Inovação

Colunista

Marina Feferbaum

Coordenadora do CEP e da área de metodologia de ensino da FGV Direito SP

Transformações nos escritórios criam novos cargos para advogados

Pesquisa indica a existência de pelo menos seis novas funções, como legal operations, gestão do conhecimento, gestão da inovação, entre outras

Inovação Elemento tecnológico não é o único a provocar mudanças nesse setor tido como tradicional

Por Alexandre Zavaglia Coelho, Marina Feferbaum, Olívia de Quintana Figueiredo Pasqualeto: A imagem que se tem de um escritório de advocacia é aquela que envolve um espaço físico, recheado de livros e papéis, repleto de profissionais formados em direito. Vestem-se formalmente, discutem questões estritamente jurídicas, se preparando para audiências e trabalhando com processos judiciais. Se essa descrição continua verdadeira para muitos lugares, é certo que ela se transforma cada vez mais.

Parte dessa mudança foi evidenciada com a pandemia de 2019, que acelerou a implementação e disseminação de recursos tecnológicos até então pouco usados nos escritórios, como ferramentas para realização de reuniões virtuais, armazenamento de dados em nuvens, ambientes digitais de colaboração, assinatura digital, gerenciamento de senhas, dentre outros.

As mudanças ilustram o impacto das tecnologias da informação e comunicação no setor jurídico, com novas formas de trabalhar, emergindo diferentes áreas de atuação. E, portanto, novas especialidades e demandas, facilitando a conexão com clientes, parceiros e o sistema de justiça. Nesse sentido, os impactos tecnológicos têm influenciado não apenas a forma de operar da advocacia (audiências virtuais, por exemplo), mas também o conteúdo do próprio direito (aí incluídas as crescentes preocupações com a proteção de dados pessoais). São dois efeitos principais: os reflexos nas próprias áreas e ramos do direito, e o uso aplicado de tecnologia para os serviços jurídicos.

No entanto, o elemento tecnológico não é o único a provocar mudanças nesse setor tido como tradicional. No movimento de mudança também são observados outros fatores importantes, com destaque para a profissionalização da gestão dos escritórios, criação de oportunidades e maior interação com outras áreas. E adaptação da linguagem jurídica para cada destinatário ou finalidade, entre outras possibilidades.

 

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Enquanto outras áreas já demonstravam preocupação com a gestão, esse tema ficou em segundo plano durante muitos anos nos escritórios de advocacia. A gestão – de pessoas, de eficiência, de riscos, etc. – era e ainda é feita (até mesmo intuitivamente) pelos próprios advogados mais experientes, de forma complementar às atividades típicas da advocacia. Contudo, cada vez mais cresce a profissionalização dessa gestão para os projetos de inovação e uso de tecnologia, com departamentos estruturados para novas demandas e necessidades. Exemplo disso é a criação de um departamento de recursos humanos interno nos escritórios de advocacia, especializado na gestão de pessoas, engajamento e formação contínua dos times. Pesquisa realizada pelo Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da FGV Direito SP (*1) indica a existência de, ao menos, seis novas funções ligadas à gestão nos escritórios, como legal operations, gestão do conhecimento, gestão da inovação, entre outras.

Destacam-se também atividades ligadas ao desenvolvimento de negócios e estratégias de inovação: os advogados deixam de ser procurados apenas quando há problemas e cada vez mais passam a participar da geração de novos modelos de negócio e possibilidades de inovação, identificação de oportunidades para clientes e para o próprio escritório, antecipação de potenciais riscos e soluções, saindo do reativo para uma atividade proativa. Essa posição demanda dos profissionais uma interação com outras áreas do conhecimento e com profissionais de outros campos, e uma proximidade ainda maior com os clientes.

 

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Assim, o escritório de advocacia passa a conviver não apenas com advogados, mas também com outros profissionais, a exemplo de cientistas da computação, analistas de dados, designers, jornalistas e especialistas em marketing. Esse ambiente diverso exige maior interdisciplinaridade, colaboração, aprimoramento de habilidades de comunicação e escuta, elementos descritos como fundamentais para o futuro da profissão. (*2)

Esse processo de transformação que observamos não é rápido e nem uniforme. Trata-se de um movimento gradativo e bastante heterogêneo, que parece estar presente inicialmente em escritórios de maior porte, mas que já começa a se expandir para os demais. Tal possibilidade de expansão acrescenta novos capítulos sobre como preparamos os futuros profissionais jurídicos nas universidades e se a regulação existente hoje está preparada para as mudanças (não apenas em relação à tecnológica) que estão vindo e ainda virão.

 

Os autores

 

Alexandre Zavaglia Coelho é pesquisador do Cepi da FGV Direito SP, um dos pioneiros no Brasil no uso de técnicas de inteligência artificial e legal design na área do Direito. Marina Feferbaum é coordenadora do Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação (Cepi) e da área de metodologia de ensino da FGV Direito SP, onde também é professora dos programas de graduação e pós-graduação. Olívia de Quintana Figueiredo Pasqualeto é Professora de Direito do Trabalho e Previdenciário da FGV Direito SP. Pesquisadora no Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da FGV Direito SP.

 

Referências

 

(*1) CEPI FGV Direito SP. Relatório temático#3: Profissões, cargos e funções emergentes no Direito: possibilidades a partir da advocacia. São Paulo: FGV Direito SP, 2022a. Disponível em: https://www.academia.edu/88234297/Profiss%C3%B5es_cargos_e_fun%C3%A7%C3%B5es_www.academia.edu/88234297/Profiss%C3%B5es_cargos_e_fun%C3%A7%C3%B5es_emergentes_no_Direito_possibilidades_a_partir_da_ advocacia. Acesso em 11 jan. 2023.

(*2) THE LAW SOCIETY. The future of law and innovation in the profession. Londres, 2017. Disponível em: https://www.lawsociety.com.au/sites/default/files/2018-03/1272952.pdf. Acesso em 8 fev. 2023.

 

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Por: Marina Feferbaum | 25/04/2023


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