NOTÍCIA
A atividade de pesquisa também contribui para a formação de bons profissionais para o mercado, comprovam instituições de ensino superior
Publicado em 01/12/2017
Num período como o atual, quando se observa a redução do orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) em 44% e lida-se com a previsão de nova diminuição de 15,5% das verbas em 2018, falar sobre incentivo à pesquisa se torna não só necessário, mas também urgente.
Para docentes do ensino superior, o cenário expõe a fragilidade – ou mesmo a inexistência – de uma cultura de valorização científica no Brasil, ao mesmo tempo que torna propício o debate sobre o papel das instituições de ensino para mudar esse quadro e formar, desde cedo, os futuros pesquisadores e especialistas que vão influenciar ativamente as transformações sociais do país.
É nessa perspectiva que educadores de várias IES destacam a importância e os benefícios do incentivo à iniciação científica nos cursos de graduação. Eles pontuam sua relação com os órgãos públicos de fomento e com os fundos exclusivos para pesquisas, mas não restringem os desafios do tema a isso. Afinal, antes mesmo de desembocar nas instâncias de financiamento, os projetos atravessam os mais diversos obstáculos, muitos de natureza cultural e social.
Para Alexandra Geraldini, pró-reitora de graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), “a pesquisa é uma atividade complexa, que requer tempo, disciplina, reflexão”. Sendo assim, a dedicação a ela se opõe aos objetivos de curto prazo da maioria dos alunos: concluir os estudos e garantir a inserção no mercado de trabalho.
Em meio a esse suposto dilema, cabe às próprias IES fazerem o diferencial. “Para os estudantes, as necessidades imediatas muitas vezes se sobrepõem a projetos cujos resultados são menos mensuráveis a curto prazo. É nosso dever, como docentes e pesquisadores, levá-los ao equilíbrio entre as duas dimensões em seu planejamento de vida”, afirma Alexandra.
Segundo Brigitte Rieckmann, coordenadora do comitê institucional do Programa de Iniciação Científica da Universidade Santa Cecília (Unisanta), as instituições privadas também precisam encarar o fato de que grande parte de seus estudantes são trabalhadores. Ou seja, atuam no mercado durante o dia para financiar o curso no período da noite. “Assim, a necessidade de empregabilidade supera em todos os sentidos a contribuição que a iniciação científica poderá trazer à sua formação, pois sabe-se que a pesquisa no Brasil, lamentavelmente, não oferece grande atrativo econômico”, lamenta a professora.
Dada essa realidade, um importante argumento para sensibilizar os estudantes para a pesquisa é mostrar os seus benefícios, que, aliás, estendem-se aos docentes e às próprias IES.
Antonio Freitas, pró-reitor de ensino, pesquisa e pós-graduação da Fundação Getulio Vargas (FGV), acredita que os programas de iniciação científica nas graduações podem ser usados como um diferencial no mercado. “A oferta de estrutura para pesquisa faz com que o ensino fique ainda mais centrado no estudante, e, assim, torna-se um atrativo que pode ser amplamente divulgado”, afirma.
A formação crítica e fundamentada em problemas reais é apontada como outro fator positivo do contato com a pesquisa. Da mesma forma, ele também deve ser sublinhado pelos professores para motivar os alunos. “E mesmo que não pretenda participar do programa de iniciação científica, o estudante deve considerar que o ambiente das IES que têm pesquisa é muito mais desafiador”, avalia Alexandra.
Segundo Brigitte, estudantes que participam das atividades de pesquisa possuem, entre outras habilidades: treinamento para atuar no coletivo com espírito de equipe, maior facilidade de falar em público e melhor adaptação a atividades didáticas futuras.
“A IC tem como um dos objetivos preparar profissionais com visão mais ampla, no sentido de não serem apenas meros executores de tarefas, mas sim trabalhadores criativos, que buscam permanentemente por novas soluções para os problemas’, diz a docente.
Além de agregar aos alunos tais qualidades, a experiência possibilita a revisão e atualização dos currículos acadêmicos, além de ser valorizada nos processos seletivos da pós-graduação e, em algumas áreas, atuar como um diferencial para o ingresso em carreiras públicas.
