NOTÍCIA
Aumentar a carga horária é apenas um dos desafios do modelo de ensino integral, que conquista cada vez mais espaço no Brasil
Publicado em 10/04/2013
Alunos do Colégio Sidarta durante aula de mandarim |
O impacto do tempo integral na aprendizagem não é bem conhecido no país. O tema entrou na agenda brasileira só no fim da década de 1990, com a universalização do ensino fundamental. Mas há indicativos importantes, como o estudo apresentado em 2011 pela economista Juliana Maria de Aquino, como tese de doutorado para a Universidade de São Paulo. Ao analisar escolas que adotaram a proposta de ensino integral no estado a partir de 2006, a conclusão foi a de que não houve impacto significativo sobre a aprendizagem no último ano do fundamental.
Isso ocorre por causa da complexidade dos fatores envolvidos na adoção de projetos de tempo integral. Entre eles, a infraestrutura, a carreira do professor e o currículo, que desembocam no tema de educação do momento – o financiamento.
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Horário de qualidade
Ao mesmo tempo, pesquisas recentes mostram que falta tempo para o estudo no Brasil. Um cálculo feito em 2009 pelo economista Marcelo Néri, hoje presidente do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), mostrou que os alunos com idade entre 4 e 17 anos permaneciam, em média, 3,8 horas diárias na escola. Já seria pouco se todo o tempo escolar fosse bem aproveitado.
Outro trabalho, realizado em 2011 pela economista Bárbara Brum, do Banco Mundial para Educação na América Latina, comprovou que, em cada aula de 50 minutos nas redes estaduais de Pernambuco e Minas Gerais, e na rede municipal do Rio de Janeiro, só 33 minutos são aproveitados de fato em atividades de ensino-aprendizagem. O restante é gasto em tarefas burocráticas (como chamadas) ou com problemas disciplinares. Entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne 34 países de alto PIB para estabelecer parâmetros de comparação de políticas econômicas e sociais, a média de aproveitamento das aulas é de 42 minutos e 30 segundos.
Contudo, a resposta a esse problema não é apenas elevar a carga horária. “Só assegurar mais tempo para um ensino ruim não ajuda nada”, acrescenta o especialista em avaliação José Francisco Soares.
Para Isabel Santana, gerente de educação e avaliação da Fundação Itaú Social, a primeira providência é desviar o foco do “tempo” para mirar no “integral”. Segundo Isabel, o aumento da permanência do aluno no espaço escolar é condição necessária, mas não suficiente para definir o período ampliado. “O tempo é uma das dimensões em jogo, não a única”, diz.
No estudo de Juliana Aquino, entre os problemas estava a falta de clareza dos objetivos da ampliação de atividades. Quando lançado, o programa Escola de Tempo Integral paulista baseava-se em uma jornada de até nove horas diárias, com atividades em turno e contraturno, e oficinas. Segundo a pesquisadora, nas escolas estudadas não havia consenso entre os professores sobre os objetivos buscados: para uns, não era reforçar a aprendizagem, mas oferecer abordagens lúdicas. Para outros, era estimular o interesse para o aprendizado.
Currículo desconectado
É na dimensão do currículo – daquilo que os alunos de fato vão aprender na escola – que se concentram os grandes desafios do tempo integral brasileiro. O ensino integral deve dar conta de um conjunto de ações educativas relativas não só a um trabalho ampliado no ensino das disciplinas, mas na oportunidade para a prática de esportes e atividades expressivas, a interação com a comunidade circunvizinha à escola, no desenvolvimento de habilidades não cognitivas do aluno (como a convivência, a formação de atitudes e valores, princípios de saúde e qualidade de vida). Não se trata de acoplar à escola um conjunto de disciplinas acessórias, mas de conceber um projeto pedagógico integrado, em que oficinas de informática ou projetos comunitários, por exemplo, façam sentido com as diferentes disciplinas.
O temor dos especialistas quando se fala na perspectiva integral é subdimensionar a dimensão do desenvolvimento global, preenchendo o tempo extra com oficinas desconectadas do projeto pedagógico ou aulas que repetem o modelo do ensino regular. Daí a importância de ter o tempo integral como um componente indissociável do projeto pedagógico da escola, como alerta a especialista Isa Guará.
