Empresas

Colunista

Márcio Sanches

Professor da EAESP/FGV e da FIA e consultor de empresas

Cursos in company, oportunidade de negócios para as IES

Lifelong Learning | Oferta dos cursos in company ainda é pouco explorada pelas instituições de ensino superior

cursos in company Colaboradores que irão investir tempo e recursos financeiros nessa formação específica demandam um curso adequado não só para sua carreira na organização atual, como também, uma capacitação que gere possibilidades no mercado (Foto: Pexels)

A oferta de cursos in company ainda é pouco explorada pelas instituições de ensino superior. A maior parte das instituições está 100% focada no mercado B2C, atendendo basicamente o aluno pessoa física e nem está em seu radar (ou no planejamento estratégico) a disponibilização de cursos para empresas e outros tipos de organizações.

O mercado de cursos corporativos no Brasil é liderado por organizações de tradição, marca e focadas em nichos específicos como é o caso da FGV, FIA e Dom Cabral nas áreas de negócios; da São Camilo na administração hospitalar e sistemas de saúde; da FEI na área automotiva, da Saint Paul na área de mercado financeiro e bancos e outras IES que vêm explorando com sucesso essa oportunidade. Porém, esse mercado é amplo e deve ser apreciado com carinho por mais instituições.

Os cursos corporativos podem ter diferentes formatos (presenciais, EAD ou híbridos), níveis (graduação, pós-graduação ou extensão) e atenderem diferentes públicos das organizações. As modalidades mais comuns são os cursos para colaboradores em formações especificas, os cursos corporativos em consórcio e os cursos sob encomenda (taylormade). Os cursos com formações específicas podem ser de graduação (mais raros) ou de pós-graduação ou de extensão. Nesta modalidade, a IES normalmente oferta um de seus produtos (MBAs, cursos de curta duração ou outros) aos colaboradores de organizações empresariais em condições especiais (horário, local, preço etc) em relação aos seus cursos regulares.

Na maioria das vezes, já estão no portfolio da instituição e são adaptados para a formação de turmas específicas para colaboradores da organização parceira. As negociações dessa modalidade são normalmente realizadas com a área de RH da organização, porém, grande parte das vezes, são os próprios colaboradores que arcam com as mensalidades.

 

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A proposta de valor com as formações específicas devem incluir tanto benefícios para a empresa quanto para os colaboradores. A organização neste tipo de contratação atua como hub dos interesses de desenvolvimento de competências corporativos e também como “patrocinadora” dos colaboradores.

Em relação aos interesses de desenvolvimento de competência, a organização tende a demandar conteúdos e atividades relacionadas às práticas que utiliza ou pretende implementar, portanto é importante que o coordenador do curso e a equipe docente estejam bem familiarizadas com esses temas.

Apesar da organização muitas vezes não investir recursos financeiros para o pagamento da IES, ela pode patrocinar a oferta de infraestrutura (salas de aula e instalações), de recursos tecnológicos (computadores, laboratórios) de apoio logístico (transportes),  nos ajuste de horários para que os colaboradores possam participar do curso, além de outros requisitos necessários para a viabilização do curso. Uma das demandas comuns nesses casos, além dos conteúdos e condições adequados, é que a IES ofereça um preço mais competitivo do que o ofertado para o mercado B2C.

Os colaboradores que irão investir tempo e recursos financeiros nessa formação específica demandam um curso adequado não só para sua carreira na organização atual, como também, uma capacitação que gere possibilidades no mercado. É fundamental que os conteúdos e as competências não se resumam aos demandados pela organização empregadora, incluindo também temas de interesse do mercado de trabalho de forma geral. Nessa modalidade um dos principais desafios da coordenação é conciliar os interesses da empresa e do colaborador.

Os cursos corporativos em consórcio têm características semelhantes aos de formação específica, porém incluem colaboradores de mais de uma organização. Esses cursos são interessantes, pois muitas vezes as organizações não possuem um número suficiente de candidatos para formação específica. Com duas, três ou mais organizações, atinge o ponto de equilíbrio necessário.

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Outro beneficio importante dos cursos corporativos em consórcio é o convívio e a troca de experiência entre os participantes de diferentes empresas. Normalmente a carência dessa troca é indicada como um ponto fraco pelos participantes dos cursos in company.

