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Com a IA, desafio é evitar sedentarismo intelectual

 “Nós deveríamos fazer outras coisas, como criar bons cidadãos, mas o trabalho principal das universidades é apoiar as necessidades da força de trabalho do país e da sociedade”, diz o professor norte-americano Paul Leblanc, palestrante confirmado no Fnesp

Publicado em 12/09/2025

por Luciana Alvarez

Com a IA, desafio é evitar sedentarismo intelectual foto: Shutterstock

É preciso aprender a usar inteligência artificial de forma adequada também quando se fala em meio ambiente. “Chamar o ChatGPT para responder a uma pergunta básica é como usar um caminhão para entregar o almoço. Um exagero, um desperdício”, afirma Paul Leblanc, ex-presidente da universidade americana Southern New Hampshire (SNHU) e uma das vozes mais influentes na adoção de tecnologias na educação superior. A metáfora próxima da vida contemporânea ajuda a pensar sobre as implicações ambientais do uso da inteligência artificial do tipo LLMs, os modelos de linguagem em grande escala como o ChatGPT.

“Os data centers que sustentam a IA consomem energia em escala absurda. Alguns são do tamanho de cidades e consomem energia como tal. Há estudos que estimam que 12% de toda eletricidade consumida nos EUA hoje sirva para alimentar esses centros”, disse o professor, que é um dos palestrantes confirmados no próximo Fnesp.

O uso massivo de energia, porém, não implica que a IA deve ser evitada. Afinal, como os caminhões, ela tem um potencial poderoso que pode ser útil à humanidade quando aproveitado adequadamente. Ele cita o trabalho da DeepMind, subsidiária do Google, para decifrar o enovelamento de proteínas, um dos maiores desafios da biologia moderna. “Cientistas levaram décadas para decifrar uma única estrutura. A IA fez o mesmo em dias. Isso tem o potencial de levar a descoberta de novos tratamentos médicos, mais longevidade, cura de doenças como Parkinson e câncer”, diz.

 

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Para Leblanc, esse é o tipo de salto que só a IA pode proporcionar. “Ela não apenas ajuda os humanos a fazerem seu trabalho, ela faz o que humanos sequer conseguem”, garante. Mas, embora reconheça o imenso potencial da inteligência artificial para acelerar o progresso humano, Leblanc defende que é preciso usá-la com sabedoria e criar alternativas mais eficientes do ponto de vista energético. Por isso, considera que a humanidade vive “um momento histórico de inflexão”.

Paul Leblanc

Paul Leblanc: “Instituições precisam oferecer melhores diretrizes aos professores e alunos” (foto: arquivo pessoal)

E já vê soluções energéticas no horizonte próximo. “A NVIDIA lançou recentemente processadores até 12 vezes mais eficientes energeticamente do que suas versões anteriores. Estamos melhorando”, acredita. Outra solução possível para reduzir o consumo de energia é a substituição dos grandes modelos de linguagem por modelos pequenos, os Small Language Models (SLM). “Imagine LLMs que são, na verdade, muito menores, mais específicos – e, como resultado, você usa menos energia. A Apple tem um projeto de inteligência assim que, embora não tenha apresentado ainda os melhores resultados, se baseia na ideia de que você pode ter uma IA no seu relógio, desconectada da internet”, explica.

Além dessas duas mudanças já em curso, Leblanc ainda enxerga potencial para que a IA acelere pesquisas que ajudem a reverter o aquecimento global. “Sejamos honestos: atualmente estamos perdendo essa luta. Acho que a IA possa ser a nossa única esperança na batalha contra as mudanças climáticas. Talvez só um avanço tecnológico sem precedentes, como a fusão (nuclear) a frio, possa nos salvar. Quem sabe seja a IA que vá descobrir como fazer isso”, pondera.

 

Papel das universidades

Diante desse cenário acelerado e imprevisível, as universidades têm que se posicionar do ponto de vista prático, sem deixar de promover reflexões sobre os caminhos da sociedade. “A missão mais urgente é preparar seus alunos para um mundo do trabalho completamente diferente, em grande parte por causa da IA. É pensar sobre como será o futuro do trabalho, dos empregos – e como nós preparamos nossos graduados para esse mundo. Nós deveríamos fazer outras coisas, como criar bons cidadãos, mas o trabalho principal das universidades é apoiar as necessidades da força de trabalho do país e da sociedade”, afirma.

Leblanc também alerta para um segundo desafio urgente: a definição clara do que é aceitável ou não no uso acadêmico da IA. “As instituições precisam oferecer melhores diretrizes aos professores e alunos. É uma noção boba imaginar que se deva banir a IA, mas é necessário refletir: como usamos isso de forma ética? Como adaptamos nossa pedagogia?”, questiona. Isso implica parar de pensar em “produtos” a serem entregues, como artigos, planilhas e apresentações, e olhar mais para os processos que levaram à construção desses produtos.

 

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Se não há dúvidas que a IA pode ajudar a elaborar uma série de produtos intelectuais, ainda existe uma grande preocupação que os seres humanos acabem se desenvolvendo menos intelectualmente ao delegar tarefas cognitivas para “as máquinas”, algo que os pesquisadores têm chamado em inglês de cognitive offloading. Encontrar desafios para evitar um sedentarismo intelectual passaria, então, a ser mais um desafio da educação.

Mais do que oferecer respostas, Leblanc promete que sua palestra pretende suscitar questionamentos e reflexões. “O mais honesto que alguém pode dizer sobre a IA hoje é: não sabemos como isso vai se desenrolar. Mas é possível – e necessário – começar a fazer as perguntas certas”, afirmou. Cabe à sociedade como um todo e às universidades em especial, seguir usando a inovação de forma consciente.“Talvez a IA não nos salve de tudo. Mas, com ética, pensamento crítico e coragem, ela pode nos ajudar a encontrar o caminho.”

Autor

Luciana Alvarez


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