Revista Ensino Superior | Jabuti Acadêmico 2025 reforça a relevância da produção científica

NOTÍCIA

Formação

Jabuti 2025 reforça a relevância da produção científica

De interpretações sobre a realidade social, à busca de sentido para o envelhecer, premiação evidencia a pluralidade da ciência nacional

Publicado em 22/08/2025

por Carolina Firmino

José de Souza Martins, personalidade acadêmica Sociólogo e professor emérito da USP, José de Souza Martins foi eleito Personalidade Acadêmica de 2025 pelo Prêmio Jabuti Acadêmico (Foto: divulgação)

O Prêmio Jabuti Acadêmico, criado em 2024 pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), chega à sua segunda edição consolidado como uma das principais iniciativas de valorização da produção científica no país. A premiação busca ampliar a visibilidade de pesquisas acadêmicas que ultrapassam os muros da universidade e dialogam com a sociedade, reconhecendo trabalhos inovadores e trajetórias que marcam a vida intelectual brasileira.

Em 2025, a personalidade acadêmica escolhida foi o sociólogo José de Souza Martins, professor emérito da USP, autor de extensa obra dedicada a interpretar a realidade social do Brasil. Já na categoria educação física, fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional, o prêmio de primeiro lugar ficou com a obra Propósito de vida da pessoa idosa: conceitos, abordagens e propostas de intervenções gerontológicas, organizada pela fisioterapeuta e professora Cristina Cristóvão Ribeiro (CESUFOZ).

Ambos compartilharam suas impressões sobre a premiação, o significado desse reconhecimento e os caminhos da pesquisa acadêmica no Brasil.

 

A vida como espanto e desafio

A notícia da homenagem surpreendeu o professor José de Souza Martins. “Foi uma surpresa e, de certo modo, um susto. Não tenho expectativa de reconhecimentos públicos”, afirmou. Aos quase 87 anos, ele continua produzindo intensamente: durante a pandemia, publicou um livro por ano, e atualmente conclui três novas obras, além de escrever semanalmente para o jornal Valor Econômico.

Sua trajetória, lembra, não começou em salas de aula universitárias. Autodidata desde a infância, conciliava o trabalho em uma fábrica durante o dia com os estudos noturnos. Aos 16 anos, começou sua primeira pesquisa histórica e, pouco depois, datilografou no horário de almoço o que viria a ser seu primeiro livro. “Foi um desafio. Me vi diante do dilema de que não havia como recuar. Só continuar”, relembra.

 

Leia: Jabuti ajuda a reconhecer academia

 

Para Martins, a pesquisa sociológica não é um diálogo, mas um enfrentamento das contradições sociais. “Nós a tomamos como desafios de compreensão da realidade social. A sociedade em que o pesquisador faz pesquisa é o seu laboratório”, explica. Ele destaca que cabe à universidade e ao cientista social expor e esclarecer os problemas, enquanto às instituições sociais compete transformá-los em políticas e ações.

Questionado sobre os obstáculos da produção acadêmica no país, o sociólogo é contundente: a ignorância resultante de um sistema educacional fragilizado e, sobretudo, o desprezo dos políticos pelo conhecimento científico. Apesar de reconhecer que universidades brasileiras estão entre as melhores da América, lamenta a falta de valorização do poder público: “Nossas universidades produzem conhecimento de alta qualidade, gratuitamente disponível para políticas sociais. No entanto, os políticos as ignoram, as depreciam”.

Ainda assim, ele reconhece que o prêmio trouxe visibilidade rara à sua obra. “Minha eleição teve extensa repercussão e resultou na divulgação de aspectos de minha obra científica que não chegam ao grande público”. Com ironia, conta que alguns chegaram a referir-se a ele como “o saudoso José de Souza Martins”, esquecendo que ele segue vivo e ativo.

Aos jovens pesquisadores, José deixa um conselho: nunca perder a capacidade de se espantar e se indignar. “Nenhuma injustiça é pequena. Não aceitem o conformismo que nos tolhe e cala. É esse filósofo interior que desde cedo nos conclama à insurgência de fazer perguntas que precisam de resposta”.

 

Envelhecer como projeto de vida

Se a homenagem a Martins lança luz sobre uma trajetória de décadas, o reconhecimento dado a Cristina Cristóvão Ribeiro reforça a importância de novos temas no debate acadêmico. Organizado por ela, o livro Propósito de vida da pessoa idosa recebeu o primeiro lugar em sua categoria e marca um avanço no campo da gerontologia.