“Há ainda mais um fator relevante: a atividade deve ser considerada como um celeiro para a captação de futuros professores da própria IES, pois os alunos pesquisadores que já possuem um vínculo com a instituição certamente farão a diferença”, completa Brigitte.
Para a professora da Unisanta, as dificuldades de acesso às bolsas de financiamento público e de criação de reserva particular de verbas em meio às reduções orçamentárias do MCTIC e às consequências da crise econômica devem ser vistas como um desafio.
O cenário também interfere na produção acadêmica, pois faz com que os estudantes se limitem aos recursos e à infraestrutura já disponíveis. “Os alunos passaram a fazer propostas que demandam baixo custo, mas sempre em benefício da sociedade”, relata.
Freitas, da FGV, incentiva que as IES privadas utilizem recursos disponibilizados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) por meio do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic). Ao mesmo tempo, destaca que um dos maiores problemas para a manutenção do Programa de Iniciação Científica (PIC) da FGV, por exemplo, “é a grande demanda por bolsas”.
Nesse sentido, lembra que as próprias pesquisas, ao aproximar os alunos do mercado e as empresas das instituições, podem promover um financiamento alternativo e sustentável. “Uma vez que evidenciem problemas relevantes para as empresas, estas poderiam financiar, como contrapartida, programas de iniciação científica”, acredita.
Na PUC-SP, o compromisso assumido com o fomento a pesquisas é garantido com uma reserva de verbas própria, que financia as bolsas de estudos. Há anos, a instituição decidiu priorizar os estudos acadêmicos em diferentes áreas de atuação e níveis de formação: graduação, pós-graduação, educação continuada e extensão universitária. A proposta é um de seus diferenciais, como gosta de divulgar.
Criado há 26 anos, o Pibic da PUC-SP celebra anualmente a atividade de pesquisa por meio de um encontro com os pesquisadores. Na ocasião, são avaliados e premiados os melhores trabalhos, estratégia que também serve para engajar os estudantes e divulgar os projetos.
Esses objetivos também podem ser alcançados com a participação em congressos. Na Unisanta, os jovens pesquisadores são instigados a apresentar os resultados obtidos em seus estudos em eventos científicos de áreas específicas e gerais, como o Congresso Nacional de Iniciação Científica (Conic), promovido anualmente pelo Semesp.
“Para nosso orgulho e estímulo, muitos dos nossos bolsistas já foram contemplados com premiações, inclusive no próprio Conic”, conta a coordenadora do comitê institucional do Programa de Iniciação Científica.
Em 2016, o incentivo dado pela Universidade São Francisco (USF) para que seus alunos-pesquisadores participassem do evento do Semesp rendeu às alunas Noélle Perussi Oliveira, Marta Franciely Lopes Rocha e Elisa da Cruz Felippim o prêmio de melhor trabalho concluído na área de Ciências Biológicas. Na ocasião, elas apresentaram o trabalho Pó de café como alternativa ao uso de microesferas de plástico na produção de cosméticos esfoliantes.
“A nova geração de alunos da USF apresenta um grande potencial quando o assunto é pesquisa, desenvolvimento e inovação. Basta aplicar os estímulos necessários, eis o resultado”, comentou Iara Lucia Tescarollo, coordenadora do Núcleo de Pesquisa Acadêmica da instituição, à época.
Neste ano, o Centro Universitário Eniac participa do 17° Conic com nada menos do que 247 trabalhos. “Isso foi excelente, pois superou as nossas expectativas”, diz Daniel de Oliveira, coordenador do Núcleo de Pesquisa da instituição.
A 17ª edição do congresso será realizada no Centro Universitário Ítalo Brasileiro (UniÍtalo), nos dias 24 e 25 de novembro, com o tema “Política é cidadania”.
Segundo Angelo Bete, coordenador do evento, há um interesse crescente dos estudantes e professores-orientadores em participar do Conic, tratado pelo Semesp como uma “obrigação” e um “prazer” de estimular os alunos a pesquisar e, consequentemente, contribuir com o desenvolvimento do Brasil. “Congressos como esse são fundamentais para um país que busca se desenvolver”, conclui.