Educação

Colunista

Glauson Mendes

Mentor em Marketing Educacional

Além da eficiência: estratégias de eficácia e efetividade para inovação

Em meio à transformação do mercado, instituições de ensino superior privado têm a oportunidade de repensar seus modelos de gestão, aplicando uma abordagem multidimensional para fomentar a inovação. Embasados por indicadores e métricas pertinentes, exploraremos o impacto desses conceitos no crescimento sustentável e no aperfeiçoamento do desempenho organizacional.

Além da eficiência Por trás de projetos bem-sucedidos, existe um grupo de seres humanos engajados e motivados (Foto: Freepik)

Tendência de queda no número de candidatos, financiamento estudantil limitado, instabilidade nas ações de empresas do setor, concorrência crescente e diversificação de ofertas. Custos de captação cada vez mais altos, guerra de preços, elevada taxa de evasão e mudanças no perfil dos ingressantes. Com orçamentos encurtados e despesas operacionais em ascensão, a avaliação cuidadosa entre eficiência, eficácia, efetividade e, sobretudo, a eficiência ineficaz, ganha relevância.

Eficiência, essa palavra encantadora, tornou-se a musa das reuniões e a diva das sprints de projetos. É o canto da sereia que hipnotiza. Essa busca desenfreada pela otimização de recursos e a realização do milagre de fazer mais com menos, sem comprometer a qualidade dos resultados, tornou-se o mantra da gestão moderna. Mas será que a adoração a esse ser supremo nos leva ao caminho certo?

A eficiência, embora sedutora, trata de otimizar os recursos disponíveis. Entretanto, a verdadeira questão reside em não comprometer a qualidade dos resultados. O desafio se apresenta na parte “sem comprometer a qualidade dos resultados“, que é uma armadilha escondida, percebida apenas pelos gestores verdadeiramente estratégicos. Mas antes de esmiuçarmos o valor da eficiência (e ele existe), vamos explorar os demais conceitos.

A eficácia é o irmão do meio e menos sisudo da eficiência, mais preocupado com o resultado do que com o processo em si. Refere-se à capacidade de atingir os objetivos traçados, independentemente dos recursos utilizados, que estrategicamente devem ser definidos durante a etapa de planejamento. Ser eficaz é cumprir o que foi proposto, mesmo que, em alguns momentos, signifique investir mais recursos.

 

Revista Educação: Inovação como aliada e não rival da educação

 

Mas o que acontece quando a busca pela eficiência sacrifica a eficácia? Surge, então, a eficiência ineficaz, um paradoxo de escolhas equivocadas que nos obriga a retrabalhar e investir ainda mais para alcançar os objetivos iniciais. Uma criatura híbrida, que nasce quando a redução de custos, tempo ou recursos se torna tão intensa que o resultado esperado se perde no caminho. Mas fique em paz: o projeto foi realizado. Se está trazendo o resultado esperado ou não, é outra história. “A liderança do projeto que lute para se justificar nas reuniões de avaliação de resultados”, diria um jovem da geração Millennium. 

Mas eis que surge a efetividade, o caçula, porém mais maduro e ponderado da família, o equilíbrio perfeito entre eficácia e eficiência, um conceito que promete atender às demandas do presente e do futuro, através da otimização contínua e da melhoria constante. Ser efetivo é alcançar os objetivos propostos de forma otimizada, utilizando menos recursos possíveis e mantendo a qualidade dos resultados.

Dominar e aplicar estrategicamente esses conceitos permitirá que as IES melhorem seus indicadores de crescimento sustentável, hoje e no futuro. A questão, então, não é se deve-se buscar eficiência, eficácia ou efetividade, mas em como aplicar cada um desses conceitos de maneira estratégica e balanceada.

Para ilustrar a aplicação prática desses conceitos, tomemos o exemplo de um novo processo de recrutamento e seleção em uma IES, que pode elucidar a diferença entre eficiência, eficácia, efetividade e eficiência ineficaz:

 

– Eficiência no recrutamento e seleção:

A IES investe em tecnologias e ferramentas digitais, reduzindo o tempo gasto no processo, mas sem garantir a contratação do profissional mais qualificado.

O investimento em tecnologias e ferramentas digitais pode envolver custos iniciais na aquisição de softwares e capacitação de funcionários. Esse investimento tem como objetivo reduzir o tempo gasto no processo e otimizar a alocação de recursos no longo prazo. A busca aqui está ligada a reduzir ao máximo o tempo de contratação, não necessariamente contratar o profissional mais qualificado para a vaga.

