid cursava o sétimo semestre de engenharia química e a pesquisa foi realizada em caráter voluntário.

Seu tema tem nome que assusta o pessoal da área de humanas: Determinação experimental da velocidade mínima de fluidização de perda de carga para um leito de partículas esféricas. À época, Ingrid assistia às aulas da disciplina Operações Unitárias 1, ou OP1, em que a fluidização é esmiuçada. Ao mesmo tempo, realizava estágio pela manhã no laboratório da universidade – o que lhe garante 40% de desconto na mensalidade. Lá, bancadas em acrílico transparente são protótipos fiéis dos equipamentos industriais. Ela queria entender melhor como o processo, bastante utilizado na indústria, acontecia. “Não gosto muito de cálculos, queria ver a coisa acontecendo.” Reparou na bancada de fluidização e pensou: por que não? “A fluidização… como vou explicar? Ela está presente, por exemplo, no craqueamento catalítico do petróleo, para obter a gasolina”, tenta.

Assim como acontece com Kelly, a autonomia financeira preocupa Ingrid. “Eu gostaria muito de já ter entrado num concurso público. Qualquer um já estaria bom, mas quero ir para o Exército como engenheira. Aqui no Brasil é tudo muito instável, a gente nunca sabe o dia de amanhã. Quero um salário mensal, um bom convênio médico.”  

Cnpq e as bolsas de iniciação científica

  Renato Janine conta que há décadas o Brasil iniciou seu programa de bolsas de iniciação científica. “O governo federal adotou a estratégia de criar cotas de iniciação científica, concedê-las aos programas em função da qualidade, da prioridade dos temas tratados e de forma que reduza a desigualdade regional.” O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), concede cotas de bolsas às IES, anualmente, e as supervisiona. Os estudantes de graduação recebem o valor de R$ 400,00. Ele foi criado em 1992.

O programa passou ileso aos cortes que afetaram a concessão de bolsas em 2022. O site do CNPq informa que o PIBIC 2022/2024 contemplou 335 instituições, que correspondem a 97% das proponentes, com o total de 27.100 bolsas. Serão R$ 130 milhões por ano. As IES também podem utilizar o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (PIBIT), que para 2022/2024 concedeu 3.345 bolsas, para 239 instituições, totalizando R$ 32 milhões.

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Para compor o oferecimento de bolsas, as IES também lançam mão de recursos próprios. “Temos as bolsas institucionais para os alunos. Os professores também recebem mais carga horária por participar da iniciação científica”, conta Zeli, do IESB. “O estudante também pode participar do programa de maneira voluntária, mas o professor continua recebendo uma carga horária para orientar esses alunos.” No IESB, o orientador detém doutorado e para a concessão da bolsa o aluno tem seu desempenho acadêmico avaliado, uma das regras do próprio programa.

O IESB tem publicação específica, a Revista de Iniciação Científica, que está na terceira edição e dá visibilidade à produção de artigos dos estudantes. O PIBIC tem larga aceitação, diferentemente do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência, o PIBID. Criado em 2007, o PIBID foi a resposta para um problema que, de fato, ainda não se resolveu. “Foi na gestão de Fernando Haddad no MEC. Notou-se que o PIBIC acabava desestimulando os alunos que, porventura, quisessem lecionar na escola.

O PIBID é um programa-irmão, concebido de forma análoga, cujo objetivo não é preparar as pessoas para fazerem pesquisa, mas para darem aulas, especialmente na rede básica pública”, afirma Janine. Esses dois programas têm caminhado no sentido de qualificar melhor as pessoas. Mas o PIBID condiciona os estudantes à escolha pela carreira de professor na escola pública. “Uma opção não muito tentadora. Nesses últimos anos não houve reajuste de salário, muito menos aumento real para tornar essa carreira convidativa.”


As vencedoras do prêmio Conic Semesp

Vencedores

Ciências biológicas e saúde: Karina Kelm Levantamento do conhecimento dos pais de crianças prematuras, sobre prematuridade e desenvolvimento infantil para construção de um programa educacional com base tecnológica Universidade Presbiteriana Mackenzie – Fisioterapia

Ciências exatas e da terra: Ingrid de Castro Durans Determinação experimental da velocidade mínima de fluidização de perda de carga para um leito de partículas esféricas Universidade Santa Cecília (Unisanta) – Engenharias

Ciência humanas e sociais: Maressa Mendanha Oliveira e Luana Mendonça Costa Neoliberalismo, crise política e violência estatal na gênese dos protestos chilenos 2019 Universidade Paulista (UNIP) de Goiânia – Ciências Sociais

Ciências sociais aplicadas: Kelly Queiroz Carvalho da Silva Espaços públicos urbanos, qualidade de vida e saúde: uma revisão integrativa da literatura Universidade São Judas Tadeu (USJT) – Arquitetura e Urbanismo

Em andamento

Ciência biológicas e saúde: Amanda Fonseca da Costa Análise do Metabólito n-óxido de trimetilamina em camundongos induzidos à obesidade no treino, destreino e retreino (HIIT) Centro Universitário do Distrito Federal (UDF) – Enfermagem

Ciências exatas e da terra: Ana Caroline Serra Araujo, Priscila de Souza Lopes Seletividade de produtos fitossanitários a adultos de telenomus podisi ashmead (Hymenoptera: platygastridae) Centro Universitário de Jaguariúna (UniFAJ) – Ciências Agrárias

Ciências humanas e sociais: Rafaela Moreira Repasch Arte-realidade virtual-neurociência: aplicações e contribuições das APPS/Artes imersivas em dispositivos HDMS de realidade virtual para a homeostase de indivíduos inseridos no contexto hospitalar Universidade de Campinas (Unicamp) – Artes Visuais

Ciências sociais aplicadas: Vitoria Camargo Costa Representação da violência e as políticas do corpo: uma reflexão sobre documentário, repulsa e compaixão Universidade Anhembi Morumbi (UAM) – Comunicação

Prêmio especial – Incentivo à preservação ambiental: Ricardo Henrique Freire Vieira Propor melhorias no processo de logística reversa de resíduos eletrônicos na cidade de Atibaia, visando colaborar com os atos organizacionais Centro Universitário Eniac

Autor

Sandra Seabra Moreira


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