Revista Ensino Superior | A exposição do diferente - Revista Ensino Superior
Personalizar preferências de consentimento

Utilizamos cookies para ajudar você a navegar com eficiência e executar certas funções. Você encontrará informações detalhadas sobre todos os cookies sob cada categoria de consentimento abaixo.

Os cookies que são classificados com a marcação “Necessário” são armazenados em seu navegador, pois são essenciais para possibilitar o uso de funcionalidades básicas do site.... 

Sempre ativo

Os cookies necessários são cruciais para as funções básicas do site e o site não funcionará como pretendido sem eles. Esses cookies não armazenam nenhum dado pessoalmente identificável.

Bem, cookies para exibir.

Cookies funcionais ajudam a executar certas funcionalidades, como compartilhar o conteúdo do site em plataformas de mídia social, coletar feedbacks e outros recursos de terceiros.

Bem, cookies para exibir.

Cookies analíticos são usados para entender como os visitantes interagem com o site. Esses cookies ajudam a fornecer informações sobre métricas o número de visitantes, taxa de rejeição, fonte de tráfego, etc.

Bem, cookies para exibir.

Os cookies de desempenho são usados para entender e analisar os principais índices de desempenho do site, o que ajuda a oferecer uma melhor experiência do usuário para os visitantes.

Bem, cookies para exibir.

Os cookies de anúncios são usados para entregar aos visitantes anúncios personalizados com base nas páginas que visitaram antes e analisar a eficácia da campanha publicitária.

Bem, cookies para exibir.

NOTÍCIA

Políticas Públicas

A exposição do diferente

Campanha contra homofobia traz à tona a questão do preconceito e como lidar com ele na escola; MEC posterga o lançamento

Publicado em 10/09/2011

por Ensino Superior





A cena começa com uma jovem assistindo a uma partida de futebol na escola. Ela conta que o sonho do pai é que ela fosse jogadora de futebol, mas que não levava jeito para a coisa. Lembra da primeira vez que foi à escola com as unhas pintadas de vermelho e ressalta que prefere ser chamada de Bianca em vez de José Ricardo, nome que recebeu quando nasceu.  A estudante lamenta que ainda precisa usar o banheiro masculino e diz que ir ao colégio às vezes é um castigo, apesar de gostar de estudar. Bianca afirma que não sabe se conseguirá terminar a escola, mas conta com o apoio de alguns para terminar os estudos e um dia ser professora.

Essa é a história de um dos filmes de curta-metragem que fazem parte do projeto “Escola sem homofobia”, produzido e idealizado por entidades da sociedade civil que representam a população LGBT e organizações de defesa dos direitos humanos. A ideia do Ministério da Educação (MEC),  a partir do diagnóstico de que os professores não sabem como tratar o assunto em sala de aula, era distribuir às escolas públicas de ensino médio kits com cartilhas e vídeos que estimulassem o debate no ambiente escolar e servissem de suporte aos educadores. Mas, antes mesmo de o material ser divulgado setores da sociedade, principalmente dentro do Congresso Nacional, protestaram e ainda tentam impedir que o chamado “kit homofobia” chegue às salas de aula. O material foi concluído ainda no ano passado e, apesar de toda a produção ter sido acompanhada pela Secretaria de Alfabetização Continuada e Diversidade (Secad), ainda continua “sob análise”, segundo informação do próprio MEC. A pasta sinaliza que ele chegará às escolas no segundo semestre de 2011.

As reações a respeito do material já eram esperadas, conta Maria Helena Franco, da Ecos – Comunicação em Sexualidade, coordenadora do projeto dentro da organização especializada em trabalhar os temas dos direitos humanos e sexualidade com o público jovem. Segundo ela, alguns setores da sociedade, como a bancada religiosa do Congresso Nacional, se sentem “ameaçados” porque não querem que a escola trabalhe a temática. O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) – sim, ele mesmo – personificou a polêmica ao subir à tribuna da Casa para atacar o projeto que, segundo ele, é uma “apologia ao homossexualismo”.