 

– Eficácia no recrutamento e seleção:

A IES investe em marketing e divulgação, atraindo uma ampla gama de candidatos qualificados, mesmo que isso custe mais tempo e recursos.

O investimento é voltado para a divulgação das vagas e promoção da marca empregadora, por exemplo. Isso pode exigir um investimento maior em marketing e publicidade, além do tempo necessário para desenvolver e implementar uma estratégia de divulgação eficaz. O retorno desse investimento se traduz em um processo seletivo mais assertivo e na contratação de profissionais mais qualificados. A busca foi pela maior abrangência em termos de quantidade de profissionais qualificados, não necessariamente em tempo ou recursos financeiros aplicados.

 

– Efetividade no recrutamento e seleção:

A IES investe no alinhamento dos profissionais contratados à sua cultura e objetivos, proporcionando programas de integração e capacitação, buscando o maior retorno do investimento em pessoas.

O investimento em efetividade está mais relacionado ao tempo e esforço dedicados a garantir que os profissionais contratados estejam alinhados à cultura e aos objetivos da IES. Isso pode envolver o desenvolvimento de programas de integração e capacitação, realizados paralelamente com ações para melhorar o ambiente de trabalho e engajamento dos colaboradores. O retorno desse investimento é percebido no longo prazo, por meio do engajamento e satisfação das equipes e melhor desempenho organizacional. A busca foi pelo maior retorno sobre o investimento em pessoas.

 

– Eficiência Ineficaz no recrutamento e seleção:

A IES implementa um processo ágil e econômico, mas corta tanto os investimentos em recursos que falha em identificar e contratar profissionais realmente qualificados e alinhados à organização. O projeto pode estar concluído, mas, frequentemente entrega resultados indesejados ao invés dos esperados.

Embora seja difícil quantificar precisamente o tempo, dinheiro e recursos investidos em cada exemplo acima, podemos inferir que o investimento em eficácia pode demandar mais recursos financeiros, enquanto a efetividade pode exigir um investimento maior em tempo e esforço humano, além de financeiros na proporção da qualidade desejada. A eficiência, por sua vez, envolve um investimento inicial, mas com o objetivo de otimizar recursos e reduzir custos operacionais no futuro. A eficiência ineficaz, por outro lado, resulta em uma abordagem que visa economizar tempo e recursos, mas sacrifica a viabilidade dos resultados.

 

São exemplos simples de aplicação. Sugiro que faça o exercício com projetos reais de sua instituição de ensino e avalie qual dos conceitos foi aplicado.

 

Qual dos conceitos devo aplicar e em que momento?

 

Não existe certo ou errado na aplicação desses conceitos, o que importa é o domínio e sua aplicação estratégica no âmbito organizacional do portfólio de projetos e processos da IES. (*1) 

A adoção de uma abordagem multidimensional, que leva em conta os objetivos de longo prazo, a realidade e cultura de cada instituição, ampliam as possiblidades de garantir que as metas sejam alcançadas de maneira sustentável e com impacto positivo na qualidade das entregas e nos resultados das diversas partes envolvidas. 

O ponto de reflexão que apresento é que propor e avaliar tudo de maneira linear, baseando-se unicamente em medidas de eficiência, constitui um risco gerencial desnecessário e que pode ser evitado.

Mas como assim, pode ser evitado? Vejamos: escolha um projeto ou processo qualquer que foi implantado na instituição. Ou ainda, um produto, como um curso novo de graduação ou uma nova modalidade de ensino.

Em seguida faça as seguintes perguntas: Após um período, esse projeto ou processo entregou os resultados esperados ou planejados? Para que os objetivos ou resultados inicialmente propostos sejam atingidos, existe necessidade de refação total que, por sua vez, exigirão grandes investimentos? Os resultados foram atingidos total ou parcialmente satisfatórios, e existe necessidade apenas de investimentos de manutenção visando aspectos de melhoria contínua?

Com base nas respostas, sustentadas por evidências, avalie qual dos conceitos foi praticado e tire suas próprias conclusões. Se houve um planejamento e análise adequados no início do projeto, muitos desses riscos gerenciais foram identificados e evitados.

 

Por um capricho do destino, a eficiência tornou-se o amado incontestável

 

Como se fosse o primogênito favorecido em uma família de três irmãos talentosos, a eficiência se estabeleceu como o amado incontestável, ofuscando a eficácia e a efetividade. 

