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Gestão

Estratégias para melhorar a captação e a retenção de alunos

Diante da crise econômica, instituições apostam em ações para aumentar o número de ingressantes e reter os alunos já matriculados

Publicado em 19/12/2016

por Paulo Jebaili

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Pela primeira vez desde 2009, o número de ingressantes no ensino superior caiu. Em 2015, conforme revelou o Censo da Educação Superior, 2,9 milhões de alunos entraram em cursos de graduação presenciais e a distância, 6,1% a menos que em 2014. A queda foi puxada pelo desempenho das instituições privadas, que registraram retração de 8,3% no número de novos estudantes em formações presenciais. Na rede pública, o dado ficou estável.

Diante do cenário, as estratégias de captação e retenção ganharam relevância ainda maior. E nesse contexto são de especial importância aquelas destinadas a contornar um dos maiores entraves ao crescimento do setor: o encolhimento do Fundo de Financiamento Estudantil. Além de viabilizar a entrada de novos alunos no ensino superior, o Fies também era tratado como um importante instrumento de retenção. Cálculos feitos pelo Semesp com base nos microdados do Censo de 2013 mostram que a taxa de evasão dos alunos financiados pelo programa é consideravelmente menor se comparada com a de alunos não financiados: 6,7% contra 23,1%.

A redução do número de ingressantes é diretamente atribuída às restrições impostas ao programa, que aos poucos começa a ser substituído por mecanismos alternativos. Em novembro de 2015, o Senac lançou um programa de parcelamento, que passou a constar já na campanha de vestibular. “O Senac decidiu fazer um parcelamento próprio, sem juros, totalmente mantido pela mantenedora. Ele está indo para a terceira campanha”, conta a coordenadora de relacionamento e captação Cíntia Bragato. O programa permite ao aluno pagar 50% ou 80% do valor das mensalidades e quitar o restante num prazo equivalente à duração do curso. A coordenadora explica que o parcelamento foi lançado inicialmente para os ingressantes, mas logo depois estendido aos demais alunos.

O mecanismo próprio de parcelamento também foi a alternativa das IES do grupo Kroton. Batizado de Parcelamento Estudantil Privado (PEP), o contrato é feito diretamente com a faculdade, que pré-aprova o crédito. O aluno paga 30% ou 50% do valor da mensalidade enquanto estiver frequentando as aulas e o saldo remanescente em período igual ao da duração do curso. “Tivemos uma adesão bastante interessante para esse produto, que fez com que as nossas captações sofressem menos no período crítico”, relata Guilherme Franco, vice-presidente de marketing e vendas do grupo. Lançado em 2015, o PEP nasceu com caráter emergencial e tornou-se protagonista na captação e retenção. “Hoje é a principal solução para o nosso aluno”, complementa.

Tendo o apresentador Luciano Huck como garoto-propaganda, o PEP veio acompanhado do discurso de que o ensino superior continuava acessível. “Houve uma ação de marketing muito forte para mostrar que as pessoas não precisavam desistir do sonho de conquistar um diploma, que havia soluções do ponto de vista financeiro. Principalmente num cenário macroeconômico tão adverso, estar cursando ou ter um diploma de curso superior garante uma maior empregabilidade. O desemprego afeta mais as pessoas que não têm curso superior, então é um investimento que vale a pena”, reforça o executivo.

O leque de benefícios financeiros no mercado também se abriu. É relativamente comum encontrar instituições que concedem descontos para o aluno que indicar outro aluno ou que firmam convênios com empresas e associações.

“O desafio consiste em favorecer o ingresso por meio de incentivos financeiros e criar condições para que o estudante permaneça na instituição, oferecendo oportunidades de estágios remunerados e bolsas de estudo acadêmicas”, observa Cláudia da Silva Santana, coordenadora de graduação da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep). Ela diz que a instituição dispõe de vários modelos de benefícios. “A Unimep tem uma política de incentivo financeiro e descontos nos valores da mensalidade para egressos da escola pública, ingressantes indicados por alunos, estudantes que ingressam por meio de convênios de empresas, organizações e associações, dentre outros.” A instituição piracicabana conta ainda com uma bolsa emergencial, que isenta o aluno de pagar mensalidades por três meses no caso de desemprego e por até quatro semestres para situações de morte na família.

Trabalhando a marca
Demonstrar a perspectiva de viabilidade financeira ao longo do curso é um aspecto crucial para a captação, mas não o único. A presença da marca da instituição junto ao público-alvo é outro fator crítico para atrair alunos. Por isso, a reavaliação das estratégias de comunicação e marketing tem estado na pauta das IES.

“A comunicação não é só uma campanha. É todo um ecossistema que vai envolver esse público para que ele conheça a instituição e faça a melhor escolha. Diante do atual cenário, existe um cuidado maior em relação ao que está sendo investido. A palavra do momento é assertividade, a gente não pode errar”, analisa Bruno Takikawa, coordenador de comunicação da Universidade do Oeste Paulista (Unoeste), de Presidente Prudente.

