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Maioria no ensino superior, professores enfrentam descrédito no infantil

Dirigentes não apoiam a presença do professor homem na educação infantil que, sob pressão, é motivado a desistir do cargo

Publicado em 30/05/2022

por Karen Cardial

professor educação infantil

No Brasil, dos 593 mil docentes que atuam na educação infantil, apenas 3,6% são homens, segundo o Censo da Educação Básica 2020. Esse índice vai se ampliando a partir dos anos finais e ensino médio; já no ensino superior a presença masculina é maioria.

Nos países africanos há uma pirâmide completamente inversa: na educação básica a maioria dos professores é do sexo masculino – o mesmo ocorre no Japão. Em Moçambique, as mulheres ocupam cargos nas áreas de exatas, agrimensura, matemática, zootecnia, agronomia e os homens estão no magistério. Na Europa, Portugal e Espanha são duas grandes referências de professores do sexo masculino na alfabetização e na educação infantil. É senso comum pensar que isso retrata a questão cultural do Brasil, mas há também um tema delicado, o de gênero, sobre o qual ninguém fala.

Leia: Projeto incentiva meninas em carreiras STEM desde a educação básica

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“Eu precisava fazer um esforço extraordinário para ter um reconhecimento”, diz Geraldo Peçanha. Foto: arquivo pessoal

A função da educação infantil na sociedade contemporânea é a de possibilitar a vivência em comunidade, praticar o respeito, acolhimento, inclusão e diversidade. Embora sejamos biologicamente sociais, é o convívio que nos ensina formas de nos relacionar. Essa é a grande tarefa da educação na primeira infância.

O obstáculo para o homem entrar na educação infantil está numa sociedade que não enxerga esse papel como masculino, uma vez que cuidar é atribuição da mulher e a escola tende a não fazer nenhum trabalho para diminuir isso, deixando o professor fragilizado.

De acordo com Geraldo Peçanha de Almeida, pedagogo pela Universidade Estadual Paulista de São Paulo (Unesp), quando um homem consegue romper essa barreira e entrar numa escola de educação infantil, ele não encontra pares. “Toda professora passa pela situação de uma criança que é mordida por outra, de um aluno que empurra o colega que cai e fere a cabeça, mas, se acontece na classe do professor homem, a causa é vista como desleixo e incompetência”, ilustra Geraldo, que atuou durante nove anos na educação infantil da rede particular e pública na cidade de Curitiba, Paraná.

egundo ele, as próprias colegas de trabalho olham para o professor do sexo masculino como incapaz de cuidar, portanto, de exercer a maternidade. A cobrança e a vigilância em cima do homem que entra na educação infantil são muito maiores, complementa Geraldo.

Grande parte das escolas considera a educação na primeira infância como um prolongamento da casa, da mãe, ou seja, um prolongamento da maternidade. Geraldo expõe que uma docente mulher pode auxiliar uma criança pequena no banheiro, mas um professor homem não pode.

“Uma professora pode dar banho nos alunos, um pediatra pode examinar tanto meninos quanto meninas, mas um professor homem de educação infantil gera desconfiança no cuidado com as crianças”, explica.

Homens chegam a entrar na educação infantil, mas episódios de desconfiança, acusações e reuniões com as famílias e responsáveis para esclarecimentos, muitas vezes sem nenhum sentido, causam um desgaste tão grande que o professor desiste e sai da escola. “Eu precisava fazer um esforço extraordinário para ter um reconhecimento”, admite Geraldo, que também é psicanalista e doutor em teoria literária. Ele conta que um colega o procurou para contar que como professor da educação infantil fora proibido de, no horário do sono das crianças, permanecer na sala junto delas. Nesse momento seria designada uma professora mulher para supervisionar as crianças. Para Geraldo isso é violência laboral, onde o contexto de trabalho para o homem na educação infantil é cruel.

“Dirigentes têm cobranças de todos os lados: uma diretora de pré-escola é cobrada por vaga, por criança que precisa tomar medicação num determinado horário, por uma criança que cai e se machuca, até pela criança que não fala direito. Mas quando uma família traz à escola inseguranças quanto à intimidade, sexualidade, afeto, carinho e até sobre a educação dada por uma figura masculina, a direção da escola se mostra frágil, despreparada e não entende o real papel da educação”, aponta o professor. 

Leia: Curso de ensino superior dialoga com a educação básica

Para Geraldo, também autor de mais de 70 livros, entre infantis, para pais e educadores, a educação é feita na multiplicidade: quanto mais diversificadas forem as linguagens, as relações e as convivências, maior é o ganho das crianças, em termos de relações humanas, equilíbrio emocional e referências. “Colocar uma criança durante quatro anos só diante de educadoras mulheres, cuidadoras, assistentes femininas, por preconceito, é privar a criança de um direito que está garantido na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que é o de conviver”, explica.

Ele conta que há cinco anos Curitiba introduziu três professoras trans na educação infantil: houve aceitação da escola, em seguida reuniões com os pais para esclarecer dúvidas e anular preocupações. Criaram-se momentos de discussão e convivência entre familiares e professores. “Nessa experiência de Curitiba, a maior resistência foi por questões religiosas; pais conservadores apresentaram dificuldade, mas não impedimentos. Isso mostrou que se o trabalho realmente é feito com responsabilidade, não só o homem tem espaço na escola, como também qualquer outra pessoa”, assinala Geraldo Peçanha.

Este é um trecho de matéria produzida por Karen Cardial para a Plataforma Educação, onde você pode ler a versão completa

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Karen Cardial


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