Nas aulas de Extensão Rural do professor Ezequiel Redin, na UFVJM, os estudantes são os responsáveis pela escolha do palestrante e pela dinâmica em sala
Dona Marta compartilhando sua luta (foto: arquivo pessoal)Didáticas de aprendizagem que estimulem os alunos parecem estar sempre no radar dos educadores. Ezequiel Redin, professor do Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), Campus Unaí, em Minas Gerais, não é diferente.
Ele desenvolveu uma abordagem para tornar suas aulas mais práticas e aumentar a participação dos estudantes. Toda semana, em sua disciplina, acontece o momento de Compartilhamento de Experiências em Extensão Rural, em que os alunos recebem um especialista da área.
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A escolha do palestrante, a organização e a dinâmica em sala ficam por conta dos alunos, que se dividem em grupo. “Na perspectiva da Ecologia dos Saberes, de Boaventura de Sousa Santos, a aula visa recuperar práticas e saberes de grupos sociais diversos, em especial, dos agricultores e dos extensionistas que estão a campo trabalhando diretamente com o agricultor. É uma metodologia que tem encantado os alunos”, conta Redin.
O professor acredita que o fato de um profissional compartilhar o seu dia a dia aproxima a disciplina da realidade do mercado e serve de estímulo aos acadêmicos ao apresentar possibilidades de atuação. “Sem dúvida, é um ambiente muito rico, que possibilita um compartilhamento de cases das mais variadas subáreas da Extensão Rural e fortalece a práxis educativa com a aproximação do ambiente interno e externo à instituição”, enfatiza.
A disciplina lecionada por Ezequiel Redin é obrigatória para os cinco cursos da UFVJM: Ciências Agrárias, Agronomia, Engenharia Agrícola e Ambiental, Medicina Veterinária e Zootecnia.
Redin também é professor permanente do programa de pós-graduação em Estudos Rurais (PPGER) da mesma universidade, editor da revista Extensão Rural e membro da Academia Centro Serra de Letras.
Confira abaixo a entrevista feita por e-mail com o professor.
De que forma a disciplina Extensão Rural, ministrada pelo senhor, une teoria e experiências cotidianas?
A disciplina é dividida em dois dias com duas horas letivas cada. No primeiro dia da semana os acadêmicos recebem os instrumentos teóricos, analíticos e discutem os enfoques e as metodologias de Extensão Rural. Já o segundo dia é uma metodologia que se pauta sob as bases da Ecologia dos Saberes de Boaventura de Souza Santos, em que objetiva trazer à universidade as práticas e saberes de grupos sociais distintos que ao longo do tempo foram desprestigiados no mundo acadêmico.
A turma é dividida entre 11 a 13 grupos que completam a agenda do semestre. O grupo responsável pela semana organiza a atividade e os acadêmicos que participam dela são responsáveis por resenhar o Compartilhamento de Experiências em Extensão Rural com regras adotadas na disciplina como resenhas que incluem uma ampla análise das falas dos convidados, com criticidade, capacidade analítica e sistemática revisão ortográfica, sendo adequados às regras da ABNT.
Por que o senhor considera que as suas aulas estão ligadas às metodologias ativas? Além dos alunos convidarem o palestrante, a metodologia em sala possui outro diferencial?
A nossa primeira concepção é que não seja uma palestra, mas um compartilhamento de experiências justamente para trazer uma significação para esse momento. Uma palestra possui regras formais que deixam o momento muito rígido, onde um emite a mensagem e o público a recebe, assistindo passivamente. O nosso Compartilhamento de Experiências em Extensão Rural busca justamente o contrário. Ele quer promover a troca de experiências e aguçar o acadêmico em formação para um diálogo e construção de saberes entre a prática e o que se aprende nas instituições de ensino e pesquisa.
Trata-se de uma proposta diferenciada porque coloca os estudantes como protagonistas na organização do encontro, sendo eles os responsáveis pela dinâmica acontecer. Nisso o professor é apenas um flexibilizador para que o momento aconteça, sendo o acadêmico, o ator principal nesse estilo de ensino e aprendizagem.
O senhor pode dar exemplos de pessoas que palestraram nas aulas e alguns temas abordados?
Já tivemos a presença de profissionais que estiveram à frente das políticas de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) voltadas para a agricultura familiar no Governo Federal e os pesquisadores/extensionistas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) sempre estão presentes contando experiências, o que tem encantado nossos acadêmicos.
Em uma das oportunidades, um grupo de acadêmicos organizou a vinda de uma agricultora familiar. Dona Marta vivenciou boa parte da sua história de vida como agricultora, mulher negra que trabalhou no rural de Unaí em tempos difíceis. Ela é uma defensora das causas coletivas e atuou fortemente em movimentos sociais que defendem e valorizam a mulher no campo e na cidade, em prol da causa das mulheres e negros. Já realizou vários projetos de valorização desses membros da sociedade, dando estímulo e empoderamento para mulheres, isso em um tempo em que não se falava de feminismo, sobretudo, em uma região interiorana e, na época, socialmente negligenciada.
Qual o papel da extensão rural na vida dos agricultores? Há um cuidado com as práticas tradicionais adotadas por esses agricultores?
Sem dúvida é a transformação social das famílias agricultoras. Estamos trabalhando com pessoas, em especial, famílias que em boa parte, não tiveram a oportunidade de cursar um ensino superior. E a extensão rural tem o papel de criar e organizar oportunidades para valorização da vida, da produção e elaborar estratégias de reprodução social; os saberes das famílias rurais e as práticas tradicionais são valorizadas nesse processo.
Hoje, estamos em uma crescente preocupação com a saúde, em especial em como produzimos nosso alimento. As práticas agroecológicas, por exemplo, visam trabalhar com as famílias rurais que são hipossuficientes economicamente e que podem reduzir a dependência do mercado de insumos e potencializar os recursos presentes na unidade de produção.
Vale ressaltar que, segundo dados divulgados pelo Censo Agropecuário 2017 realizado pelo IBGE, 80,14% dos estabelecimentos rurais no Brasil não possuem nenhum tipo de assistência técnica. Além disso, 62,75% desses estabelecimentos rurais estão na faixa de 10 a 50 hectares e 15,59% estão com propriedades de 50 a 100 hectares, ou seja, esses agricultores familiares possuem relativas restrições de terra e conhecimento, por isso, precisam de auxílio na organização do espaço de produção para que possam gerar renda e agregar valor aos produtos da terra que colhem.
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Por: | 20/07/2019