Educação

Colunista

Alexandre Gracioso

Especialista e consultor em ensino superior e gestão educacional

Como podemos fortalecer a criatividade de nossos estudantes?

Avanço da revolução digital e da Inteligência Artificial, em particular, faz com que a criatividade seja uma das competências humanas mais necessárias

Coluna Alexandre Gracioso Não se deve pensar que a criatividade seja importante unicamente para profissionais das indústrias criativas (Foto: Freepik)

Trabalhando por tantos anos em uma instituição que traz a criatividade em seu DNA, o fortalecimento dessa capacidade humana tão fundamental sempre me interessou. Por muito tempo, talvez tempo demais, nutrimos a ideia de que ou a pessoa é criativa, ou não é. Que a criatividade é um traço herdado geneticamente, ou que, talvez, seja até mesmo um dom reservado a poucas e poucos.

No entanto, o avanço da revolução digital e da Inteligência Artificial, em particular, faz com que a criatividade seja uma das competências humanas mais necessárias agora e que esteja entre as mais demandadas pensando no futuro do trabalho.

Adicionalmente, não se deve pensar que a criatividade seja importante unicamente para profissionais das indústrias criativas, ou que se dedicam a tarefas de desenvolvimento de novos produtos, por exemplo. Já faz algum tempo que se reconhece o papel da criatividade para o exercício da liderança. Em um estudo com 1541 presidentes de grandes empresas multinacionais conduzido pelo Institute for Business Value, ligado à IBM, a criatividade foi mencionada como a competência mais importante para o bom desempenho de líderes.

 

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Fonte: IBM (2010) (*1)

 

Para os participantes deste estudo, líderes criativos se sentiriam mais à vontade com a ambiguidade e teriam mais disposição para experimentar e correr riscos.

Diante disso, parece que podemos afirmar que o desenvolvimento da capacidade criatividade nos estudantes seja uma prioridade. No entanto, qual seria a forma mais eficaz de atingir esse objetivo?

Um artigo recém-publicado no periódico Psychology of Aesthetics, Creativity, and the Arts procurou responder a essa questão. Os resultados são bem interessantes e nos ajudam, como gestores educacionais, a encontrar formatos viáveis para a inclusão sistemática de atividades que visem reforçar a criatividade de nossos estudantes.

 

Leia: A necessária atenção aos sonhos dos estudantes

 

No artigo Creativity enhancement methods for adults: A meta-analysis (*2), três pesquisadores das instituições Humbolt University, na Alemanha, e University of Essex, na Inglaterra, (aliás, a composição deste grupo é interessante, pois dois pesquisadores – os alemães – são oriundos do campo das Ciências da Computação e somente o inglês é psicólogo) defendem a ideia de que há principalmente três caminhos para se trabalhar a criatividade com adultos:

(I) Participação em treinamentos complexos em criatividade 

(II) Construção de um repertório cultural variado

(III) Uso de técnicas de meditação. Interessante destacar que o uso de drogas que supostamente abririam o caminho para a manifestação da criatividade se mostrou ineficaz.

Inicialmente, ou autores diferenciam entre treinamentos para desenvolvimento da competência criatividade, que normalmente seriam mais complexos na natureza e mais duradouros, e atividades mais curtas, que eles denominaram manipulações, que teriam por objetivo ativar um estado mental mais criativo. Uma distinção importante é que o treinamento teria a meta específica de desenvolver a criatividade e essa meta seria conhecida pelos participantes; trata-se, portanto, de uma atividade de aprendizagem consciente. Por outro lado, a manipulação não teria uma meta de aprendizagem determinada e o participante talvez nem tivesse consciência do objetivo de ter a sua criatividade despertada.

 

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Os pesquisadores fizeram uma extensa meta-análise abrangendo 84 estudos que quantificavam o impacto de várias técnicas sobre a criatividade dos participantes. Dividiram as técnicas em 12 grupos e, entre estes, treinamentos, meditação e exposição a culturas diferentes se sobressaíram como as mais eficazes no aumento da criatividade do grupo. Em geral, após a aplicação da técnica em estudo, as pessoas dos grupos que participavam da atividade se mostravam significativamente (em termos estatísticos) mais criativas do que as dos grupos de controle.

 

Leia: Cibergogia – impulsão para o aprendizado de estudantes millenials e da Geração Z

 

É interessante reforçar que isso acontecia com muitas das técnicas, com destaque para as três mencionadas, mas não com as drogas de alteração de consciência (como álcool, Adderal – droga utilizada no tratamento de TDAH, para facilitar a concentração – e modafinil – substância utilizada para combater a sonolência), que se mostraram ineficazes ou até mesmo pioravam a capacidade criativa dos participantes.

Os autores procuram oferecer diversas sugestões práticas de como preparar uma atividade criativa. Especialmente na conclusão do artigo, eles elaboram um pouco mais a respeito de duas possíveis estratégias que são de nosso particular interesse como educadores e gestores de instituições de ensino.

Lembrando que o treinamento em técnicas de criatividade foi a intervenção que apresentou os melhores resultados no desempenho dos participantes, é claro que a inclusão de programas de criatividade nos cursos é uma opção recomendada no estudo. Para os autores, esta estratégia pode “equipar os indivíduos com uma compreensão ampla do pensamento criativo, da sua aplicabilidade a situações variadas, e de técnicas relevantes de como formular associações e avaliá-las”.

Outra estratégia pode ser a utilização de sessões curtas de meditação ou de ativação do pensamento criativo. Se o objetivo for despertar a criatividade em um encontro determinado (eventualmente uma reunião de um grupo de trabalho, ou em uma aula específica), incluir, no início do da aula ou da reunião, uma sessão de ativação da capacidade criativa irá gerar bons resultados.

 

Revista Educação | Competências híbridas: o que são criatividade e pensamento crítico

 

Os autores falam menos da expansão do repertório cultural, talvez porque eles entendam que essa seja uma decisão que cabe muito mais ao indivíduo. Penso, no entanto, que possamos integrar oportunidades de criação de repertório em nosso ambiente acadêmico, por meio de eventos culturais, fomento a viagens de estudo e intercâmbios. É interessante lembrar que esta é uma estratégia que pode beneficiar inclusive nosso corpo docente e talvez até mesmo melhorar a eficácia dos professores.

A conclusão a que cheguei, embora isso não esteja dito no artigo, é que os treinamentos e as sessões de meditação e ativação de um estado criativo criam as condições para que a pessoa utilize melhor o repertório de que ela dispõe, mas a ampliação do repertório depende da exposição à diversidade cultural.

Aí estão, portanto, de acordo com resultados experimentais bastante interessantes, três estratégias de como podemos auxiliar nossos estudantes e nossa comunidade de forma geral a ser mais criativos. Termino esta coluna relembrando a leitora e o leitor de que a criatividade será, cada vez mais, um fator de diferenciação entre bons profissionais e excelentes profissionais.

 

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Referências

 

(1) Fonte: IBM (2010). Capitalizing on Complexity – Insights from the Chief Executive Officer Study , disponível em https://www.ibm.com/downloads/cas/1VZV5X8J.

(2) Fonte: Haase, J., Hanel, P. H. P., & Gronau, N. (2023). Creativity enhancement methods for adults: A meta-analysis, em Psychology of Aesthetics, Creativity, and the Arts. Advance online publication. https://doi.org/10.1037/aca0000557

Por: Alexandre Gracioso | 17/04/2023


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