“Uma composição curricular eficaz e eficiente deve promover uma articulação entre os vários aspectos da vida – a saúde, a sexualidade, a vida familiar e social, o meio ambiente, o trabalho, a ciência e a tecnologia, a cultura, as linguagens – com as áreas de conhecimento. Para isso, é preciso adotar cada vez mais uma perspectiva interdisciplinar e transdisciplinar”, ressalta Alexandre Isaac, da organização social Cenpec, que atua na implantação de projetos de educação integral.
Por isso, os especialistas defendem o trabalho na perspectiva do currículo integrado, rompendo com a cisão entre o momento de estudo de conteúdos e o de descontração, sem intenção pedagógica.
Confusão
Se não havia clareza entre os docentes, tampouco entre os alunos. Para alguns, há a distinção entre a seriedade do período matutino e a “bagunça” do contraturno. Para outros, predomina o cansaço de permanecer muito tempo na escola.
Daí a importância de saber o que as escolas estão, de fato, fazendo com seu tempo extra. Neste semestre, será conhecido um dos mais amplos conjuntos de estudos sobre o tema, produzido por universidades federais a partir de entrevistas quantitativas e qualitativas em escolas que aderiram ao programa Mais Educação, do governo federal, que estimula a passagem do tempo parcial ao integral, por meio de injeção direta de recursos.
O programa é um dos responsáveis pela expansão do modelo, mais do que dobrando de tamanho entre 2010 e 2011. Com 34 mil escolas selecionadas em 2011, deve chegar a 45 mil até o fim do ano – escolhidas entre as que apresentam Ideb mais baixo e atendem populações socialmente vulneráveis. O tempo integral garante às redes municipais e estaduais 25% a mais de recursos, no cálculo do Fundeb.
Em dois estudos, pesquisadores de universidades federais investigaram como o tempo era usado. Identificaram o predomínio de atividades esportivas (em 65% das escolas do Mais Educação), seguidas de reforço escolar, música e dança. É patente a pouca ênfase em artes plásticas e visuais, em línguas estrangeiras e formação para o trabalho. “Antes, perguntávamos o que as escolas estavam fazendo no tempo integral; agora, perguntamos sobre coisas que deveriam estar sendo feitas”, resume Verônica Branco, que coordena a pesquisa na Universidade Federal do Paraná.
Um estudo qualitativo dessas equipes, em 22 municípios brasileiros, trouxe boas pistas em 2010. Embora tenha identificado experiências positivas e amadurecimento das propostas, o trabalho apontou os desafios vividos pelas redes no plano da infraestrutura, dos recursos humanos e do currículo. Mostrou, por exemplo, que a concentração de atividades complementares no contraturno confere o caráter de pouco-caso, de brincadeira, às iniciativas. Já a divisão das atividades de professores e o trabalho de oficineiros e monitores leva a uma baixa integração (e até conflitos) entre as equipes e à desconexão com o projeto pedagógico.
“Se os objetivos são claros e compartilhados e as prioridades são discutidas pelas equipes escolares, consolida-se a possibilidade de que cada segmento incorpore como seus os objetivos propostos”, escrevem os pesquisadores. Isso é o que faz com que toda a comunidade “vista a camisa” e o tempo integral perca o ar assistencialista.
Reforço ou complemento?
É um equilíbrio delicado: estudo de caso do Mais Educação demonstra que o foco exclusivo no reforço escolar é contraproducente. Obtêm melhores resultados as escolas que oferecem aos alunos uma gama mais diversificada de atividades, sem perder de vista os objetivos de ensino-aprendizagem.
Segundo o Censo Escolar 2011, as aulas de reforço, especialmente em matemática, são predominantes no período integral público. Já na rede privada predominam atividades lúdicas e jogos não estruturados. “O aprendizado se relaciona de forma complexa com qualquer variável. Nenhuma isoladamente produz resultados inequívocos. As crianças e jovens aprendem de muitas maneiras”, diz José Francisco Soares.
O modelo integral vem se adaptando às limitações estruturais brasileiras, com práticas como a interação social nas atividades comunitárias em espaços como quadras, paróquias e parques. “Ampliar os espaços é uma forma inteligente para oferecer mais tempo de educação a gerações que não podem esperar a duplicação da infraestrutura escolar”, diz Isabel.
Em Santos, onde a educação integral virou prioridade municipal, o déficit de espaço foi contornado pela construção de 18 núcleos, em que atuam 450 educadores com atividades complementares em três eixos: artes, esportes e orientação pedagógica. São atendidos cinco mil crianças e jovens. Os alunos vão a espaços comunitários e ônibus escolares fazem o transporte diário. Segundo a secretária adjunta Cristina Barletta, a rede santista possui só cinco escolas projetadas para funcionar no regime de tempo integral, e os núcleos foram o caminho escolhido.
