Revista Ensino Superior | Saúde organizacional: como medir a vitalidade das IES

Educação

Colunista

Daniel Sperb

CEO na Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP)

Saúde organizacional: como medir a vitalidade das IES

Instituições devem adotar modelo de gestão pragmático

Saúde organizacional

Durante muito tempo, as universidades foram tratadas como organismos quase sagrados, templos do saber imunes às lógicas do mercado, sustentadas por discursos sobre missão e legado. Mas esse tempo acabou. O mundo mudou mais rápido do que as estruturas que deveriam explicá-lo. A velocidade das transformações tecnológicas, a pressão por resultados e a crescente exigência por transparência impõem um modelo de gestão mais pragmático. O ensino superior precisa deixar de operar com base em crenças e passar a atuar com base em evidências. 

Isso significa medir, comparar, corrigir e decidir com clareza. A verdadeira saúde institucional não está no discurso inspirador, mas na capacidade de alinhar propósito, performance e pessoas em torno de resultados concretos. 

É nesse ponto que o Índice de Saúde Organizacional (OHI) da McKinsey se torna um espelho incômodo, e necessário para as instituições que desejam não apenas ensinar sobre gestão, mas finalmente aprender a praticá-la.

 

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Mais do que medir resultados, o OHI mede a vitalidade de uma organização. A McKinsey define saúde organizacional como a capacidade de uma organização de alinhar, executar e renovar-se mais rápido do que seus concorrentes para sustentar um desempenho excepcional ao longo do tempo.”

Na prática, o OHI funciona como um termômetro de longevidade institucional, identificando as práticas, comportamentos e culturas internas que sustentam a performance.

Para o ensino superior, trata-se de uma ferramenta especialmente valiosa: uma IES saudável é aquela capaz de equilibrar excelência acadêmica, sustentabilidade financeira e relevância social, mesmo em ambientes de incerteza.

 

As nove dimensões da saúde organizacional

O modelo estrutura a saúde organizacional em nove dimensões, que se desdobram em práticas observáveis. No contexto da gestão universitária, o OHI oferece uma lente estratégica para compreender como o equilíbrio entre pessoas, processos e propósito impacta diretamente a qualidade acadêmica e a sustentabilidade institucional.

 

1. Prestação de contas

Envolve a clareza das funções, o estabelecimento de metas de desempenho, o feedback constante, a gestão de consequências e a responsabilidade pessoal, criando uma cultura em que cada indivíduo entende e assume seu papel nos resultados.

Nas IES, isso significa substituir estruturas hierárquicas e difusas por uma governança de resultados, em que cada gestor, coordenador e docente compreende seus indicadores e responde por eles.

 

2. Direção

A dimensão de direção refere-se à construção de uma visão comum, à clareza das estratégias e, sobretudo, ao propósito comum, que orienta as decisões e garante coerência entre missão, valores e ações cotidianas.

Na gestão universitária, traduz-se na capacidade de alinhar o corpo docente, os programas acadêmicos e os investimentos institucionais a uma mesma visão de futuro educacional.

 

3. Coordenação e controle

Tratam da análise de desempenho do pessoal, da gestão operacional, financeira e de riscos, bem como da disciplina e da conduta institucional, assegurando que a execução siga padrões de eficiência e integridade.

Aplicado às IES, reforça a importância de processos integrados, uso de indicadores e governança financeira sólida para equilibrar sustentabilidade e qualidade.

 

4. Orientação externa

Analisa o grau de conexão da organização com o ambiente ao seu redor, englobando a atenção ao cliente, os insights sobre a concorrência, as parcerias de negócios, a responsabilidade social e as relações governamentais e setoriais, fatores que revelam o quanto a instituição aprende com o mundo que a cerca.

No ensino superior, representa o compromisso da universidade com seu ecossistema, desde o diálogo com o mercado até a contribuição social por meio da pesquisa, extensão e impacto regional.

 

5. Liderança

Avalia-se o equilíbrio entre estilos distintos: a liderança decidida, que age com clareza e coragem; a consultiva, que ouve e pondera; a empoderadora, que estimula a autonomia; a apoiadora, que fortalece o coletivo; e a desafiadora, que inspira superação.

Em IES, líderes saudáveis são aqueles que transformam visões institucionais em práticas diárias, promovendo autonomia docente e protagonismo estudantil.

 

6. Inovação e aprendizagem

Mede a capacidade institucional de criar e evoluir continuamente, combinando inovação de cima para baixo e dos funcionários, o compartilhamento de conhecimentos, a tomada de decisões com base em dados e a captação de ideias externas.

Na gestão universitária, significa transformar a cultura organizacional em uma plataforma de aprendizado constante, onde dados, tecnologia e colaboração direcionam o avanço acadêmico e administrativo.

 

7. Capacidades

Representam o alicerce estrutural da organização, expressas no domínio de processos, na aquisição, desenvolvimento, alocação e capacitação de talentos, além do fortalecimento tecnológico como suporte essencial à operação e à inovação.

No ambiente universitário, isso implica atrair e desenvolver docentes e gestores capazes de integrar excelência acadêmica, domínio digital e visão estratégica.

 

8. Ambiente de trabalho

Reflete o clima interno, sustentado pela abertura e confiança, pela transparência sobre o desempenho, pela inclusão, pelo senso de pertencimento e pelas normas de convivência saudáveis que favorecem a cooperação.

Em IES, é o que diferencia equipes desmotivadas de comunidades acadêmicas vibrantes e colaborativas, capazes de inspirar estudantes e inovar no cotidiano.

 

9. Motivação

Abrange os valores dotados de sentido, a inspiração exercida pelas lideranças, os incentivos não financeiros, as práticas de reconhecimento e as oportunidades de crescimento que mantêm o engajamento coletivo e o orgulho institucional.

No contexto universitário, traduz-se na valorização simbólica e profissional do corpo docente e técnico, reforçando o sentimento de pertencimento e orgulho de fazer parte de uma instituição transformadora.

Entre todas essas dimensões, destaco cinco como pilares vitais da saúde organizacional de uma IES.

Propósito comum: dá direção e coerência às decisões;

Liderança decidida: une coragem e clareza; 

Liderança empoderadora: estimula a autonomia e o protagonismo; 

Tomada de decisões com base em dados: transforma informação em inteligência; 

Capacitação tecnológica: garante agilidade, inovação e aprendizado contínuo.

 

Considerações finais

A verdadeira revolução na gestão universitária virá de uma mudança de postura. As IES precisam abandonar o romantismo de um tempo que já não existe, aquele em que a missão bastava, o prestígio garantia a relevância e a tradição substituía a estratégia. 

O futuro exige pragmatismo, clareza e liderança operacional. É hora de formar líderes que compreendam que idealismo sem execução é vaidade institucional. Líderes capazes de traduzir propósito em processo, valores em resultados e visão em entregas concretas. 

A universidade do amanhã não será guiada por narrativas inspiradoras, mas por gestores lúcidos, que saibam transformar a complexidade em direção, a burocracia em eficiência e o discurso em impacto real.

 

SSIR Brasil | Coliderança como prática para um futuro equitativo

 

Por: Daniel Sperb | 13/11/2025


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