NOTÍCIA
Bets somam-se à Lei da Mensalidade Escolar e ao cenário macroeconômico como fatores determinantes no aumento dos índices de inadimplência
Publicado em 12/11/2024
Após apresentar queda em 2022, a inadimplência do ensino superior privado voltou a subir em 2023. Segundo dados da 16ª edição da “Pesquisa de Inadimplência” elaborada pelo Instituto Semesp, em 2024 as taxas seguem em uma linha crescente. O fenômeno das “bets” soma-se à Lei da Mensalidade Escolar (L9870), ao cenário macroeconômico e ao crescimento de matrículas presenciais como fatores determinantes no aumento dos índices.
A nova edição da pesquisa, realizada entre julho e agosto deste ano, mostra que a inadimplência total no ensino superior privado ficou em 9,33% no primeiro semestre deste ano, o que representa um aumento de 3,4% em relação a 2023. Enquanto as mensalidades em atraso na modalidade presencial chegaram a 3%, os números no ensino a distância (EAD) são ainda mais expressivos, marcando 11,8% de inadimplência.
Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Semesp, apresentou o levantamento em um encontro remoto na manhã desta terça-feira, 12 de novembro. O especialista comentou os pontos críticos para a crescente das taxas, como a prioridade dos estudantes no pagamento de contas. “O aluno não deixará de pagar seu plano de saúde, sua conta de luz ou de internet, porque esses serviços são interrompidos logo em seguida. No caso das instituições de ensino, o serviço não é interrompido quando o pagamento da mensalidade deixa de ser efetuado. Sem dúvida alguma o setor tem esse problema da Lei das mensalidades ou ‘Lei do calote’”, pontua.
“Além disso, o cenário macroeconômico ainda é desafiador. Apesar de estarmos vivendo uma das menores taxas de desemprego no Brasil, a renda desses empregos ainda é baixa. A empregabilidade no ensino superior é muito alta, mas isso acontece com o preenchimento de vagas que concorrem pessoas que têm o ensino médio completo. São vagas de salário baixo que não resolvem o problema de renda, dificultando a inserção da mensalidade na série de contas que o aluno tem a pagar”, pondera.
A retomada ao ensino superior na modalidade presencial, após a pandemia, também é consequência direta para o aumento no número de inadimplentes. “Tivemos uma queda muito forte e uma recuperação – bastante suave, mas ainda uma recuperação – entre 2022 e 2023. Isso se reflete em um maior número de alunos e, portanto, maior número de alunos com dificuldades financeiras. Ao mesmo tempo em que há crescimento de matrículas, cresce também a inadimplência, dado o perfil de alunos mais carentes”, analisa o diretor-executivo do Semesp.
Ainda nesta terça-feira, o Senado instalou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para a investigação dos sites de apostas, as bets, no país. Na avaliação de Rodrigo Capelato, o fenômeno das bets também está ligado aos números apresentados no estudo. “Anos atrás, quando falávamos de inadimplência e já tínhamos a lei das mensalidades escolares, um dos grandes problemas do setor foi começar a concorrer com novas contas, como celular e internet. Ao longo do tempo, novas contas como os serviços de streaming foram somadas à lista de consumo da população e as IES passaram a concorrer cada vez mais com esses novos perfis de consumo”, lista.
“Apesar de um fenômeno recente, há um debate denso sobre as bets, com números que demonstram grande preocupação de endividamento em decorrência dessas apostas online, das bets e de jogos como o ‘tigrinho’. E não há dúvida de que isso irá afetar o orçamento dos estudantes, tanto dos mais velhos quanto dos mais novos. E também das famílias dos mais novos”, afirma o especialista.
Rodrigo Capelato lembra que, no contexto brasileiro, em que a maioria da população tem baixa educação, “o terreno é, infelizmente, muito fértil para o crescimento das bets.” Para Capelato, o ensino superior tem dois papeis diante dos problemas acarretados por essa onda. “Sem dúvidas há um papel na formação dos alunos, sejam aqueles que estão dentro da sala de aula ou os que estão na frente das telas. As IES devem fazer um trabalho de conscientização com os estudantes que formam. É preciso começar a pensar em como trabalhar os alunos para que eles não sejam pegos por essa onda das bets. Trata-se de um papel difícil, mas importante”, diz.
“Não podemos nos esquecer que, dentro do corpo docente, temos formadores de opinião. É importante que eles trabalhem não apenas na imprensa e nas mídias sociais, alertando sobre o problema, como também na formulação de políticas públicas. A instituição tem muita força para utilizar o corpo docente como formador de opinião”, acrescenta Capelato.
Para saber mais sobre o levantamento, acesse a pesquisa na íntegra.