NOTÍCIA

Ensino edição 225

Como a Finlândia transformou o conhecimento em um de seus maiores ativos

Finlândia deixa para trás a economia rural e se torna um dos países mais industrializados e inovadores do mundo. O segredo por trás desse salto está na educação de alta qualidade, ressalta o ministro da Economia Mikka Lintilä

Publicado em 18/12/2017

por Ana Carolina Nunes

mika-lintila-destaque Mikka Lintilä, ministro da Economia da Finlândia: o alto nível educacional da população é considerado um dos grandes ativos do país

Mikka Lintilä, ministro da Economia da Finlândia: o alto nível educacional da população é considerado um dos grandes ativos do país

Pode surpreender que a Finlândia esteja passando por uma modernização em seu sistema educacional, reconhecido como um dos melhores do mundo.

Porém, para o ministro da Economia do pequeno país nórdico, Mikka Lintilä, a movimentação é mais do que natural. Visto que a sociedade está em meio a uma mudança de paradigma no mercado, em que postos de trabalho estão desaparecendo e outros surgindo em ritmo nunca antes visto, não há outra saída senão se adequar a essa nova realidade e promover reformas em todo o sistema educacional, da educação infantil ao ensino superior.

A clara percepção dessas transformações é o que também estimula o governo finlandês a apostar na cooperação entre empresas e universidades, algo que deve crescer ainda mais nos próximos anos, como adianta o ministro nessa entrevista concedida durante visita ao Brasil.

Ele veio a São Paulo a convite do Semesp para realizar a abertura do encontro “A economia e a formação de competências”, realizado na ESPM. Na ocasião, os participantes puderam conhecer tanto as plataformas de aprendizagem on-line como os métodos inovadores de ensino das principais universidades e empresas do setor de tecnologia e educação da Finlândia.

Por que a Finlândia está promovendo uma reforma em seu sistema educacional? Quais são as mudanças previstas para o ensino superior?
Estamos em meio a uma reforma educacional na Finlândia, pois estamos atravessando uma mudança de paradigma no mercado de trabalho. A digitalização, a inteligência artificial e as inovações vão transformar o mercado e também a nossa forma de estudar. Vamos ter uma situação em que um número significativo de antigas profissões vai desaparecer e uma série de novas vai surgir. Estamos promovendo uma reforma das políticas públicas e da educação com o objetivo de responder a esses desafios. Isso significa que a importância da cooperação entre empresas e universidades de ciências aplicadas vai crescer bastante nos próximos anos. E as nossas políticas públicas e as decisões terão enorme efeito para a economia do país. Outro fenômeno novo que vamos ter é o da ‘aprendizagem a vida inteira’. Vamos ter de continuar estudando a vida toda.

Os cursos a distância e os tecnológicos desempenharão algum papel especial nesse processo de mudanças?
Nesse novo paradigma do trabalho, a educação vocacional aparece com mais intensidade. São as escolas vocacionais que terão a responsabilidade de fazer a educação de transição, pois elas têm bastante facilidade e habilidade para preparar alunos para trabalhar em diferentes áreas.

No Brasil, há uma grande preocupação em aproximar as escolas do setor produtivo para melhorar a formação dos profissionais. Porém, não há uma política pública para viabilizar isso. Cada instituição tem de encontrar seus meios de fazer parcerias. Como isso funciona na Finlândia?
Nós direcionamos os investimentos de inovação para universidades e unidades de pesquisa que já têm cooperação com empresas, então isso acaba sendo um incentivo tanto para as instituições como para as empresas que querem estar envolvidas com inovação.

Além desses investimentos, quais são as outras formas de aproximação entre as IES e o setor produtivo, incluindo as startups?

