Educação

Colunista

Karina Tomelin

Educadora, psicóloga, pedagoga e mestre em educação

Como aproveitar as características individuais e coletivas dos estudantes? 

Uma das formas de conhecer os estudantes é fazer pequenos inventários ou sondagens sobre seu estilo de aprendizagem

Estudantes Promover atividades em que o professor e os estudantes possam se conhecer é fundamental

No divã: Ana Carolina Rusca Correa Porto, médica veterinária, cientista e docente do ensino superior

Tenho me dedicado a compreender como as habilidades de liderança podem contribuir para o processo de ensino-aprendizagem. Apesar de ser um assunto não muito abordado em nosso país, é clara a importância da adoção da postura de líder pelo professor, principalmente para o estabelecimento de relações de confiança com o estudante e como exemplo de valor a ser seguido. O ponto que vem me inquietando é como podemos treinar a nossa habilidade de formar e gerir equipes de trabalho que sejam altamente eficientes. Com a implantação cada vez mais frequente e necessária de metodologias ativas nos diferentes contextos educacionais, a formação de grupos de estudantes que apresentem engajamento entre si, com a atividade e, ao mesmo tempo, resultados satisfatórios ainda é um grande desafio. Como aproveitar as características individuais e coletivas na hora de propor uma atividade e na formação dos grupos de trabalho?

Minha Frase: “Siga em frente e faça da natureza a sua eterna professora.” 

 

Na teoria

 

Olá, Ana. Com certeza é um dilema de muitos professores. A gestão da sala de aula pode ser mais complexa do que muitos imaginam. As competências docentes vão muito além das estratégias metodológicas e isso não é novidade. O mundo em constante mudança tem exigido de todos os profissionais competências também socioemocionais, como empatia, resiliência e flexibilidade para lidar com problemas, como a de planos que não se realizam. 

A sala de aula, por sua vez, é impregnada de imprevistos. O fazer docente é composto de certa imprevisibilidade e exige de nós uma capacidade de tomar decisões frente a novas situações constantemente, fazendo do professor um gestor de recursos, tempo, planos, metas, avaliação e, principalmente, de pessoas. 

Ensinar, por sua vez, é promover encontros. Nos educamos na relação humana e temos necessidade de outras pessoas. Mas como gerir pessoas com diferentes perfis, desejos, vontades e comportamentos, garantindo um clima de aprendizagem favorável e que desenvolva competências complexas nos estudantes como colaboração e trabalho em grupo e, ainda, respeitando suas diferenças?

 

Docência no Divã #2: Como professores podem se manter relevantes no mercado?

 

O professor, no processo criativo e intencional de selecionar recursos e estratégias, toma diversas decisões no gerenciamento do planejamento, na gestão das pessoas envolvidas e na construção do cenário pedagógico. O professor é, assim,  responsável pela construção de um clima de aprendizagem em um ambiente de constantes incertezas.  

Na construção, por exemplo, de uma aula com o desenvolvimento de metodologias ativas, ao organizar estratégias apoiadas na aprendizagem por competências, o(a) docente terá que lidar com um alto grau de complexidade e organização da sala de aula, considerando que, para isso, os estudantes precisarão de mais momentos para trabalhar em equipes. 

Antoni Zabala e Laila Arnau, no livro Métodos para ensinar competências (2020), trazem uma reflexão que gosto muito de citar: a distribuição tradicional em filas, ideal no método tradicional, em que o professor é o transmissor e os alunos receptores do conhecimento, permite que o docente monitore a sala de aula mais facilmente. Quando metodologias ativas são inseridas e há mudança do papel docente, de expositor para facilitador ou orientador da aprendizagem, a forma de gerir a sala de aula é mais complexa, diferentemente das regras do jogo do ensino tradicional.

 

Docência no Divã #3: O que realmente importa incluir no currículo escolar?

 

As regras, na sala de aula tradicional, são muito claras: o professor fala e os alunos escutam. Quando alguém quer falar, levanta a mão. Mas as metodologias e estratégias didáticas ativas exigem um alto grau de envolvimento afetivo e comprometimento pessoal e coletivo para manutenção da convivência entre os estudantes, isso porque várias pessoas falarão ao mesmo tempo, poderão se movimentar de um lado para o outro; e manter o clima de aprendizagem positivo exigirá dos estudantes competências socioemocionais, além de respeito ao professor e colegas. 

