Educação

Colunista

Josiane Tonelotto

Superintendente acadêmica do Centro Universitário Belas Artes

Bullying entre estudantes na universidade

Intimidação sistemática transforma as IES em espaços hostis

Bullying Alguns fatores podem aumentar a predisposição para o bullying, tornando as pessoas mais complacentes

O bullying em nossas salas de aula é um episódio muito mais frequente do que pensamos. Não se trata de um fenômeno isolado e presente apenas em alguns países, ou mesmo restrito a algum nível educacional. Está presente no mundo todo e em todas as faixas etárias. Nas mais diversas culturas, a violência entre pares é um comportamento predominante entre as crianças, adolescentes e adultos em idade escolar e tem efeitos significativos no seu bem-estar. Essa violência pode assumir formas diversas, desde intimidação pessoal até embates físicos. Mais recentemente, essa violência se consolidou nas interações online, e por consequência passou também a ser virtual. 

Embora seja um termo falado aos quatro cantos do mundo, não existe para ele uma definição única, e serve como rótulo sob o qual se escondem episódios violentos e intimidadores que marcam a vida de muitos estudantes. Nas relações que se configuram há um desequilíbrio de poder, ainda que apenas percebido, além do fato de que o agressor ignora a necessidade de respeitar os direitos e dignidade dos outros. Esses episódios podem ser considerados um padrão comportamental, não eventual, mas frequente e nem sempre se trata de um comportamento claro. Apesar disso, incluem intencionalidade e deliberação, com o propósito nítido de intimidação do outro. Destaque-se que as repercussões são negativas não apenas para a vítima, mas também para o agressor, eventuais testemunhos e para as famílias.

 

Leia: Universidade deve agir para frear o bullying

 

Para a Associação Americana de Psicologia (APA) o bullying é uma forma de comportamento agressivo em que alguém, intencional e repetidamente, causa ferimentos ou desconforto a outra pessoa. O bullying pode assumir a forma de contato físico, palavras ou ações mais sutis. O indivíduo intimidado normalmente tem dificuldade em se defender e não faz nada para “causar” o bullying. O cyberbullying, uma forma de bullying, é um comportamento verbalmente ameaçador ou de assédio conduzido por meio de tecnologia eletrônica, como telefones celulares, e-mail, mídias sociais ou mensagens de texto (Adaptado do Dicionário APA de Psicologia). A prática do bullying pode ser individual ou em grupo, sofrida igualmente por uma pessoa ou por um grupo num mesmo ambiente. 

Alguns fatores podem aumentar a predisposição para o bullying, tornando as pessoas mais complacentes. São eles: características de personalidade, idade, gênero, raça, etnia, orientação sexual, estado de saúde (como, por exemplo, depressão, ansiedade, obesidade), status econômico, dificuldades de aprendizagem ou desenvolvimento, nacionalidade, conhecimento, experiência e as ligações sociais. Alguns comportamentos ou forma de relacionamentos, embora desagradáveis, podem não se configurar como bullying. São eles: conflitos mútuos, que incluam desacordo, porém sem desequilíbrio de poder; atos de maldade ou agressão física num único episódio e rejeição ou antipatia social.

 

Saúde mental: problema se agrava e IES atuam na prevenção

 

Embora o bullying esteja presente nos diversos ambientes e com as mais variadas relações, gostaria de me ater ao bullying praticado entre estudantes. Embora possa nos ocorrer que o ensino superior seria um período de maior maturidade e, portanto, de relações interpessoais mais estáveis, isso nem sempre ocorre e a universidade passa a ser um espaço de intimidação. As características do bullying no ensino superior estão mais relacionadas aos aspectos verbais e online. Diferentemente do que ocorre em níveis anteriores do desenvolvimento, em que a força física é mais utilizada, jovens adultos se beneficiam mais da linguagem para os episódios de intimidação.

O que ocorre em nossas salas de aula, na educação superior, deixa marcas para toda a vida de uma pessoa e interfere na maneira com ela constrói as próprias relações de trabalho. Alguém, vítima de bullying, pode se tornar mais frágil e muito menos resiliente para a convivência em ambientes profissionais. Interferir nesse processo não é algo simples e passa por ações que atingem diversos atores e setores da universidade.

Em primeiro lugar, precisamos pensar no acolhimento do estudante que se sente vítima. Precisamos não apenas ouvi-los, mas assumir uma postura de acolhimento e proteção. Precisamos permitir que expressem de forma livre o que sentem e entender o nível de sofrimento que a situação impõe. No entanto, acolher apenas não é suficiente, daí a necessidade de mantermos em nossas universidades serviços que atuem além da escuta e amparo, mas também das providências que devem se seguir a uma queixa dessa natureza.

 

Leia também: Por que os alunos abandonam a universidade

 

Em segundo lugar, é preciso preparar os docentes para mediar essas situações quando elas ocorrem em sala de aula, que deve ser acima de tudo um ambiente seguro para todos. Muitas vezes o professor não sabe como agir porque não foi preparado para tal, e não se trata apenas de pequenas discussões sobre o tema, mas de estudo e informação contínua e aprofundada.

Um terceiro ponto é a responsabilidade da instituição na manutenção de comitês ou núcleos destinados a apurar e encaminhar providências sobre as queixas ouvidas. Isso confere a seriedade que o tema merece e permite que se formalizem eventuais punições e, principalmente, demonstrem uma postura ativa contra comportamentos reprováveis. Não podemos esquecer, no entanto, que o agressor também é aluno e que seus comportamentos merecem ser entendidos e orientados.

O bullying e o cyberbullying são problemas sérios de saúde pública, social e mental. À medida que estão na universidade passam a ser também problema nosso, como educadores e como gestores. Não podemos ignorar as consequências desastrosas que podem advir de episódios dessa natureza. Não podemos cruzar os braços e pensar apenas no desenvolvimento de competências profissionais. Isso de forma alguma faz uma pessoa bem-sucedida profissionalmente. É nossa responsabilidade pensar e agir de forma ampla: além das providências pontuais já discutidas,  precisamos de proatividade e de engajamento em campanhas de conscientização e políticas educacionais de prevenção ao bullying. A universidade precisa ser um ambiente seguro, saudável e confiável para que nossos estudantes se desenvolvam plenamente.

 

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Por: Josiane Tonelotto | 09/05/2024


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