“Esse tipo de posição demonstra total ignorância sobre o assunto porque ninguém se torna gay ou lésbica porque leu um folhetim. O que se está em questão no material é o respeito ao direito do outro de ser diferente. A questão da homofobia e a problemática toda já estão na escola”, afirma Maria Helena. A Ecos foi a responsável pela elaboração do material, em parceria com a rede internacional Global Alliance for LGBT Education (GALE), a ONG Pathfinder do Brasil e a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT). O projeto incluiu seminários regionais e capacitação para docentes da rede pública. O kit acompanha cartas de apresentação aos diretores, três peças audiovisuais e um caderno para o professor com informações sobre o que é a homossexualidade e sugestões de atividades para abordar o assunto em sala de aula. A previsão inicial era que fossem distribuídos 6 mil kits.

Exclusão e evasão
Pesquisa da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) de 2009 apontou que nas escolas públicas brasileiras, 87% da comunidade – sejam alunos, pais, professores ou servidores – têm algum grau de preconceito contra homossexuais. O levantamento foi realizado com base em entrevistas feitas com 18,5 mil alunos, pais, professores, diretores e funcionários, de 501 unidades de ensino de todo o país. Outros estudos mostram um cenário semelhante: a socióloga Miriam Abromoway também investigou o tema entre alunos do Distrito Federal. Entre os 10 mil entrevistados, quase 30% não queriam homossexuais como colegas de classe – e o índice era maior entre alunos menores de 11 anos.

Para Toni Reis, presidente da ABGLT, todos esses diagnósticos reforçam a necessidade urgente de trabalhar a temática nas salas de aula. “A grande consequência desse problema – e a mais grave – é a evasão escolar. Eles acabam desistindo de estudar porque quando você é rejeitado pela sala de aula, não tem incentivo. O material vem ajudar para que as pessoas não fiquem inseguras, trabalhar a autoestima dos adolescentes LGBT para que possam viver bem no ambiente escolar”, defende.  A entidade foi buscar apoio de outras organizações e obteve o parecer favorável ao kit da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), do Conselho Federal de Psicologia e do Programa das Nações Unidas para HIV/Aids (Unaids). Mesmo com essas sinalizações positivas, o MEC mantém silêncio sobre a aprovação do material e a futura distribuição.

Lacuna
A dificuldade da escola em lidar com a homofobia  – e com todos os assuntos que envolvam a diversidade  – é um espelho daquilo que a sociedade pensa. A psicóloga e especialista em sexualidade Claudiene Santos, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), já ministrou capacitações a professores da rede pública sobre homofobia e direitos humanos. Ela lembra que alguns docentes abandonaram o treinamento logo após o primeiro dia pela incapacidade de aceitar o tema. Outros não sabiam que estavam prejudicando um aluno quando faziam vista grossa diante de uma manifestação homofóbica.

“Há uma invisibilidade dentro das escolas por causa do preconceito e o primeiro erro é não reconhecer essa diversidade. A escola está enfrentando diversas formas de violência e perdida, sem saber o que fazer, quando ela é na verdade um espaço privilegiado de promoção dos direitos”, afirma. Claudiene diz que a fala recorrente dos professores é de que não sabem como tratar o tema, seja porque não receberam formação adequada ou mesmo por falta de informação sobre o assunto.

A professora de geografia Bruna Lourenço saiu há pouco da universidade e começa a perceber as lacunas de sua formação em relação a esse e outros assuntos práticos do dia a dia da escola. Licenciada pela Universidade de Brasília (UnB) encara agora turmas dos últimos anos do ensino fundamental de uma escola pública do Distrito Federal e diz que não se sente preparada para agir da forma correta quando o problema aparecer.

