NOTÍCIA
IES e empresas avançam na adoção de ações ESG, mas enfrentam desafios para integrar sustentabilidade ao ensino e aos negócios
Publicado em 11/12/2024
O marco inicial do conceito ESG foi publicado em 2004 no relatório “Who Cares Wins – Connecting Financial Markets to a Changing World” (Quem se Importa, Vence – Conectando os Mercados Financeiros a um Mundo em Transformação), que discute como os mercados financeiros podem ser alinhados com questões socioambientais e de governança, defendendo a ideia de que, ao focar em sustentabilidade e responsabilidade social, é possível gerar melhores resultados tanto para os investidores quanto para o mundo como um todo.
As práticas nas IES tem se impulsionado, em parte, pela conscientização crescente dos estudantes, que cada vez mais exigem das instituições um compromisso real com tais questões. Além disso, as parcerias com empresas e organizações internacionais que promovem ações responsáveis incentivam as universidades a adotarem iniciativas ESG para se manterem competitivas, atrativas e alinhadas com os padrões globais de sustentabilidade.
As instituições começaram a perceber que não se trata apenas de uma questão de imagem ou de conformidade, mas de uma necessidade perante um mundo cada vez mais consciente. Segundo Francisco (Kiko) Elíseo Fernandes Sanches, diretor administrativo e financeiro da Fundação Hermínio Ometto (FHO), participante da Rede de Sustentabilidade do Ensino Superior (Semesp), há um ponto essencial para que essa mentalidade se reflita em ações concretas, que é vencer a resistência – de docentes, do currículo – e incorporar as práticas sustentáveis no ensino de maneira horizontal.
“Vamos supor que eu cuide dos resíduos gerados pela universidade, mas o curso de administração só privilegia lucro do acionista [e não aborda questões ESG]. Não adianta nada, é necessário ter uma integração holística da sustentabilidade nas IES, que contemple operações no campus, ensino e pesquisa, comunidades interna e externa e a estrutura organizacional. Ou seja, são todas as dimensões numa abordagem da instituição como um todo e não em um pedaço só”, diz Kiko.
Essa visão de integrar as áreas vai ao encontro do que Adriana Vieira, coordenadora do curso de MBA em ESG e Impact, da Trevisan Escola de Negócios, sugere como importante para que as empresas tenham ações eficazes. No caso das IES, seriam a melhoria das condições de trabalho, aumento de projetos de pesquisa voltados para a inovação sustentável, existência de diversidade nas comunidades acadêmicas, criação de políticas de relacionamento com a sociedade, empresas e governos, desenvolvimento de currículos voltados a ESG e muito mais.
A Rede Sustentabilidade do Semesp é uma iniciativa que visa promover práticas sustentáveis e ações de governança responsáveis dentro das IES. Esse é um movimento crescente que visa preparar universidades para o futuro, não apenas no campo acadêmico, mas também no seu compromisso com o planeta e com a sociedade. Kiko, membro da Rede, explica que o grupo faz discussões recorrentes sobre como aprimorar práticas sustentáveis nas instituições.
Para isso, foram formados três grupos de trabalho principais, focados em avaliar o atual panorama de práticas sustentáveis nas IES brasileiras; olhar para a sustentabilidade do ensino, que envolve a educação dos educadores; promover a importância do aspecto social.
A avaliação diagnóstica está disponível no site do Semesp, por meio do link Avaliação diagnóstica da incorporação da sustentabilidade pelas IES Survey. O objetivo é:
Já a questão da sustentabilidade do ensino está acontecendo a partir do Programa online de sustentabilidade para docentes, curso da Universidade Corporativa Semesp em parceria com a FHO, localizada no município de Araras, em São Paulo. A Fundação é referência no tema e, segundo Kiko, começou essa “caminhada” a partir do posicionamento: “Posicionar é divulgar um compromisso, e nós começamos mexendo na nossa missão. Antes, falávamos apenas de uma sociedade justa, agora, nós tratamos de uma sociedade social, ambiental e economicamente sustentável. [Essa mentalidade] está em todo lugar, seja na entrada do campus, no site ou no cartão de visitas”, lembra o diretor financeiro.