A sala de aula, organizada em fileiras, voltadas para frente, pode ser adequada para as explicações do professor sobre determinado assunto ou para o trabalho individual silencioso, mas é sem dúvida pouco interessante para o trabalho colaborativo e comunicativo entre os estudantes.

Ao reorganizarmos a sala de aula provocando trabalho em grupo, também promovemos a aproximação dos estudantes, mudamos o seu ponto de vista, estabelecemos o contato visual, trazemos respiro e vida para a sala de aula, mantendo aceso o interesse e a motivação por aprender.

 

Na sala de aula

 

Então, como fazer para colocar isso em prática de forma eficiente e exitosa? Professores são influenciadores poderosos da aprendizagem. No entanto, para que eles consigam criar esse clima de aprendizagem favorável, é essencial que sejam ouvidos e respeitados pelos seus estudantes. Emy Edmondson, criadora do conceito de segurança psicológica, defende a importância de criar um ambiente psicologicamente seguro nas instituições, favorecendo a exposição sem julgamento e o acolhimento das pessoas. Na universidade, por exemplo, os estudantes deveriam se sentir seguros em expor suas opiniões sem medo de serem julgados ou punidos por isso.

Susie Wise, também na mesma linha de Emy, propõe que os espaços de convivência possam associar o design para garantir que as pessoas se sintam pertencentes a uma determinada sociedade ou espaço. Design for belonging é o termo que ela utiliza para promover ações de acolhimento e pertencimento entre diferentes tipos de comunidade. 

Assim, o primeiro passo é criar um ambiente de acolhimento e pertencimento em que haja um forte envolvimento afetivo entre as pessoas. Antes de propor atividades ativas, é fundamental que o professor crie estratégias para a criação de vínculo entre os alunos. Ações de acolhimento, apresentação, conexão e quebra-gelo são algumas ideias. É fundamental que já no primeiro dia de aula estas ações sejam implementadas, ainda que de forma gradual, para que, aos poucos, vá gerando a confiança entre os estudantes e o professor. Outra dica é favorecer a celebração de pequenas conquistas e o orgulho de pertencer à turma.

 

Docência no Divã #4: Como avaliar as competências da dimensão ontológica?

 

Ainda olhando para sua pergunta, promover atividades em que o professor e os estudantes possam se conhecer e reconhecer suas fragilidades e potencialidades, sendo respeitados pelas suas diferenças e sua forma de pensar e se posicionar é fundamental. Para isso, é imprescindível demonstrar honestidade, respeito e gentileza ouvindo com interesse e interferindo diante qualquer situação que gere insegurança, vergonha, vulnerabilidade, exposição ou medo entre os estudantes.

Uma das formas de conhecer os estudantes é fazer pequenos inventários ou sondagens sobre seu estilo de aprendizagem, suas dificuldades, seu conhecimento prévio sobre um determinado assunto, seus interesses. Existem algumas ferramentas gratuitas que os professores podem utilizar, como testes: o Vark ou mesmo o de Kolb, que podem ajudar a promover reflexões. Apesar das polêmicas em torno do conceito de estilos de aprendizagem, os testes ajudam a promover a reflexão dos estudantes sobre a forma como aprendem.

Depois disso, pensar em estratégias para desenvolver a docência multimodal, ou seja, promover a aprendizagem que combina conteúdos e conceitos em diferentes formas de apresentação, observando diferentes estilos de aprendizagem, como fotos, ilustrações, áudios, vídeos, músicas, textos e muito mais. Isso proporcionará uma experiência mais completa, valorizando os alunos em suas preferências de aprendizagem.

Para ampliar a reflexão sobre o tema, vou sugerir a leitura do livro que citei no começo da nossa conversa. Além de trazer reflexões sobre a sala de aula tradicional e o ensino por competências, apresenta várias formas de ensino e aprendizagem, comparando níveis de intencionalidades, etapas de elaboração e produtos gerados pelos estudantes.  

Essa foi a Ana Carolina no Divã, o próximo pode ser você. Envie seu relato para mim e participe das próximas colunas.

 

Docência no divã #5: Como evitar o burnout docente?

 

Karina Nones Tomelin | Educadora, psicóloga, pedagoga, mestre em Educação. Colunista na Ensino Superior.

Por: Karina Tomelin | 13/09/2023


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