Ele conta que nos últimos dois anos uma fatia maior dos investimentos foi para as mídias digitais. “Os adolescentes e jovens estão passando cada vez mais tempo em frente ao computador ou com o smartphone, nas redes sociais, assistindo a vídeos na internet. Com a migração desse público, começamos a privilegiar esse tipo de veículo”, diz. Mas ressalta que as mídias clássicas, como TV e jornal, não foram preteridas: “Não esquecemos que existem os pais, os formadores de opinião, a sociedade de maneira geral, e cada um tem a sua particularidade em termos de comunicação”, explica.

A própria dinâmica do ingresso no ensino superior requer uma forma diferente de atuação na mídia, conforme lembra Daniel Antonucci, CEO da CRM Educacional. “Cada candidato leva em torno de seis meses para decidir por uma faculdade. Ou seja, não dá mais para fazer campanhas apenas durante a época do vestibular. Hoje as campanhas duram o ano inteiro. É preciso estar o tempo todo na mídia para atrair pessoas para a sua marca”, observa o executivo, que também é mestre em educação e tem MBA em marketing e em gestão acadêmica.

Dentre as formas de chegar ao potencial aluno, o marketing de conteúdo aparece em viés de alta nas IES. “A comunicação precisa mudar ao longo dos tempos para se adaptar ao público de interesse das instituições”, considera Takikawa. Ele conta que há cerca de um ano e meio houve maior ênfase no marketing de conteúdo, que, no caso da Unoeste, trata de fornecer conteúdos aos alunos do ensino médio. “São, por exemplo, dicas sobre provas do Enem, informações sobre o mercado de trabalho ou esclarecimento de dúvidas de português recorrentes. É uma forma de a instituição ajudar essas pessoas e demonstrar o conhecimento que detém para conquistar os alunos”, diz.

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Medida similar é adotada pelo Grupo Kroton, que criou uma plataforma específica de ensino e treinamento para o Enem. “Estamos fazendo uma iniciativa bastante forte para ajudar os estudantes a melhorarem sua nota no Enem e ingressarem nos cursos superiores que desejam. Já têm mais de 100 mil inscritos”, conta Franco. “É uma ferramenta que usa tecnologia de ponta de ensino adaptativo, que permite identificar seus gaps para melhorar suas notas. A plataforma cria uma rota de estudos. Na reta final, acontecem aulas ao vivo no Facebook e no YouTube”, conta. E acrescenta: “É lógico que vira uma plataforma de captação para nós, mas entregamos um conteúdo de altíssima qualidade e que ajuda na performance no Enem”.

Tête-à-tête
As ações de relacionamento também constam do expediente das IES para chegar ao público-alvo. Visitas programadas de escolas, eventos e feiras de profissões são atividades tradicionais que continuam em voga.

Em setembro, estudantes de ensino médio de dez escolas da zona sul de São Paulo participaram da primeira edição dos jogos esportivos organizados pelo Centro Universitário Ítalo-Brasileiro (UniÍtalo). Como educação física é um dos maiores cursos da instituição, com mais de 1,2 mil alunos, sediar a competição interescolar foi uma forma de se relacionar com o público-alvo e mostrar a infraestrutura do campus, que conta com ginásio poliesportivo, piscina e pista de atletismo. “Convidamos todas as escolas do entorno para participar. Os alunos e professores da universidade se envolveram, trabalharam como juízes das competições, auxiliaram na logística. Houve distribuição de medalhas aos participantes e prêmios, como computador e projetor, para as escolas vencedoras”, conta a vice-reitora Priscila Simões.

Nessa mesma linha, o Centro Universitário Senac – Santo Amaro convida os potenciais calouros a conhecer em detalhes os oito cursos ligados à área de tecnologia da informação (TI). “Os egressos de ensino médio são muito novos e nem sempre têm a clareza do que vai ser a profissão. Por que fazer engenharia da computação e não banco de dados? No vestibular passado, a gente chamou os candidatos aos cursos de TI para que eles viessem aqui e entendessem as possibilidades de cada um dos programas”, relata Cíntia Bragato.

Disponibilizar serviços à comunidade também tem sido uma forma de aproximação. As clínicas de psicologia da Unoeste, por exemplo, aplicam testes vocacionais gratuitos para estudantes do ensino médio. Já a UniÍtalo abriu neste ano o seu centro de idiomas à comunidade. A ideia surgiu a partir da constatação de que a estrutura instalada poderia contribuir estendendo os laços com o entorno. “Estamos prestando outro serviço de educação à comunidade”, explica Priscila. Mas a medida pode ter um efeito colateral positivo. Conhecendo o campus, um frequentador do curso de idiomas pode eventualmente tornar-se aluno da graduação ou da pós. O primeiro curso foi de português-inglês. Recentemente, foram abertos os de espanhol e de Libras (língua brasileira de sinais).

