NOTÍCIA
Com a mudança de critérios de seleção das escolas participantes do Programa Internacional de Avaliação, MEC acredita na melhora do desempenho brasileiro no exame
Publicado em 10/09/2011
Por Carmen Guerreiro
Tais constatações sobre a amostra irreal da realidade brasileira surgiram com dados de um estudo do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), que coordena a prova no Brasil. E foram apontadas pelo MEC como um dos motivos para justificar o péssimo desempenho nas edições anteriores do exame, coordenado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Por isso, colégios da zona rural e urbana, rede pública e privada continuam valendo, mas agora serão considerados o porte das instituições (quantos alunos têm) e o IDH do município onde estão instaladas.
As escolas também continuam sendo selecionadas com base no Censo Escolar do Inep, que recebe uma lista de alunos da faixa etária desejada. A partir disso, um software escolhe os estudantes aleatoriamente, em um número proporcional ao tamanho da escola.
“Não queremos ranquear, aprovar ou reprovar. Queremos melhorar”, afirma Sheila Carvalho de Lira, consultora do Inep. Para ela, as avaliações realizadas no país morrem, muitas vezes, na fonte, mas com o Pisa deve ser diferente. Tanto é que o MEC pretende usar o exame para produzir indicadores, entender a realidade das escolas e dos alunos e servir de base para a formulação de políticas públicas na área.
Criado para avaliar não só o conteúdo do currículo escolar, mas também a capacidade dos estudantes de refletir sobre o conhecimento e aplicálo ao seu próprio cotidiano, o exame pode impulsionar melhoras nas instituições de ensino. “O Pisa quer saber o quão preparados os alunos estão para o mundo de amanhã, e para que isso aconteça eles devem ser formados hoje”, explica Maria Cecília Condeixa, consultora do Inep.
Na última edição da prova, participaram 41 países. Os primeiros classificados foram Hong Kong, com 550 pontos, Finlândia, com 544, e a Coréia do Sul, que atingiu 542 pontos.
Entre as outras razões do baixo desempenho brasileiro, destaca-se a defasagem entre idade e série, ou seja, os estudantes brasileiros de 15 anos estão atrasados em conteúdo em relação aos adolescentes dos demais países participantes.
Jonathan Osborne: a falta de interesse dos alunos pelas ciências, que englobam a física, a química e a biologia, é ainda uma dificuldade |
Entretanto, o MEC garante que houve melhora no desempenho brasileiro entre 2000 e 2003. De acordo com o órgão, o país teve o maior índice de crescimento de resultados em matemática: de 300 para 350 pontos no quesito “Espaço e Forma”, e de 263 para 333 em “Mudança e Relação”.
As avaliações do exame incluem cadernos de prova e questionários, com ênfases distintas em três áreas: leitura, matemática e ciências Em cada edição, o foco recai principalmente sobre uma dessas áreas. Nos anos de 2000 e 2003, a avaliação foi centrada em leitura e matemática, respectivamente.
Já em 2006, será a vez de aprofundar a análise dos conhecimentos em ciências.
O foco da edição deste ano é o único dos temas ainda não trabalhado com profundidade.
O letramento na área de ciências, como é chamado pelo Inep o conjunto de competências demonstradas pelos alunos em determinado assunto, consiste no uso de conceitos e no reconhecimento de situações científicas, para a resolução de problemas no cotidiano. Além do conhecimento do processo científico, com investigação, busca de evidências e demonstração científica das conclusões.
As ciências, que englobam a física, a química e a biologia, mostram ainda uma dificuldade: a falta de interesse dos alunos. O problema é apresentado por Jonathan Osborne, professor de Educação Científica do King’s College, em Londres (Inglaterra).
Para ele, os educadores não conseguem a atenção dos jovens porque eles próprios não se deslumbram mais com o que estão ensinando, não valorizam o processo da descoberta dos fenômenos entendidos hoje. “É preciso explicar como todo o conhecimento em um assunto foi adquirido”, defende.
O professor Luis Carlos Menezes, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, concorda, e afirma que o jovem não pode ver a ciência como tediosa. “O professor não está a serviço da formação dos jovens, porque nem ele entende o que está ensinando”, diz. Assim, afirma que a área é vista como domínio dos cientistas, e o educador é apenas um porta- voz transmissor de conhecimento.
O segredo para conseguir o interesse dos alunos, explica o professor de biologia Rodrigo Mendes, coordenador educacional do colégio Móbile (São Paulo), é unir na aula pontos comuns entre os conteúdos da cultura biológica e os gostos pessoais dos adolescentes, para que os alunos se identifiquem com o tema. Ele explica: “O objetivo é alimentar repertórios e tornar a ciência mais interessante para o jovem.” O ponto de partida, porém, é promover o letramento em ciências junto com a formação dos estudantes, defende Menezes. “Colocá-la à parte disso é o que a torna odiosa”, afirma.
Ele ainda defende a reformulação do currículo, que hoje “não passa de uma lista de tópicos”.
Em relação ao Pisa, o professor argumenta que a educação reflete um contexto nacional e o baixo desempenho brasileiro mostra o estado de nossas escolas: “Desigualdade nesse país não tem sido um problema, mas um programa, e a escola é parte desse programa.” De toda forma, tais diferenças poderão ser observadas ou não nessa próxima edição do exame. Há de se esperar que, independentemente dos resultados, elas sejam consideradas e que sirvam de alerta para melhorar a qualidade da educação brasileira.