Lintilä: investimentos direcionados para instituições que já têm cooperação com empresas

Na Finlândia, há um número significativo de startups que surgem nas universidades durante os estudos. As universidades têm toda a ciência de que há uma concorrência por bons profissionais no mercado e por isso querem preparar seus alunos desde o início. Por outro lado, as empresas vão atrás desses talentos e oferecem aos estudantes a possibilidade de colocar em prática suas ideias durante o período de formação. Outro ponto significativo é que nos conselhos das universidades há lugares para representantes de empresas. Então a cooperação já começa nos conselhos.

 

E esses conselheiros têm que grau de interferência no currículo acadêmico?
Claro que eles trazem a sua visão e suas preferências para o debate, mas o fio condutor ainda é o lado pedagógico e as necessidades acadêmicas.

Qual a importância da autonomia das IES neste momento que exige rápidas respostas às transformações em curso?
A autonomia que as IES finlandesas têm é importante em uma série de aspectos, principalmente pela possibilidade de buscar financiamento para além do Estado. As instituições, portanto, não ficam de mãos amarradas ou com restrição para criar diferentes projetos e direcionar as suas pesquisas. Isso ajuda no surgimento de inovações. Nas universidades, em geral, é considerado muito positivo ter essa autonomia.

A relação entre desenvolvimento econômico e ensino superior costuma se dar mais fortemente no âmbito do investimento em pesquisa nas áreas de ciência e tecnologia. Esse é o caminho? Até que ponto a inovação tem influência no desenvolvimento econômico de um país?
Sem dúvida, percebemos a relação entre investimento em P&D e desenvolvimento econômico, especialmente em nosso país, que é um país pequeno e de custo de vida alto. Não podemos concorrer com países com custo de produção mais barato e a única forma de mantermos nosso padrão de qualidade de vida, mantermos o tamanho da nossa economia e até crescer, é por meio de inovações. Um exemplo atual vem da indústria de games no país, que tem gerado muito dinheiro. Essa é a grande história de sucesso da Finlândia atualmente.

Considerando que a Finlândia também era um país com deficiências educacionais na década de 1960 e conseguiu superar isso, como o senhor acredita que podemos trilhar um caminho semelhante e obter ganhos no desenvolvimento econômico?
O fator forte do sistema educacional da Finlândia é que cada parte dele se encaixa muito bem com outras partes do sistema. Educação infantil de qualidade, ambientes de aprendizagem que apoiam o desenvolvimento do indivíduo e ensino na educação básica e ensino médio formam uma base que possibilita aos estudantes do ensino superior serem bem-sucedidos. As IES na Finlândia se encontram numa situação favorável, pois podem planejar o seu sucesso, a sua oferta, confiando na capacidade e nos conhecimentos avançados de estudantes que tiveram uma educação básica de qualidade. A ideia central do nosso sistema é que qualquer pessoa, com qualquer formação ou história de vida, possa estudar até o ponto onde seja possível estudar. Se a pessoa tem a vontade e a inclinação para os estudos, seu nível socioeconômico não vai ser um empecilho e isso é fundamental para uma educação igualitária entre todos.

No Brasil, a taxa de internacionalização nas IES é ínfima (0,2% de acordo com o último Censo do Inep). Qual o impacto da internacionalização da universidade no processo de desenvolvimento econômico de um país?
A Finlândia é uma economia pequena. Somos o lado que saiu ganhando no processo da globalização e esse fator se deve ao conhecimento adquirido e ao processo de internacionalização. O sistema de educação e pesquisa da Finlândia tem possibilitado o desenvolvimento ininterrupto da sociedade e a renovação flexível da economia. Com uma economia aberta e a população altamente formada, a Finlândia tem conseguido aproveitar as forças de transformação global da sua melhor forma. As parcerias internacionais e a ligação entre IES e o mercado são inevitáveis e essenciais. O reconhecimento e aproveitamento de informação e dados relevantes, produzidos em outros países, requerem alto nível de formação e conhecimento da população e também muita pesquisa própria. Os desafios globais não serão solucionados pelos esforços de um país só.

Autor

Ana Carolina Nunes


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