No âmbito do social, Kiko conta que a ideia é realizar um hackathon com alunos de escolas públicas para discutir ideias, soluções e enriquecer a pauta.
A Trevisan Escola de Negócios conduziu em 2024 uma pesquisa com alunos do curso de MBA em ESG e Impact que revelou a percepção de executivos e gestores sobre a implementação de práticas ESG (Environmental, social and Governance) no dia a dia das empresas. Entre os resultados, uma parcela significativa dos entrevistados (62%) informou que os lugares onde trabalham ainda não oferecem treinamentos específicos sobre os impactos ambientais, sociais e de governança.
Outro ponto trazido pela pesquisa é que, apesar de 61,7% dos respondentes se declararem satisfeitos com a postura ética das organizações em que atuam, apenas 38,2% consideram o nível de transparência adequado, com uma parcela semelhante de insatisfeitos (35,2%).
Adriana Vieira, coordenadora do curso, acredita que, embora seja um assunto em alta, muitas empresas ainda não têm o conhecimento de como aplicar as boas práticas de ESG no seu dia a dia, o que demonstra desinformação sobre formas de torná-las parte da estratégia de negócio. “Quando a gente pensa em multinacionais, por exemplo, principalmente nas matrizes fora do Brasil, é preciso perceber mais naturalidade ao lidar com esses assuntos em relação às empresas do país”, diz.
A falta de conhecimento sobre metodologias (18,6%) e a falta de engajamento interno, de pessoal capacitado e de conscientização (15,3%) são as principais barreiras para a implementação dessas práticas nas organizações, segundo os participantes. Mas, de acordo com Adriana, muitas vezes, as ações já acontecem, só não são colocadas sob esse “chapéu” do ESG.
Isso quer dizer que os projetos “acontecem de formas esparsas, cada uma delas em áreas diferentes, sem ter de fato uma área de ESG ou de sustentabilidade que consiga reunir todos esses assuntos em uma única pauta”, explica. Isso tem consequência na capacitação e no engajamento dos colaboradores, pois, “é difícil engajar ou capacitar sobre uma coisa que você nem entende muito bem”, completa a coordenadora.
No entanto, Adriana reforça que aumenta o interesse das empresas, dos diretores, dos CEOs etc., em tentar entender o que são essas boas práticas, o que mostra um cenário favorável. “Esse movimento às vezes é pequeno, é um diretor que se interessa pelo assunto e leva para empresa. Mas isso vai criando uma área e, consequentemente, contratando pessoas do mercado ou até mesmo capacitando internamente”, defende ela.
“Eu acredito que o aumento dos profissionais capacitados em ESG pode melhorar o mercado de trabalho e as práticas”, afirma Adriana Vieira. Ela explica que esse profissional pode ser facilitador de comportamentos sustentáveis dentro da empresa, mesmo que essa não seja a principal formação dele. “Toda vez que a gente aumenta o número de pessoas que falam sobre ESG, acredito que eles se tornam facilitadores, principalmente se estiverem em um lugar que ainda não teve contato com o tema”, reforça.
No entanto, para que isso aconteça, é necessário que não apenas a capacitação oferecida seja em ESG, mas que toda a instituição esteja voltada para essa mentalidade. “Na Trevisan, nós nos preocupamos em ter práticas de sustentabilidade dentro da nossa estrutura, a começar pelo fato de sermos signatários do Pacto Global da ONU. Realizamos pesquisas, facilitando pautas sobre o tema, de forma que os alunos consigam ter uma visão do que é ESG”, argumenta Adriana. Assim, mesmo que a pessoa não vá trabalhar diretamente com isso, uma hora ou outra o ESG vai tocar a área dele dentro da empresa”, conclui.