Compor o consórcio é um dos pontos críticos para o sucesso desses programas. Normalmente se recomenda evitar incluir organizações concorrentes, dando preferência às empresas fornecedoras, distribuidoras, complementadoras e de outros setores. Entretanto, existem várias experiências bem sucedidas de cursos in company em consórcios de concorrentes e em arranjos produtivos locais de diferentes setores. Exemplo disso foi o programa “Cooperar para Competir”, desenvolvido com grupos de empresas de calçados infantis concorrentes entre si pertencentes ao polo calçadista da cidade de Birigui, em São Paulo.  (Ver UCHIDA, S. BRANDAO J.B. e SANCHES M.A.R, “Construção de Vínculos de Confiança Empresarial” GV Pesquisas/N.P.P. Escola de Administração de Empresa de São Paulo/FGV: São Paulo 2011.)

Os promotores de cursos corporativos em consórcio devem ficar atentos à formação de grupos de empresas que tragam sinergia entre si e não competição e animosidade. Muitos gestores são resistentes a capacitar os seus colaboradores em conjunto com outras organizações por temerem a ocorrência de vazamento de informações estratégicas, comparações sobre remuneração e benefícios, evasão de talentos etc.

Outra modalidade relevante é a de cursos sob encomenda. A organização solicita o desenvolvimento de um curso distinto dos que a IES tem em seu portfolio, voltado a atender uma necessidade especifica que possui. Esse tipo de demanda tem uma complexidade superior às dos cursos corporativos.

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A IES tem que ter pessoas qualificadas para identificar com clareza a necessidade do potencial cliente e de transformá-la em um programa de ensino capaz de entregar a solução para as ‘dores’ da organização. Normalmente os problemas relatados pelos solicitantes são complexos e envolvem diferentes componentes que precisariam ser tratados, e dificilmente um curso (normalmente rápido) conseguirá dar todas as respostas. É preciso definir claramente quais questões serão abordadas, quais competências se pretende desenvolver, ou seja, qual a entrega do curso.

Outro desafio é o desenvolvimento do projeto do curso. Normalmente um dos recursos escassos desse modelo é o tempo dos participantes, de forma que é preciso estruturar uma agenda enxuta de encontros prevendo horários que permitam a máxima participação e a minimização do tempo e custos de deslocamentos.

A escolha dos docentes que conduzirão o curso é ponto chave para o sucesso da empreitada. Além do conhecimento técnico é preciso levar em conta se o docente se ajusta ao perfil da turma (formação, estilo, senioridade etc). Nem sempre o professor mais graduado é o mais adequado para determinada turma.

Outro ponto importante é a estratégia metodológica a ser utilizada, que normalmente deve ser mais “mão na massa”, reservando boa parte do tempo para trabalho em grupo e compartilhamento dos aprendizados e experiências, além de muito feedback por parte dos docentes.

Nesse processo há de se conter o ímpeto dos docentes de transpor os conteúdos e estratégias metodológicas (às vezes até as apresentações) já utilizadas com sucesso nos cursos regulares. Os públicos e as demandas são diferentes e a chance dessas estratégias bem sucedidas (mesmo em cursos de pós) são limitadas. É preciso realmente fazer algo sob medida e, nesse sentido, incluir no orçamento horas para o desenvolvimento do projeto por docentes e coordenadores.

 

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Nem sempre as IES possuem no seu corpo docente pessoas com a expertise necessária para uma demanda específica de um curso sob medida, nesse sentido vale a ir buscar esse profissional no mercado e agrega-lo a sua equipe para esse projeto. É importante encarar a parceria como uma oportunidade de aprendizado para a equipe e de desenvolvimento de novos produtos e negócios com a nova competência incorporada.

Nos cursos sob demanda é importante ter clareza que o cliente da IES é a organização contratante. Muitas vezes, apesar da demanda vir pelo RH da organização, o verdadeiro patrocinador do projeto é algum diretor de área específica, um superintendente ou mesmo o CEO da companhia. Neste sentido é fundamental estabelecer canais de comunicação e alinhar as expectativas com os dirigentes patrocinadores do curso.

A oferta de cursos corporativos podem trazer, além de mais alunos e receitas para as IES, uma série de outros benefícios como aprendizado com o parceiro, proximidade com RH e dirigentes de empresas para desenvolvimento de outros projetos, reputação junto aos empregadores e imagem junto ao mercado.

Existem muitas oportunidades a serem exploradas na oferta de cursos corporativos em diferentes áreas e as IES não deviam abrir mão delas.

Marcio Sanches é Doutor em Administração de Empresas pela EAESP/Fundação Getúlio Vargas. Professor na graduação e pós-graduação da EAESP/FGV e nos MBAs da FIA. Coordenador da Universidade Corporativa Semesp. 

Por: Márcio Sanches | 20/02/2023


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