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Para serem eficazes e contribuírem com a retenção dos alunos, conteúdos utilizados na EAD precisam se adequar às características do ambiente virtual

Publicado em 25/04/2016

por Marina Kuzuyabu

A educação a distância poderia estar em outro patamar se o fluxo de autorização de cursos não fosse tão lento. Essa é uma constatação praticamente consensual no setor do ensino superior. Contudo, a trava que segura a expansão da EAD não tem impedido o aprimoramento da modalidade. Se antes os alunos estudavam basicamente com textos no formato PDF, exercícios de múltipla escolha e, eventualmente, alguns longos e cansativos vídeos, hoje eles acessam conteúdos nos mais diferentes formatos. De maneira geral, a experiência nos ambientes virtuais se tornou mais rica e tem propiciado aos estudantes condições mais favoráveis à aprendizagem.

Levando em conta que a interação com colegas e professores se dá em menor escala, o conteúdo na EAD é a base de apoio do aluno. Por isso, ele deve ter qualidade e, principalmente, ser concebido especificamente para as plataformas on-line de aprendizagem. Uma simples transposição do que é usado no presencial para o virtual não funciona. “O conteúdo precisa dialogar com o usuário. Não tem o olho no olho como nos cursos presenciais, então o material tem de suprir essa ausência de alguma forma. Na EAD, a linguagem é diferente”, afirma Regina Helena Ribeiro, coordenadora de tecnologias aplicadas à educação do Senac São Paulo.

O conhecimento dessas especificidades foi adquirido na prática por muitas IES, que ao longo dos anos perceberam o que funciona e o que precisa ser descartado para manter a motivação e o bom aproveitamento do curso pelos alunos (veja mais no box da pág. 30). As pesquisas nesse campo também contribuíram de forma decisiva, bem como os avanços tecnológicos e o desenvolvimento de programas de formação específicos, a exemplo do curso Produção de Conteúdo para EAD, do Senac. Nele, o público aprende a trabalhar o mesmo material nos mais diferentes formatos. Um mesmo texto pode se desdobrar em jogos, experimentos de simulação, videoaulas ou podcasts, para citar algumas possibilidades de exploração dos materiais.

Esses avanços levaram e estão levando muitas IES a redesenhar seus programas. Muitas estão investindo na estruturação de equipes próprias e especializadas na produção de materiais didáticos para a EAD. É o caso dos grandes grupos educacionais, como a Estácio e a Kroton. A primeira delas criou uma diretoria chamada Fábrica do Conhecimento, onde trabalham professores e profissionais das mais diversas áreas, como ilustradores, designers gráficos e desenvolvedores de tecnologia. Em conjunto, é produzida uma série de objetos de aprendizagem complementares às videoaulas. Estas também

são oferecidas no formato MP3. A variedade de formatos se deve à concepção de que cada pessoa aprende melhor de um jeito. “Existe um DNA educacional. Não há duas pessoas que aprendam da mesma forma, por isso

oferecemos um leque variado de formatos para o aluno sempre ter opção”, informa Ronaldo Mota, reitor da instituição. Assim, depois de assistir às videoaulas, o estudante pode reforçar o que aprendeu lendo um texto ou conferindo uma apresentação que retoma, de forma gráfica, o que foi apresentado na aula. Atualmente, a Estácio oferece 20 cursos a distância. Juntos, eles somam 120 mil estudantes.

Estrutura semelhante tem a Kroton, que na modalidade EAD possui 33 cursos de graduação, cerca de cem cursos de pós-graduação e extensão e mais de 500 mil alunos matriculados. A diretoria responsável pela produção dos conteúdos também trabalha em torno do material produzido pelos professores, que depois é editado e embalado por especialistas.

A IES também criou um programa de capacitação para orientar os professores quanto ao uso das metodologias mais adequadas ao ensino virtual. O projeto inclui preparar os docentes para as videoaulas. De acordo com Mario Jungbeck, diretor de operações acadêmicas EAD da companhia, a comunicação dos professores precisa ser direta e assertiva para ajudar os alunos a formular, também de maneira mais direta, suas questões. “Os estudantes não têm como levantar a mão e tirar suas dúvidas. As perguntas têm de ser formuladas por escrito com muita clareza. Uma explicação direta ajuda nesse processo”, destaca.
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Vídeo ou texto

O cuidado da Kroton com as videoaulas se deve à preferência por esse formato por parte dos estudantes, como afirmam muitos gestores. De acordo com Carlos Fernando Araújo, pró-reitor de EAD da Universidade Cruzeiro do Sul, isso se deve à capacidade de síntese do formato, que consegue comprimir uma carga grande de conteúdos em uma apresentação de poucos minutos, e ao fato de os brasileiros serem pouco afeitos à leitura em comparação com a população de outros países, como é o caso dos Estados Unidos, onde os cursos a distância são fortemente baseados em textos.

Isso não quer dizer, contudo, que os vídeos devem suprimir o uso de materiais escritos. O equilíbrio de recursos é a melhor opção. “O texto deve compor o material didático, mas não pode ser a única forma de acesso ao conhecimento. Se a questão se resumisse à leitura, não haveria a necessidade do curso”, diz Regina.

Nessa discussão, muitos também defendem a utilização de textos mais curtos, visão que não é compartilhada por todos. “A forte carga de textos não é um problema, afinal aprender não é uma coisa fácil”, pontua Bernardo Fajardo, coordenador de graduação tecnológica da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape) da Fundação Getulio Vargas (FGV). Com cinco cursos tecnológicos a distância no portfólio, a Ebape não trabalha com videoaulas, embora insira na plataforma reportagens gravadas e vídeos relacionados com o conteúdo estudado.