As soluções devem atender às características locais e somar esforços com outras áreas do governo, em políticas intersetoriais, e com forças da comunidade e organizações sociais. Parcerias foram bem aproveitadas em Belo Horizonte, após mapeamento de projetos que os alunos já frequentavam espontaneamente. Hoje, há mais de 60 ONGs cadastradas pela secretaria municipal.
“É preciso somar atores na tarefa de educar as crianças para além da escolarização, e a articulação com outros atores e instituições concretiza a proposta de apropriação do território e de valorização da cultura local. Dessa forma, é desejável que essa articulação aconteça”, opina Isaac, do Cenpec.
Por outro lado, alerta o especialista, os professores que atuam no tempo integral precisam de formação continuada específica, não só para fazer frente a novos cursos e conteúdos, mas para compreender a dimensão da proposta.
Para implantar projetos de tempo integral, as redes precisam, por exemplo, rever as carreiras dos docentes, um tema complicado. O Rio de Janeiro se prepara para isso, garante a secretária da Educação da cidade, Claudia Costin. O objetivo é transformar toda a rede em um turno único de sete horas, e para isso os professores contratados já começam em um novo desenho funcional em seu plano de carreira, prevendo a dedicação integral, em 40 horas semanais.
A cidade – pioneira nos projetos de tempo integral, com os Cieps – implantou o projeto Escolas do Amanhã, em regiões violentas, com resultados significativos. É o caso do Ciep 1º de Maio, que alcança os melhores índices do Ideb e é considerado a melhor escola municipal carioca. Para o diretor Ocimar Nascimento, o tempo integral permite um olhar único sobre os alunos, com foco individualizado sobre suas dificuldades. “Ele deixa de ser um aluno desse ou daquele professor, e se torna aluno de todos, o tempo todo”, diz.
Há perspectivas para o ensino integral brasileiro se os desafios forem enfrentados no tamanho em que se apresentam. Muitas redes já se aproximam dos 100% de cobertura, como em Sorocaba, no interior paulista. Lá, a oferta passou de sete escolas em 2007 para 32 em 2012. Os alunos permanecem na escola por 8 horas e 40 minutos diariamente, em atividades como espanhol, inglês, educação ambiental, leitura, jogos de raciocínio, xadrez e esportes. Algumas são ministradas por professores da própria rede; outras, por profissionais especializados.
Seguindo o programa Cidade Educadora, os alunos desenvolvem regularmente atividades em parques, praças e outros espaços comunitários. Segundo a secretaria de Educação, Dulcina Guimarães Rolim, os resultados aparecem no Ideb. “Analisando o Ideb das escolas abrangidas pelo programa, entre 2007 e 2011, vimos que as de tempo integral foram as que atingiram melhores resultados. Por isso, os planos são de expansão”, diz.
Quem paga a conta
Como em Sorocaba, outras cidades caminham para a universalização do período integral. Mas as possibilidades de efetiva ampliação estão ligadas ao financiamento. Não se sabe exatamente quanto demandaria de recursos a implantação de um projeto de ensino integral, seja pela dificuldade de estabelecer parâmetros comuns em redes tão diferentes, seja pela exiguidade de verbas.
No ano passado, o escritório da Unesco no Brasil e a Campanha Nacional pela Educação iniciaram um estudo para a definição do custo-aluno na escola integral. O cálculo partiria da base metodológica do Custo Aluno Qualidade Inicial (CaQi), índice criado pela CNE e pela Cenpec para estimar o valor a ser investido por aluno.
O Caqi avalia em R$ 2,8 mil o valor por aluno do fundamental I, o que estava acima dos recursos investidos por todos os estados brasileiros, em 2010. Segundo Daniel Cara, coordenador nacional da CNE, o processo está em fase de finalização, à espera da definição dos valores a serem investidos no quadro de professores.
Mas é fácil ver a distância entre as perspectivas de governo e as das organizações sociais. Enquanto o MEC estima um investimento da ordem de R$ 3,8 bilhões para que a meta estabelecida pelo PNE seja alcançada no campo da educação integral, a CNE calcula o montante em ao menos R$ 24 bilhões – diferença que ilustra a complexidade do desafio de implantar o turno mínimo de 8 horas nas escolas brasileiras.