A busca pela eficiência nas instituições de ensino superior brasileiras tem suas raízes fincadas na Reforma Universitária de 28 de novembro de 1968, instituída pela Lei 5.540. Assim, as estruturas administrativas das IES foram originalmente concebidas para serem hierárquicas, setoriais e avaliadas por indicadores de eficiência. E cá estamos, 55 anos depois, ainda sob o domínio do irmão mais velho, enquanto os outros dois enfrentam obstáculos para terem suas contribuições reconhecidas e valorizadas. Sempre existe a causa raiz. 

Entretanto, as reviravoltas tecnológicas, sociais, políticas, econômicas e comportamentais que permearam o cenário desde então, aceleraram a obsolescência dessas rígidas estruturas e esquemas de planejamento. Tal como observado por Lopes e Bernardes (*2), é notável o abismo entre o progresso do conhecimento e sua incorporação aos programas e à gestão universitária. As universidades brasileiras ainda buscam um paradigma de estrutura administrativa que seja eficiente e eficaz em sua essência. 

Minha hipótese é que a solução não está em mudar a estrutura, mas sim na mudança de mentalidade, abraçando a perspectiva do aluno e da instituição, considerando o presente e, especialmente, o futuro. 

 

Mas qual é o verdadeiro segredo por trás desses conceitos?

 

A resposta está nas pessoas. Esse é o ponto máximo de atenção, já que muitas vezes a dimensão humana é subestimada em discussões sobre eficiência e otimização de recursos.

Por trás de projetos bem-sucedidos, existe um grupo de seres humanos engajados e motivados, que compreendem o propósito de suas ações e responsabilidades. A conscientização, que precede qualquer ação colaborativa, é a premissa fundamental de qualquer mudança. É o tal do comece pelo “porque”, para ser direto.

O elemento-chave na aplicação desses conceitos são as pessoas. São elas que produzem os resultados em uma organização, e sempre serão. As tecnologias são meios ou partes da solução, mas é o entendimento e o engajamento das pessoas que geram os melhores resultados.

Ocorre que enfrentar os desafios inerentes ao gerenciamento de pessoas, que surgem durante a jornada, é o que temos para hoje. E para o futuro também. No clássico “A Quinta Disciplina: A Arte e a Prática da Organização que Aprende” (*3), Peter Senge oferece uma alternativa à adoração exclusiva da eficiência. Ele propõe a criação de organizações que aprendem, capazes de se adaptar e inovar continuamente, adotando práticas como o domínio pessoal que envolve o desenvolvimento individual; os modelos mentais que se referem a percepções e crenças; a visão compartilhada que alinha objetivos individuais e organizacionais; a aprendizagem em equipe que promove a colaboração; e o pensamento sistêmico que foca nas inter-relações entre partes e o todo.

 

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A busca pelo equilíbrio entre eficiência, eficácia e efetividade nas IES é um processo contínuo. As características particulares do ensino superior tornam a gestão e a otimização de processos um desafio único, que exige abordagens específicas e adaptadas ao segmento. Implemente programas de capacitação que permitam a correta conceituação e aplicação desses conceitos e seus indicadores junto aos colaboradores. Essa atitude permitirá que todos compreendam as razões por trás das mudanças propostas, proporcionando significado e segurança nas equipes. As pessoas vivem melhor quando sabem por que fazem o que fazem, e esse é um elemento motivador para o desempenho de suas funções.

Ao abraçar e celebrar essas ambiguidades, todos os envolvidos – professores, colaboradores, gestores e outros membros da comunidade – reconhecem a importância de valorizar a especificidade desse ambiente e trabalham juntos para superarem os desafios e promoverem a excelência em todos os aspectos do funcionamento da instituição em que atuam. Nesse local, onde muitas vezes passam mais horas do que em suas próprias casas, cultivam paixão, dedicação e amor à educação. É esse comprometimento que me faz celebrar a educação com a mesma intensidade que os mineiros, como ouvi certa vez: “Educação é uma cachaça!”. Não bebo, mas entendi o sentimento por trás dessas palavras e compartilho dessa paixão; pela educação.

 

Para saber mais:

 

(*1) MENDES, G.M. Miopia: Uma obra sobre o desenvolvimento de Cientistas da Permanência de Alunos, Bragança Paulista: Yesbooks, 2022.

(*2) LOPES, L. A. C.; BERNARDES, F. R. Estruturas Administrativas das Universidades Brasileiras. Finep – Inovação e Pesquisa, Rio de Janeiro, 2005.

(*3) SENGE, P. M. A Quinta Disciplina: Arte e Prática da Organização que Aprende. Rio de Janeiro: Best Seller, 1990.

Por: Glauson Mendes | 05/05/2023


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