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Formação

Universidade precisa se preparar para a juventude

Segundo psicanalista, a educação superior está distante das questões sociais

Publicado em 30/07/2024

por Gustavo Lima

Juventude Para o psicanalista Geraldo Almeida: “a sociedade brasileira não acredita na juventude"

Abordadas com frequência no ensino básico, as competências socioemocionais são fundamentais para a formação cidadã e devem estar presentes também na educação superior. Diretamente ligada com a saúde mental, a inteligência socioemocional requer um olhar atento aos jovens – que devem ser vistos e ouvidos. É o que explica Geraldo Peçanha de Almeida, psicanalista, pedagogo e escritor com mais de 70 livros publicados.

Almeida lembra que, há pouco tempo, “não existia a figura do psicólogo dentro do espaço pedagógico.” Para o especialista, as competências socioemocionais, no Brasil, ficaram “na esteira e na caminhada do professor”, enquanto em outros países os programas são desenvolvidos exclusivamente por profissionais de saúde mental, ou por meio de parcerias entre os setores da saúde e da educação.

Geraldo Almeida

Geraldo Peçanha de Almeida tem mais de 70 livros publicados (foto: arquivo pessoal)

Segundo o psicanalista, a força do tema na educação básica se dá pela compreensão de que, “quanto mais cedo uma criança tem esse desenvolvimento socioemocional, se envolve em ambientes de coletividade, tem um trabalho estruturado na construção de autonomia e de proatividade, mais consistentes serão os resultados.” Na adolescência ou na fase adulta, o desafio é maior. Há, no entanto, a necessidade de olhar para esse público.

 

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Na avaliação do educador, existe uma dificuldade em reconhecer o potencial e o talento dos jovens. “A sociedade brasileira, de maneira geral, não acredita na juventude. Quando o jovem chega em um espaço para trabalhar, lhe é exigida uma experiência que ele não tem. Quando se propõe a desempenhar algo, ouve que ‘é muito jovem’, e não recebe uma oportunidade. Há uma rotulação de que o público jovem é desinteressado, mas faço questão de lembrar que essa é uma ideia preconceituosa”, defende.

Almeida cita Malala Yousafzai e Greta Thunberg como representantes do potencial da juventude. Seja no Paquistão ou na Suécia, as ativistas têm feito suas vozes ecoarem ao redor do mundo. “No Brasil, esses jovens estão muito presos à política ou dentro do mercado empresarial, onde aparecem e se empoderam. Mas é muito pouco o número de jovens que conseguem romper essa bolha do descrédito para mostrar algo”, diz.

 

Boas-vindas?

De acordo com o psicanalista, a juventude não é recebida da forma adequada ao ingressar no ensino superior, pois a universidade não tem esse olhar de que há ali um talento a ser lapidado. “O professor e a IES, de maneira geral, olham para o jovem com o mesmo olhar de desconfiança da sociedade. Esse desacreditar faz com que a universidade não ofereça o investimento socioemocional que o estudante deveria ter.”

“A competência socioemocional, na juventude, deveria ser uma conversa de futuro. Não se trata de um treinamento cartesiano, depende de conscientização, fortalecimento e manutenção. Deveria ser um gesto, uma postura da universidade”, acrescenta. 

Almeida cita o baixo desempenho dos jovens brasileiros no exame da criatividade do Pisa (saiba mais) e destaca que o atual modelo acadêmico reafirma a falta de autonomia dos estudantes. “A criatividade e a proatividade dependem da possibilidade de ser autodidata, o que a universidade não permite. Toda vez que o aluno é autodidata, lhe é cobrada uma fonte. Mas quem cria não tem fonte, tem novas ideias”, pondera.

 

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O educador usa os cursos de arquitetura para exemplificar a necessidade de trazer as competências emocionais para a sala de aula. “A arquitetura hostil – estratégia utilizada para a exclusão de grupos como, por exemplo, pessoas em situação de rua – é abominável e reprovada no mundo inteiro, mas para que um estudante compreenda o porquê de não utilizar arquitetura hostil, ele deve entender de minorias, da fome no mundo, de solidariedade e de criatividade, porque assim poderá pensar em um projeto que abraça, acolhe e que não exclui. Mas a universidade só pensa na parte técnica e os estudantes se formam reproduzindo a arquitetura hostil”, critica.

“Temos um ensino superior longe das questões sociais, muito longe. São poucas experiências, como a economia criativa e a saúde humanizada, que estão em um outro patamar. E isso só vai existir se a escola, o professor e a IES se abrirem às competências socioemocionais.”

O caminho, explica o psicanalista, é a escuta. “Ouvir o jovem, o seu ponto de vista e dar protagonismo à sua existência. Quem deve saber sobre as questões sociais mais preponderantes é o jovem que está no transporte público. Esse jovem que chega à faculdade de metrô para estudar mobilidade urbana e trânsito consciente. Ele é quem vai apontar as necessidades e soluções para esse contexto, mas as IES escutam o currículo definido pelo MEC em uma outra época, quando os desafios eram outros.”

 

Autor

Gustavo Lima


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