O desafio de fidelizar
Por mais variadas que sejam as formas de captação, a partir do momento em que o aluno cruza a catraca da instituição, começa outro desafio de monta: a retenção. Tanto que algumas IES dedicam atenção especial ao tema.

Citando o professor americano Vincent Tinto, referência em retenção, o diretor financeiro da Associação Santa Marcelina, Miro Severiano da Silva, explica que o primeiro passo deve ser calcular a probabilidade de evasão de cada aluno. Isso pode ser feito analisando três principais fatores: o nível de instrução dos pais, os atributos pessoais dos alunos (habilidade e competências necessárias para prosseguir nos estudos) e sua escolaridade anterior.

Além de identificar os possíveis evasores por meio de uma análise detalhada desses aspectos, a instituição tem de fazer sua parte. “O sucesso da retenção depende do engajamento do aluno e também da instituição”, declara. Da parte da instituição, esse compromisso diz respeito à contratação dos “melhores professores”, à oferta de uma boa assistência educacional e à disponibilização de coordenadores que acompanhem efetivamente os alunos. O ambiente acadêmico também está implicado nesse processo, ou seja, boas instalações e uma biblioteca bem equipada contam para o aluno ficar na instituição.

É igualmente fundamental cuidar da integração social por meio de eventos de confraternização, atividades esportivas e atividades acadêmicas extraclasse para que os estudantes tenham oportunidade de criar laços de relacionamento entre si. “A retenção não tem segredo. Ela só precisa de uma política bem clara dentro da instituição”, reforça Silva. Instituir essa política muitas vezes requer também mudar a cultura da instituição. O aluno que reclama não pode ser malvisto. Pelo contrário, sua queixa deve ser tratada como uma contribuição e ele deve, inclusive, ser agradecido por ter expressado sua insatisfação. “Mas não adianta receber a reclamação e deixar a situação se arrastar. O problema deve ser corrigido imediatamente”, aponta.

No ano passado, o Grupo Kroton criou a diretoria de fidelização, uma estrutura organizacional totalmente focada na retenção de alunos. Como desdobramentos, existem ações com suporte da tecnologia, como uma prática de CRM de análise preditiva. “Hoje, a gente consegue identificar em torno de 80% dos alunos que têm potencial risco de evasão”, relata Franco. Aferido esse risco, uma equipe é mobilizada. “Temos uma célula de retenção proativa, que, antes mesmo de o aluno manifestar o desejo de evadir, entra em contato para entender se há algum problema passível de ser resolvido”, informa. Além disso, o executivo acrescenta que todas as unidades do grupo contam hoje com um consultor de retenção, que funciona como um mediador de soluções do aluno. “Há uma série de iniciativas, tanto proativas quanto reativas, que procuram manter o aluno engajado”, diz.

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Na Unoeste, houve uma mudança na maneira de encarar a questão. “A gente não usa o termo ‘reter o aluno’, a gente fala em gestão da permanência”, diz Takikawa. A diferença, segundo ele, é uma abordagem menos imediatista e mais preocupada com a carreira acadêmica do aluno. “Antes era uma gestão de evasão, por uma questão de mercado, depois se chegou a esse tipo de visão, de ter um olhar mais cuidadoso do inicio ao fim, que muitas vezes não é o fim. O acadêmico pode ter interesse em fazer uma pós-graduação ou um curso de extensão”, comenta.

A UniÍtalo também criou um setor chamado gestão da permanência (GP). Quando o aluno formaliza a intenção de cancelar ou trancar a matrícula, passa por uma entrevista com o GP, que tenta reverter o processo. Se o problema é o desemprego, por exemplo, o GP aciona o setor de estágio e emprego para tentar conseguir uma recolocação para o aluno. O setor é responsável por toda a tabulação dos casos de evasão, com relatórios mensais para a diretoria e coordenadores de curso. “Isso ajuda a área acadêmica a se repensar”, diz Priscila.

Outra medida implantada neste semestre foi um programa de monitoria, em que veteranos que se destacaram numa determinada disciplina foram convidados a ajudar alunos em dificuldades com os conteúdos. “Percebemos uma correlação entre reprovação e evasão”, conta. A dedicação dos monitores conta como horas em atividades complementares, que precisam ser cumpridas.

Na visão da vice-reitora, as instituições tradicionalmente gastam muito para captar aluno e se importam menos com a retenção. “Já que houve trabalho e custo para colocar o aluno dentro da instituição, é importante que se pense em ações de retenção. Num cenário de retração econômica é importante ter ações específicas nesse sentido, e é algo que poucas IES têm. E a gente vê isso em vários segmentos. Na hora de vender, fazem qualquer coisa, na hora em que você compra, não consegue falar com mais ninguém. É uma tradição no Brasil. Vende bem, mas não sabe fazer o pós-venda”, finaliza.

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Paulo Jebaili


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