Basicamente, os alunos estudam a partir de uma apostila on-line desenvolvida internamente. Os professores propõem atividades com base nesse material e aos tutores cabe estimular a participação dos estudantes nas discussões. Apesar de não contar com a infinidade de recursos multimídia que outras instituições oferecem, o curso de processos gerenciais ficou em primeiro lugar no Enade 2012, o último com resultados já disponíveis, como faz questão de ressaltar Fajardo.
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Parcerias

Para as IES que não podem ou não querem investir em departamentos internos, a opção é recorrer a empresas do setor para estruturar modelos híbridos ou totalmente terceirizados. “A escolha por um ou outro formato vai depender do modelo de negócios de cada um”, diz Regina, do Senac.

A Universidade de Guarulhos (UNG) se associou à Pearson para produzir, com seus professores, todo o material didático utilizado nos 17 cursos a distância. Segundo Enzo Moreira, diretor dos cursos EAD da instituição, a decisão de recorrer a um parceiro com experiência na área é uma tendência de mercado. Os pesados investimentos que seriam necessários para criar um departamento próprio também significariam fugir do core business da instituição.

Já a contratação de todo o material didático costuma ser a opção das IES de menor porte, com 2 mil a 5 mil alunos. Instituições com esse perfil compõem a maioria dos clientes da Sagah, empresa que trabalha com materiais prontos para cursos de graduação e pós-graduação. O conteúdo de cada curso é fatiado em várias unidades de aprendizagem, que são apresentadas numa espécie de cardápio para serem selecionadas pelas IES conforme suas necessidades e preferências, informa Adriane Kiperman, diretora de conteúdo do Grupo A Educação, da qual faz parte a Sagah. Assim, o gestor de um curso de pedagogia tem a opção de enfatizar as unidades que tratam dos pedagogos cognitivistas, por exemplo, ao montar a disciplina de teorias da aprendizagem.

A forma como os conteúdos são entregues aos alunos também é tão importante quanto a adequação da linguagem, acredita Araújo, da Cruzeiro do Sul. A plataforma onde a instituição publica os materiais didáticos – produzidos por cerca de 250 docentes – foi desenvolvida por uma empresa do segmento, a D2L.

William Campos, especialista de marketing da companhia (diretoria América Latina), afirma que as plataformas de acesso ao curso podem funcionar tanto como uma barreira como um elemento facilitador no processo de aprendizagem. Portanto, o ideal é que elas sejam de fácil navegação e suportem todos os modelos de aprendizagem.
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Retenção

Ao tornar a experiência dos alunos mais satisfatória, a adequação dos objetos de aprendizagem ao ambiente virtual contribui para reduzir a evasão, acredita Jungbeck, da Kroton. Isto porque conteúdo é o primeiro contato que o estudante faz com a instituição depois de efetuada a matrícula. “O material didático é uma forma muito fácil de o aluno tornar tangível a qualidade de um curso. Uma boa aula, um material bem organizado, apresentado de forma atraente, eleva o valor do programa na percepção do aluno”, acredita.

Moreira, da Universidade de Guarulhos, tem opinião semelhante e afirma que um conteúdo bem elaborado também faz com que o aluno não se sinta isolado e tenha motivação para prosseguir com os estudos.

A necessidade de acertar o tom da linguagem e diversificar os formatos também é importante para atender às mudanças em curso no perfil dos estudantes. Segundo Ronaldo Mota, da Estácio, a predominância de estudantes mais velhos ainda é uma realidade, mas ela está mudando com a chegada de estudantes mais jovens que, de tão habituados ao universo on-line, não concebem a possibilidade de estudar presencialmente. Estes chegam com a expectativa de encontrar ambientes virtuais semelhantes aos demais que acessam pela internet, e não um depositário de PDFs. “Quando a evasão não tem outras causas, como uma eventual dificuldade de financiamento, o conteúdo pode sim atuar favoravelmente para contê-la”, destaca.

Parâmetros para a produção de conteúdos
Veja abaixo algumas orientações gerais adotadas por instituições de ensino e empresas especializadas em cursos a distância:
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➣ Multimídia: material didático variado composto por textos, vídeos, simulados, exercícios, apresentações e demais objetos de aprendizagem;
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➣ Direto e objetivo: a linguagem dos materiais deve ser clara, direta e objetiva para evitar interpretações equivocadas em uma explicação. O aluno não tem o recurso de interpelar diretamente o professor como em uma aula presencial;
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➣ Dialógico: para simular as intervenções dos docentes, recomenda-se a inserção de alertas, recados e outros comunicados ao longo dos materiais para chamar a atenção dos estudantes;
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➣ Mapas mentais: apresentação prévia dos conceitos que serão trabalhados em cada unidade para o aluno se organizar. Funciona como uma espécie de roteiro;
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➣ Gabaritos comentados: os exercícios são resolvidos pelos professores – seja na forma de vídeo ou de texto – para que o retorno vá além do ‘certo’ ou ‘errado’;
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➣ Direitos autorais: produção própria de conteúdo – geralmente feita pelos professores da IES – ou contratação de empresas com responsabilidade legal sobre os materiais utilizados.

 

Autor

Marina Kuzuyabu


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