NOTÍCIA
Déficit docente em disciplinas como física e química levanta a possibilidade de especialistas trabalharem em sala de aula, apesar de a ideia encontrar resistência
Publicado em 29/02/2012
A falta de professores nas disciplinas específicas do ensino médio é um dos cenários mais agudos do déficit de docentes na Educação Básica brasileira. Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a demanda de professores para as disciplinas de física, química e biologia está em 56,6 mil para cada uma delas, mas o número de docentes está distante do esperado. Para química, por exemplo, o país conta hoje com 8,4 mil licenciados em exercício, enquanto que, para física, o número é ainda menor: apenas 6,1 mil docentes com licenciatura específica. Enquanto a formação não consegue suprir as lacunas imediatas, e com boa parte dos formandos desinteressada em seguir carreira na sala de aula, uma alternativa seria contar com profissionais especialistas aposentados, como engenheiros e economistas, para ocupar essas vagas. Embora a ideia funcione bem em países como os Estados Unidos, onde lecionar se torna uma opção de carreira para especialistas aposentados (veja texto), a ideia ainda encontra raros adeptos no Brasil.
“Seria interessante aproveitar esse pessoal aposentado, mas isso é muito esporádico. Não tem incentivo, é zero no ensino médio e alguma coisa no ensino técnico”, lamenta o vice-presidente do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo, Carlos Alberto Guimarães Garcez. Segundo ele, são dois os principais motivos que impedem essa aproximação: as más condições de trabalho (que incluem má remuneração e indisciplina) e a falta de didática adequada. “A aula não é só chegar lá e transmitir o conteúdo. Os poucos que se dedicam a isso são aqueles que já tinham um interesse na carreira”, afirma. Já na indústria, por outro lado, os engenheiros aposentados são cada vez mais requisitados. “É uma pena, uma mão de obra qualificada que o Brasil não está sabendo aproveitar”, conclui Garcez, que também coordena uma pós-graduação na Universidade de Taubaté.
Para a pesquisadora Selma Garrido Pimenta, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), é arriscado apostar as fichas na ideia de que especialistas de outros setores poderiam suprir as vagas. “Para ser professor é preciso uma formação pedagógica específica. O engenheiro sabe cálculo, mas pode faltar a ele o saber de como inserir a física dentro das questões didático-pedagógicas”, diz. Na opinião dela, levar um especialista para a sala de aula sem formação pedagógica poderia acabar causando prejuízos dobrados: “Isso não vai nem resolver o problema do sistema nem satisfazer a eles”. Além disso, aponta Selma, há a questão da má remuneração e da desvalorização da carreira do magistério: o físico ou químico que tem acesso ao mercado acaba ganhando mais do que dando aulas. “Por outro lado, e isso é até uma contradição, muitos se interessam pela carreira de professor (na rede pública) pela estabilidade”, afirma.
Leia mais:
+ Brasil não aproveita a experiência de docentes aposentados para a formação de novos professores
+ Lacunas do mercado favorecem o aumento da participação de aposentados
+ EUA: carreira de professor é uma alternativa para profissionais aposentados