Enquanto há países que optam por um currículo nacional fechado, como a França, outros, como a Espanha apostam em diretrizes mais gerais e currículo mínimo
Publicado em 10/09/2011
Em entrevista publicada em
Educação
(dezembro de 2008), Claude Carpentier, professor da Universidade de Picardie Jules Verne, defendeu uma base única para o currículo escolar brasileiro. Sua justificativa é de que um país precisa ter uma identidade nacional. Na França, o sistema educacional trabalha com uma matriz curricular unificada para todas as redes. O grau de liberdade das escolas é quase inexistente – restringe-se à escolha das obras literárias, que podem ser escolhidas pelo professor de acordo com o nível de ensino.
O documento que instituiu as diretrizes curriculares,
Programmes Scolaires
, traz os conteúdos por nível de ensino. No material, encontram-se quadros com o número de horas que devem ser dedicadas a cada disciplina.
Já na Espanha, o grau de liberdade dado às comunidades autônomas e aos centros docentes é grande. É responsabilidade do governo federal definir uma base curricular mínima, que traga objetivos, competências básicas, conteúdos e critérios de avaliação. A partir dessas diretrizes, as comunidades autônomas (os estados espanhóis) estabelecem um currículo para cada etapa educativa, que se juntará ao que foi definido nacionalmente. As diretrizes nacionais representam o equivalente a 65% do currículo, sendo o restante definido localmente. Isso vale para as comunidades em que o espanhol é a única língua oficial. No caso de a Catalunha, do País Basco e da Galícia, a porcentagem é de 55%. Aos centros docentes, que são como regionais de ensino, cabe completar o currículo que vem das administrações educativas das comunidades autônomas.
"Isso significa que eles têm autonomia pedagógica, organizacional e de gestão, que garante que a realidade de cada centro seja respeitada", explica Álvaro Martinez-Cachero, secretário-geral do Conselho de Educação Espanhol no Brasil.
No Chile, há três tipos de orientadores curriculares. O primeiro, denominado "marco orientador", oferece diretrizes distintas, conforme a etapa da educação do aluno. O marco orientador da educação infantil traz um conjunto de fundamentos, objetivos de aprendizagem e orientações para trabalho. Nesse caso, as bases curriculares são amplas e flexíveis, admitindo diversas ênfases de conteúdo. No caso dos ensinos fundamental e médio, a liberdade é mais restrita. O marco orientador do ensino fundamental relaciona as competências que todos os alunos devem nessa etapa. No ensino médio, há uma distinção entre os conteúdos da formação geral comum às áreas de humanidades, científica e técnico-profissional, e outra base curricular diferenciada, com foco na especialidade que o aluno escolhe.
Para a Educação Básica há, como na França, as cargas horárias para cada disciplina, que são os Planos de Estudo. O Ministério de Educação também orienta os professores com os Programas de Estudo, metodologias e atividades específicas para abordar os conteúdos mínimos obrigatórios.
Decisão dos estados
O caráter federativo é o que prevalece nos Estados Unidos. Lá, apesar de existir um documento nacional que consolida as bases curriculares, a definição real do currículo acontece em cada estado. "Mas todos os professores sabem o que o aluno deve saber ao final de cada ano escolar", aponta Daniel Forbes, responsável pelo currículo da Chapel School, escola bilíngüe em São Paulo. O Estado da Califórnia oferece seus parâmetros curriculares no site do
Californian Board of Education
(Conselho de Educação da Califórnia).
O documento com as orientações para a língua inglesa traz as competências que os alunos devem ter, por exemplo, ao ingressar nos anos 11 e 12. Uma delas, por exemplo, é "analisar trabalhos reconhecidos da literatura norte-americana". No Estado de Nova York, o quadro é o mesmo. Há um documento com uma lista de competências para a língua inglesa, entre as quais, para o ano 12, está a de que o aluno saiba avaliar textos não-ficcionais, incluindo jornais, manuais técnicos e papéis oficiais. A semelhança com a matriz curricular de uma avaliação como a Prova Brasil não passa despercebida.
Em agosto de 2004, após identificar um cenário extremamente heterogêneo e fragmentado na educação argentina, o Ministério de Educação do então presidente Néstor Kirchner criou um Núcleo de Aprendizagens Prioritárias (NAP), que publicou uma série de documentos oficiais para todas as disciplinas, divididos por etapa de ensino, com algumas orientações. Entre diretrizes para matemática e espanhol, ganharam destaque as seguintes disciplinas: formação ética e cidadania, educação física e educação tecnológica.
Mesmo levando em conta as diferentes realidades e a diversidade dos desenhos curriculares de cada jurisdição, o governo afirmou que as aprendizagens prioritárias eram indispensáveis, já que buscavam oferecer condições de igualdade e eqüidade, e traziam temas e problemas das principais disciplinas, acompanhados de suas formas de resolução e dos meios de aplicação dos conteúdos. Para complementar o material, os
Cuadernos para el aula
(Cadernos para a aula), que sistematizavam os conteúdos. O NAP também foi responsável pela criação de duas coleções: o Juntos para melhor a educação e o Conhecer os saberes dos nossos alunos, este último com objetivo de ajudar o professor na elaboração de avaliações. O Ministério da Educação argentino discute constantemente os conteúdos e as didáticas de cada disciplina, em encontros chamados "jornadas". A última aconteceu em outubro, para discutir o ensino de ciências.
Bolivarianas
Na Venezuela, o Ministerio del Poder Popular para la Educación (Ministério do Poder Popular para a Educação) ofereceu um espaço on-line para que a população opinasse na construção do "Nuevo Currículo para La Formación Ciudadana de la República Bolivariana de Venezuela". A proposta foi validada em março do ano passado, após levantar aspectos polêmicos, como a abolição do termo "mestiço". A reforma curricular de Hugo Chávez copia o sistema cubano, que coloca a educação a serviço da formação do "homem novo", conceito inspirado em Che Guevara, líder da revolução cubana. Assim como em Cuba, em que todas as escolas seguem o mesmo currículo oficial há décadas, Chávez instituiu as novas bases curriculares para todas as instituições de ensino venezuelanas – em 2007, chegou a ameaçar prender os diretores de ensino que se recusassem a segui-las e a nacionalizar as escolas e universidades que não as adotassem.