 

Leia: Prêmio Jabuti valoriza pesquisa acadêmica

 

Cristina Cristóvão Ribeiro, fisioterapeuta e professora do CESUFOZ, organizou a obra vencedora na categoria Educação Física, Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional (Foto: divulgação)

Para Cristina, o prêmio simboliza antes de tudo um trabalho coletivo. Ela estuda o tema desde 2018, quando concluiu seu doutorado, e reuniu um grupo de autores de diferentes áreas para construir a obra. “Foi o resultado de um trabalho em equipe que deu certo”, resume. Mais do que um reconhecimento pessoal, o Jabuti Acadêmico valoriza o protagonismo da pessoa idosa. “Receber esse prêmio significa que os avaliadores viram a importância de um envelhecimento com sentido”, afirma.

Segundo a pesquisadora, o Jabuti Acadêmico cumpre um papel essencial ao dar visibilidade a temas que muitas vezes ficam restritos ao meio acadêmico. “O intuito da produção científica é retribuir à sociedade. Muitas vezes publicamos artigos que não saem do meio acadêmico. Já o livro me permite entregar esse conhecimento a colegas, pacientes, cidadãos comuns”.

O tema do propósito de vida, explica, é particularmente urgente em um país que envelhece rapidamente. Até 2060, estima-se que um em cada quatro brasileiros será idoso. Nesse cenário, o desafio não é apenas viver mais, mas dar sentido a essa longevidade. “Hoje não é raro chegar aos 80 ou 90 anos. A questão é: o que fazer com esse tempo?”, questiona. Para ela, o propósito funciona como um antídoto contra a depressão e como incentivo ao cuidado com a saúde. “A pessoa que tem propósito cuida mais de si mesma, se preserva”.

A obra também evidencia a riqueza da abordagem multidisciplinar. Fisioterapeutas, educadores físicos, nutricionistas, terapeutas ocupacionais, psicólogos, assistentes sociais e até jornalistas participaram da construção dos capítulos. “A gerontologia é, por si só, multidisciplinar. O idoso merece ser tratado como tal, com o olhar de diversas áreas”, defende.

 

Leia: Bibliotecas: extensão da sala de aula

 

Cristina acredita que a discussão também deve orientar políticas públicas. Para ela, é preciso preparar a sociedade para o envelhecimento desde cedo, combatendo o etarismo e valorizando a autonomia e a dignidade da pessoa idosa. “A velhice não é um acaso, é um projeto. Podemos olhar o envelhecer como um propósito, fazer escolhas mais lúcidas e nos preparar física, financeira e emocionalmente para essa fase da vida”.

 

O papel do Jabuti na ciência brasileira

Mais do que celebrar trajetórias individuais, o Jabuti Acadêmico tem funcionado como vitrine do que a pesquisa brasileira é capaz de produzir. O prêmio ajuda a romper uma barreira histórica: a distância entre o conhecimento gerado nas universidades e o alcance que ele encontra na sociedade. Para muitos pesquisadores, como lembram José Martins e Cristina Ribeiro, o reconhecimento público é também uma oportunidade de ampliar o diálogo e de reforçar a legitimidade da ciência em tempos de tantos questionamentos.

Outro aspecto ressaltado pelos premiados é a inspiração que o Jabuti Acadêmico pode oferecer às novas gerações. Para Martins, o conselho de nunca perder a capacidade de se espantar é também um convite para que os jovens assumam seu papel como protagonistas do pensamento crítico. Para Cristina, refletir sobre o envelhecimento como projeto de vida é uma forma de mostrar que a pesquisa acadêmica pode gerar impacto prático, orientar políticas públicas e transformar a vida cotidiana.

Mais uma vez, a premiação reforça a ideia de que ciência é investimento, mas também é projeto coletivo. Ao dar visibilidade a temas que vão da interpretação da sociedade brasileira ao propósito de vida na velhice, o Jabuti Acadêmico sinaliza que o conhecimento não deve se restringir ao espaço acadêmico: ele precisa circular.

 

 

Autor

Carolina Firmino


Leia Formação

Carreiras de sucesso

Como auxiliar estudantes na construção de carreiras significativas

+ Mais Informações
Pós-graduação lato sensu

Lato sensu é resposta às demandas do mercado

+ Mais Informações
Duas graduações

Duas graduações são vantagem competitiva

+ Mais Informações
Mediador pedagógico EAD

Mediador pedagógico: Cerne do novo marco regulatório

+ Mais Informações

Mapa do Site