A ampliação do atendimento integral nas escolas está condicionada à capacidade de financiamento – questão central para o PNE que tramita no Congresso Nacional.
Segundo o pesquisador da USP José Marcelino Rezende Pinto, ex-diretor do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) e um dos responsáveis pelo cálculo do CAQi, é possível estimar que o custo aluno em tempo integral é pelo menos 70% maior do que o do aluno em turno regular.
Mas o número pode subir, alerta o pesquisador. “Se pensarmos em uma escola que oferece atividades dinâmicas, como laboratórios de ciências, artes, esportes, reforço escolar, aberta todo o dia para a comunidade escolar, com professores em dedicação exclusiva, espaços como laboratórios, auditórios, bibliotecas de verdade, salas de estudo, chegaríamos a um custo/aluno-ano que quase duplicaria o que se pratica atualmente na rede pública, mas que é bem menor do que cobram boa parte das escolas privadas (de tempo parcial) que a classe média frequenta”, analisa Pinto.
Daí para a discussão sobre a porcentagem do PIB investida em educação é um passo. Segundo o pesquisador, para generalizar o atendimento integral em boas condições seria necessário investir cerca de 7,5% do PIB imediatamente, ante os 5% hoje investidos. Enquanto os movimentos sociais, como a Campanha Nacional pela Educação, reivindicam a elevação para 10%, o governo amarrou a questão à distribuição dos royalties do petróleo – um recurso que ainda está longe de chegar aos cofres públicos.
Ensino médio
Quando se fala na jornada escolar ampliada, vêm à mente atividades de artes, esportes e outras atividades lúdicas, envolvendo crianças. Mas o tempo ampliado para alunos do ensino médio tem características específicas. Demanda um projeto pedagógico próprio.
Experiências nos estados têm explorado, por exemplo, o caráter de aproximação com o mundo do trabalho. É o caso do Ceará, que desde 2008 desenvolve o projeto Escolas Estaduais de Educação Profissional, hoje com 92 instituições e 31 mil alunos matriculados, em 70 municípios. A meta é atingir 140 escolas até o fim de 2014.
No modelo cearense, as aulas ocorrem das 7h às 17h. A carga ampliada abarca os conteúdos de ensino profissional, que varia conforme a região. Prevê, também, um estágio remunerado no último ano do curso. Entre as disciplinas, estão conteúdos de empreendedorismo, em parceria com o Sebrae.
No vizinho Pernambuco, o tempo integral no ensino médio vive rápida expansão, e mira aproximar-se dos 90% de cobertura em dois anos, com 300 escolas nesse regime. A grade horária inclui projetos transversais na área de cidadania, língua estrangeira, mas abre espaço a projetos de qualificação profissional, como a Escola Social do Varejo. Nesse caso, o modelo não se mistura ao ensino técnico, que tem rede própria em tempo integral.
No estado, o modelo de trabalho pedagógico foi influenciado pela marcante experiência do Ginásio Pernambuco, uma centenária escola pública que, deteriorada, foi revitalizada em 2004, com a participação de empresários e um modelo diferenciado de gestão, com remuneração variável e dedicação completa dos docentes. No tempo integral atual, os professores podem receber um adicional, que chega a dobrar sua remuneração, e têm dedicação exclusiva.
“No início, eram poucas escolas nesse modelo. Agora temos muitas. Em 20% das com alunos que completaram o ensino médio, o Ideb supera os 5 pontos, até 2 pontos acima da média do ensino regular”, estima o ex-secretário de Educação de Pernambuco, Anderson Gomes. Isso, para ele, mostra o potencial do regime estendido. “Por isso, precisamos ofertar o tempo integral desde os primeiros anos de escolaridade”, defende.
Para Gomes, além de oferecer mais qualidade de vida para os docentes, o ensino integral traz ganhos intangíveis para a formação do adolescente. “Ele passa a conviver o dia todo com seus professores, que o conhecem pelo nome e com os quais cria vínculos”, diz.
Rendimento
As experiências pernambucanas e cariocas inspiraram o modelo que o Estado de São Paulo acaba de lançar. Fazem parte do quadro a dedicação exclusiva de docentes (que receberão 75% a mais do salário), com turnos de 40 horas.
A nova proposta é um passo adiante do projeto Escola Integral criado em 2006, que chegou a pouco mais de 500 escolas e se desenvolveu com problemas. Um levantamento recente feito pelo jornal O Estado de S. Paulo mostrou que o rendimento dos alunos pouco avançou nas escolas em tempo integral.