“Esse é um assunto um pouco velado porque na idade em que eles estão ainda estão definindo a sexualidade. Quando um aluno chama o outro de `veadinho`, isso ainda é visto como brincadeira. Volta e meia essa piadinha acontece e em geral o agredido se defende de forma bem pejorativa. As relações vão se deteriorando”, conclui a professora.

“Tudo ainda é muito novo para mim. Não sei como agir, o jeito de falar, de interferir em uma situação e amparar o aluno. Na faculdade nunca discutimos isso, são coisas que a gente só descobre na hora”, completa.

A família em livros
Nos livros didáticos, a temática também fica esquecida. Pesquisa do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis) avaliou 67 das 99 obras mais distribuídas pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), responsável por fornecer os materiais a todos os estudantes da Educação Básica da rede pública. O estudo identificou que as comissões formadas pelo MEC para selecionar as obras conseguem impedir que conceitos discriminatórios cheguem até aos alunos, uma vez que a análise não constatou a presença de injúria à população LGBT. Mas a diversidade sexual é esquecida: uma família é retratada, por exemplo, sempre por um pai, uma mãe e um filho. Praticamente não há mães solteiras, muito menos um núcleo familiar comandado por dois pais.

Para Maria Helena, da Ecos, a função do  chamado kit homofobia é justamente dar apoio aos professores e indicar os caminhos para essa abordagem. “Muitas vezes a gente vê que a escola poderia ter uma atitude simples de discutir o assunto, conversar sobre o que é isso. As pessoas precisam de conteúdo e informação e o caderno do professor no kit vem para suprir isso”, defende.

Ex-professor de ensino médio e hoje vice-diretor de uma escola localizada na periferia de Brasília, Luiz  Eugênio de Brito acha que a maioria dos educadores sabe sim intervir em uma situação de conflito, mas avalia que qualquer material de apoio é bem-vindo para ajudar a trabalhar a temática.

“Tenho uma preocupação apenas com a obrigatoriedade. O material de apoio deve ser utilizado nas situações em que o preconceito se manifesta, se você não tem o problema instalado, o melhor seria não ser utilizado”, acredita.

Segundo Brito, a escola dele já realiza um trabalho sobre direitos humanos em que a temática é abordada. “Esse assunto dos direitos humanos e da aceitação das diferenças já é tratado; nas escolas públicas  só o que a gente tem é a diferença, ela é a grande matéria-prima do nosso trabalho”, afirma.

Seja de qual lado estejam as posições, todos concordam que o assunto já está posto no dia a dia dos estudantes. “Sou professor de biologia e toda vez que vamos trabalhar aparelho reprodutor esse assunto aparece. É impossível não falar. O importante é que se fale de uma forma em que se consiga desenvolver atitudes de aceitação e acolhimento”, diz Brito.

Fica a questão sobre como e quando a escola vai tirar os preconceitos de debaixo do tapete. “O assunto ainda é sim um tabu, mas penso que com  as ações da sociedade civil e até mesmo do governo temos visto mudanças. Está mudando, mas a passos lentos. A escola pode ser um espaço de mudança cultural, mas também de legitimação e reprodução dessas assimetrias que existem em relação à diversidade”, aponta Claudiene.

Resta saber se, para que o professor aja diante das situações que surgirem em seu dia a dia, precisará sempre de cartilhas que queiram, de antemão, definir as situações que podem acontecer na escola e as reações “adequadas”. Se usado dessa forma, o material compartilhará o pressuposto de vários outros, que veem no docente um reprodutor de ideias preestabelecidas. Bastaria que ele mudasse a fonte de sua “inspiração”.

Autor

Ensino Superior


Leia Políticas Públicas

EAD

Com o novo marco regulatório, MEC valida o EAD

+ Mais Informações
Área médica

MEC lança avaliação anual na formação médica

+ Mais Informações
Calendário regulatório 2025

Atraso do calendário regulatório prejudica IES

+ Mais Informações
Políticas de permanência

Políticas de permanência geram melhor desempenho acadêmico

+ Mais Informações

Mapa do Site

Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga. Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga.