NOTÍCIA

Gestão

Pilares da sustentabilidade

Cinco diretores financeiros de IES fazem reflexão sobre o aprendizado da pandemia e como vai ser a vida daqui para a frente

Publicado em 13/07/2022

por Redação

Diverse university students at campus in summertime Num cenário sem uma política de financiamento estudantil, o ensino superior vai ter que ser mais criativo para aumentar o número de alunos

O executivo financeiro deve participar da estratégia da IES (instituição de ensino superior). Somente assim consegue implementar medidas em consonância com as demais áreas. Essa constatação foi feita na reunião realizada pela Plataforma Ensino Superior, no mês de maio, com 5 gestores de finanças, que esbanjaram conhecimento do setor, dos concorrentes e das tendências do mercado. E a conclusão foi que a pandemia sacudiu o mundo e obrigou as IES a repensarem seu caminho. Houve uma expectativa de quebra, que não se concretizou, apesar da propalada lentidão para a tomada de decisão.

Falou-se muito do benefício que é ter curso de medicina, com um ticket que chega a R$ 8.500,00, e da segurança de quem já tinha um EAD bem estruturado. “Essas instituições não tiveram problema. Já quem trabalhava com preço muito apertado, então qualquer aumento de inadimplência ou evasão trouxe problemas financeiros, com uma alavancagem grande de endividamento.

Num dos exemplos citados como mudança, a criação de uma área comercial na tradicional Unifor, de Fortaleza, chama a atenção. E reforça o protagonismo dos profissionais de finanças e comercial. Finalmente, levantou-se a questão da receita líquida, que é muito baixa no setor. Se a concorrência for toda focada em preço, muitas IES podem ficar pelo caminho.

De toda forma, superado o trauma da covid-19, espera-se, as atenções voltam-se para a captação. Num cenário sem uma política de financiamento estudantil, o ensino superior vai ter que ser mais criativo para aumentar o número de alunos. E trabalhar para que o aluno encontre na escola aquilo que foi prometido, para evitar evasão. No mercado há jovens que esperam a inclusão na graduação, mas o poder aquisitivo continua baixo. O depoimento de cada um dos executivos é útil para ajudar a repensar cada IES.

Num cenário sem uma política de financiamento estudantil, o ensino superior vai ter que ser mais criativo para aumentar o número de alunos
 
Leia: Disparidades acadêmicas em sala de aula

 

Financeiro estratégico melhora desempenho

 

 Unicesumar (Jeferson Vinhas Ferreira*) | “A Unicesumar cresceu muito no período de pandemia, e como todas as grandes, os problemas financeiros praticamente inexistiram, não houve impacto negativo, até pelo contrário. EAD, isso é um ponto importante, acelerou em termos de matrícula. A gente cresceu 30% ao ano nos últimos dois anos, independentemente de pandemia. Como houve economia de gastos em função de não ter as atividades presenciais, isso ajudou no resultado financeiro final da instituição. A ausência das atividades presenciais reduziu custos e acabou escalando o resultado.

A Unicesumar não foi impactada negativamente pela pandemia. Pelo contrário, aproveitou essa oportunidade para intensificar suas operações no ensino a distância, que já eram grandes. Em 2022 atingiu a marca de 400 mil alunos. Ao longo de 2021 bateu 300 mil, houve um crescimento de 100 mil alunos, 30% ao longo desse ano. Em agosto de 2021, ocorreu a venda da Unicesumar para a Vitru, que é dona também da Uniasselvi, e de lá para cá continua escalando, com crescimento bastante forte.

A Unicesumar tem dois pilares: Medicina, com 350 vagas, podendo ir para 400 agora com a expansão do programa Mais Médicos, de Corumbá; e o EAD, que sozinho já é o quarto do país. Quando juntar com a Vitru, com o último número da captação chega a aproximadamente 800 mil alunos. A pandemia causou uma aceleração de adaptações que precisavam ser implementadas ao longo do tempo. Muitas IES já haviam feito esse processo, a Unicesumar é uma delas. Nossa área de TI tinha 110 pessoas, engenharia civil e manutenção, 70. Houve uma redução de 15%. Vários mantras foram derrubados, a tradição não foi mais usada para justificar a manutenção de algo que precisava ser mudado. Para seguir, temos que olhar startups, negócios que estão circulando em volta das instituições de ensino, esse é um braço para quem quiser crescer. Temos que olhar melhor o sistema de custos. Houve uma consciência de que é isso que o mercado paga, com uma acomodação no valor. Na Unicesumar, tentou-se melhorar o valor agregado no EAD. Mas entendemos que chegamos ao patamar, essa é a opinião do pessoal das grandes instituições.”

 

Rompemos a inércia com a semestralização

 

UNIPAR (Alexandre Fernandes*) | “Eu vivi a pandemia em três situações diferentes. Na Braz Cubas, onde fiquei quase dez anos e ajudei na transição para a Cruzeiro do Sul, concluímos tudo uma semana antes do lockdown em São Paulo, mas ficamos em home office para a conclusão. Tive experiência no Norte do Brasil, no estado de Rondônia, Porto Velho, com dois cursos de Medicina. A covid-19 teve peculiaridades em cada região. Lá havia uma vontade muito forte da volta do ensino presencial; como demorou, a gente sofreu bastante com a evasão. O impacto foi enorme, passou dos 30% ao longo do semestre, só que Medicina segurava muito os resultados.

A aula remota foi uma dificuldade naquele momento. Nas IES de pequeno e médio portes foi uma transformação abrupta. E o aluno sentiu que o professor não era preparado para fazer uma videoaula. Então infelizmente a evasão foi maior. Não voltamos a ter o tamanho que era antes da pandemia, mas o negócio era bem sustentável, o curso de Medicina conseguiu bancar toda a estrutura. Problemas financeiros não houve. Com a minha vinda para a Unipar, em Umuarama, o EAD já existia, tinha um certo parâmetro tecnológico para uma adaptação mais rápida.

Este ano captamos 60% a mais do que no mesmo período de 2021. É resultado da forte marca que temos nas regiões em que atuamos no Paraná, estado que tem 399 cidades. A maior em que a gente atua é Cascavel, e tem outras seis cidades. A nossa estratégia foi focar na área comercial para trazer os alunos de volta; chegamos a ter 22 mil.

Este ano introduzimos a semestralização, uma discussão antiga numa IES tradicional, mas foi aceita como estratégia para repor as perdas. As grades curriculares das três modalidades de graduação (presencial, semi e EAD) são iguais e a gente consegue resolver o problema acadêmico do aluno sem que ele tenha que ficar mais tempo. A Unipar também conseguiu um ticket maior utilizando disciplinas técnicas de forma presencial e as demais em EAD.

É um modelo novo, mais aceito após a pandemia, porque o aluno forçadamente teve que consumir uma aula virtual, e acabou gostando. Na parte prática ela é toda presencial mas na teórica a gente faz EAD e teve uma aceitação maior. A Unipar é supertradicional; a pandemia veio e o resultado financeiro desceu, e ela foi obrigada a fazer mudanças, que não queria no passado, como a semestralização.”

 

Leia também: “Financiamento da Capes deve ser prioridade do MEC”, diz Baeta Neves

 

Agora, buscar oportunidades para crescer

 

O caso do Grupo Integrado é comum a muitas instituições: está numa microrregião, no caso Campo Mourão, no Paraná, cercado pela gigante Unicesumar e pela tradicional Unipar. O fato de sermos pequenos (6 mil alunos) nos permite aplicar uma metodologia ágil na administração de um modo geral. Tomamos medidas urgentes sempre de acordo com a necessidade. Tivemos resultado positivo em 2021, estamos capitalizados, mas sabemos que, excluindo o curso de Medicina, a graduação vem perdendo muitos alunos no presencial. E falo isso num ano em que tivemos um resultado de captação 40% a mais que no ano passado.

Grupo Integrado (Alan Sales da Fonseca*) | “A pandemia ajudou nos ajustes da estrutura tradicional, revendo custos e segurando os gastos. Em 2022, tivemos a melhor captação dos últimos quatro anos, quase 50% de crescimento de receita. Mas o estoque de alunos continua andando de lado, por causa do EAD e da evasão. A gente tem o curso de Medicina crescente ainda. Mas o presencial vem sofrendo muito no número de alunos. Se a nossa captação foi boa, sofremos com o ticket médio. Crescemos na Medicina, na educação básica e estamos otimistas na pós-graduação. Sobre planos de expansão, continuamos na busca por novas áreas de atuação.

Estamos convictos de que é necessário buscar nichos para nos proteger dos ataques dos grandes. O Grupo Integrado tem dois campi na cidade e busca fortalecer cada vez mais a marca. Acho que as pequenas instituições, que hoje já começam a atuar em colaboração, devem aprofundar essa questão e se juntar para buscar a sustentabilidade. Nós criamos uma área de agronegócio e vamos continuar prospectando novas oportunidades.”

 

A tradição teve que ceder

 

Unifor (Jefferson Candido*) | “Somos uma instituição privada e sem fins lucrativos, com uma fundação como mantenedora. Gozamos de grande prestígio por sermos do Nordeste, e nos percebem como uma instituição diferenciada. 

A estrutura é muito robusta. Para se ter uma ideia, temos mais de 100 funcionários na área de segurança, mais de 100 funcionários em serviços gerais e jardineiros. É um pouco atípico, difere da dinâmica operacional da grande maioria das IES, é um modelo mais parecido com as instituições americanas. É grande, ampla. No início da pandemia, quando resolvemos dar desconto, foi uma decisão de abrir mão de receita, era nosso papel como fundação de apresentar uma demonstração de solidariedade naquele momento em que as pessoas perdiam emprego e não queriam e não podiam abrir mão de estudar. Financeiramente, na ponta do lápis, foi ruim, mas a gente não teve evasão acima do que já tínhamos anteriormente. Então valeu a pena. E vamos lembrar que a imagem da instituição sempre sai fortalecida em decisões como essa. Houve dificuldade na busca para se manter realmente diferente e dando para o aluno algo que o outro não dá. Tem o professor que ministra aula aqui e para o concorrente, só que lá a experiência na sala de aula talvez seja igual, mas ele não tem todos aqueles acordos internacionais, ou um determinado laboratório para uma experiência. O campus é um diferencial, ele vê essa harmonização com as pessoas. Aprendemos muito nesse período. Em 2021 começamos a fazer ações de captação, foi aí que institucionalizamos a área comercial. Existe essa discussão sobre presencial e online. Fizemos uma pesquisa durante a pandemia e constatamos que um terço dos alunos queria presencial, diziam que precisavam se conectar; outro um terço preferia híbrido. Mas, quando as aulas foram liberadas, quem queria híbrido disse que a convivência era fundamental. ‘Preciso me conectar, diziam’. Conseguimos voltar a captação como era antes. De repente, a partir de 2020 os gastos se alteraram, diminuíram os custos em alguns setores, mas tivemos maior dispêndio em tecnologia, por exemplo, para viabilizar o ensino virtual. Em 2021, com a redução de pessoas, percebemos que quem ficou conseguia fazer mais do que ele mesmo produzia antes. Fizemos algumas fusões de áreas e com o auxílio da tecnologia tivemos velocidade para atender o aluno. E as pessoas começaram a ter atitude diferente. Para 2022 fizemos um orçamento mais baixo que anos anteriores, então o resultado que vamos entregar será melhor. A gente tem que tocar o negócio numa perspectiva de dono; as coisas funcionam melhor. E tomar decisão com esse pensamento. A Universidade de Fortaleza, uma instituição do estado do Ceará, está pronta para dar salto de qualidade e fornecer mão de obra para tempos transformadores.”

 

Grande problema é a queda da receita líquida

 

FECAP (Taiguara Langrafe*) | “O que me preocupa é a questão receita líquida, um problema do setor. A prefixação muito baixa precisa ser acompanhada. Outra questão é se o EAD é compatível com perfil de aprendizagem. O que a gente vê é que grande parte faz porque é mais barato, mas não tem aptidão técnica para aquilo e isso pode ser um problema. Isso nos ajudou a ajustar a qualidade e aí fomos atrás de melhoria na metodologia.

A grave questão da queda da receita líquida se acentua quando se observa a escalada de preços na tecnologia. A tão decantada nuvem como repositório já era discutida, mas aí na pandemia muita gente migrou com custo alto. Enfim, esse problema do custo tecnológico é grande, porém, uma outra situação encaminhada é a questão da mentalidade digital. A pandemia forçou a adaptação mesmo de professores que tinham total ojeriza ao EAD. Experimentaram e muitos gostaram da situação de conduzir atividade online. E isso entrou no nosso tecido social, não só na educação, mas na sociedade como um todo. Então como legado fica uma adaptação.

Gostaria de falar de uma particularidade da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado), que é a escola de nicho, num ambiente ultracompetitivo. Quando foi decidido o lockdown, imediatamente fomos atrás de um modelo para a transição, escolhendo o Zoom, depois de pesquisa com as escolas de nicho do mundo. Não fizemos redução de mensalidade, porque trabalhamos no equilíbrio e durante a pandemia traduzíamos o demonstrativo financeiro para a comunidade. Somos uma instituição sem fins lucrativos e com cerca de 4 mil alunos.

Para uma escola de nicho, a vivência no campus é muito importante, por isso nos preparamos na época para um retorno a qualquer momento. E por essa estratégia bem-sucedida acabamos sendo premiados no Instagram com posts favoráveis dos alunos, coisa que nos surpreendeu. Quem não respondeu tão rápido, ou teve redução de qualidade, enfrentou questões sobre a imagem da instituição.

Ocupo posição estratégica na Fecap, mas toda segunda e terça à noite sou professor de graduação. E minha maior surpresa foi que tive 100% de presença nas aulas, coisa que no presencial nunca aconteceu. Não houve desculpa para fugir da aula. E pude ver a ânsia dos estudantes para estarem no laboratório, no campus, no relacionamento social. Acho que essa experiência provoca pontos de reflexão sobre a expectativa do aluno hoje.”

 

Jeferson Vinhas Ferreira é CFO da Unicesumar, doutor em administração de empresas pela PUC-SP e visitor scholar na Leuphana University (Alemanha). Também é vice-presidente do FinancIES e do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Paraná (IBEF-PR), professor de MBA na FIA-SP. Atua há 20 anos no mercado de educação superior.

Alexandre Fernandes, diretor administrativo financeiro da Unipar, fez administração de empresas e pós em gestão de negócios, pela Universidade Braz Cubas, com MBA em finanças pelo Ibmec. Atua há quase 15 anos no ensino superior, foi professor no GITIES do módulo de Gestão Financeira e Indicadores de Performance pela ATMÃ Educar.

Alan Sales da Fonseca é doutorando em educação, mestre em administração, especialista em gestão de negócios e economista. Alan Sales da Fonseca atua há 15 anos no segmento educacional. É CFO do Centro Universitário Integrado de Campo Mourão. Professor de gestão estratégica, finanças corporativas e públicas.

Jefferson Candido é gerente administrativo financeiro, com 20 anos de experiência no setor. Tem mestrado em administração e MBA na área de gestão e MBA em formação de executivo com módulo na Wharton School.

Taiguara Langrafe é vice-reitor da Fecap e presidente do FinancIES. Doutor em Administração pela FEA-USP, é conselheiro do CRA-SP, EQUAA e ANGRAD.

Matéria publicada originalmente na edição de jun/julho de 2022 da Revista Ensino Superior. Assine.

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Redação


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