Segundo Valéria de Souza, embora haja atividades e abordagens diversificadas, o compromisso do trabalho é com o desenvolvimento das competências linguísticas e matemáticas. “Temos como responsabilidade dar um passo a mais, promovendo a aprendizagem e a melhoria do aproveitamento escolar”, diz. Com isso, a expectativa da educadora é também encontrar um novo sentido para o ensino médio, etapa escolar que busca sua identidade e onde se encontram os piores índices da educação brasileira.
A cultura do turno e contraturno | |
Há pouco tempo, o Brasil não tinha vagas suficientes para todas as suas crianças e adolescentes, que se espremiam em até quatro turnos diários – inclusive o chamado “turno da fome”, no horário do almoço. Daí surgirem os projetos de turno (das aulas regulares) e contraturno (das atividades complementares). “Não temos ainda o verdadeiro ensino integral, precisamos investir muito em infraestrutura”, reconheceu o ministro da Educação, Aloísio Mercadante, em evento realizado em São Paulo no início de março. Não é difícil entender o porquê. Segundo o Censo 2011, uma simples quadra esportiva é um recurso disponível para apenas 27,5% das escolas públicas. Há bibliotecas em 40% das escolas e laboratórios de informática em 44% delas – índices que caem bastante quando se tomam isoladamente regiões como o Norte e o Nordeste. Cerca de 58% das escolas de Educação Básica têm até cinco salas de aula. Assim, o tempo integral requer a ampliação da infraestrutura, já que boa parte das escolas públicas atuais nem sequer dá conta das demandas do tempo parcial. |
Escolas recusam projeto | |
O Observatório da Educação, braço informativo da associação civil sem fins lucrativos Ação Educativa, levantou, no final do ano passado, que das 76 escolas convidadas oficialmente pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo para participar do Programa Educação: Compromisso de São Paulo, apenas 32 aceitaram aderir ao projeto. |
Países desenvolvidos aboliram tempo parcial | |
A escola de tempo integral do Brasil é uma variação dos modelos existentes nas nações desenvolvidas. Nos países europeus e em vizinhos como Chile e Uruguai, ela alcança todos os alunos, com turno único em toda a rede de ensino. Praticamente não há ensino em tempo parcial e todas as crianças ficam o dia inteiro na escola. O projeto pedagógico é um só, articulando todos os conteúdos, as habilidades, as competências e os valores que devem ser trabalhados de manhã ou à tarde. |
Professor integral | |
Não é só espaço que falta. A rede pública sofre de problema ainda mais central: a carência de professores e profissionais. Estender o tempo de atendimento escolar pressupõe haver docentes para as atividades regulares e para as oferecidas aos alunos, como artes, música, esportes. Para o especialista em avaliação José Francisco Soares, o modelo brasileiro precisa caminhar para uma proposta integral também para os professores, fixando o docente na escola por uma jornada de oito horas, o que permitiria que conhecesse melhor seus alunos, pudesse desenvolver suas atividades em mais tempo e aumentasse o compromisso com o desenvolvimento global dos alunos. Isso esbarra no próprio modelo das carreiras dos professores de redes municipais e estaduais, concebido em contratos baseados no tempo parcial. No ensino médio, em especial, há falta de professores em diversas áreas, como física, química e biologia. Não por acaso, o ensino integral passou a ser debatido pelas entidades sindicais, como a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), que defende a jornada ampliada.Hoje, muitas escolas limitam-se a apoiar a extensão da jornada com a contratação de monitores. Fontes que já foram ligadas ao Ministério da Educação avaliam que as escolas ainda preferem contratar temporários sem formação pedagógica a investir na ampliação da presença dos professores. O tempo ampliado não se resolve apenas com as equipes atuais e as parcerias comunitárias. Para Isa Guará, uma das primeiras pesquisadoras no tema e hoje professora do mestrado da Universidade Bandeirantes, é preciso observar os desfalques no time escolar – o grupo-escola – característico de muitas redes no Brasil. “Fizemos muito esforço para colocar todas as crianças na escola e deixamos a gestão apenas com um diretor e um coordenador. Não há equipe para trabalhar. Cadê os orientadores pedagógicos? Onde estão os outros profissionais? No passado, tínhamos até projetos de serviço social”, lembra. “É preciso saber quem são os profissionais que vão ocupar o tempo das crianças”, alerta a pesquisadora Verônica Branco, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que nos últimos anos participa de avaliações da rede de educação integral. |