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O futuro das instituições de ensino superior pequenas passa pela cooperação

Este é o momento de repensarmos o modelo de negócio e criarmos confiança para nos transformar

Publicado em 23/05/2020

por Fábio Reis

cooperação Imagem: reprodução

Tenho participado de muitas reuniões e ouço constantemente os gestores de instituições de ensino superior manifestarem sua apreensão com a sustentabilidade financeira da sua instituição. É iminente a chance de um colapso financeiro, especialmente nas de pequeno e médio portes, que não apresentam oportunidades de economia de escala.

Leia: O que explica o sucesso das redes de colaboração

A inquietação com a sustentabilidade financeira é legítima e necessária. O proprietário, a família ou a associação que mantém a IES tem que salvar o negócio. Neste momento, não precisamos ter pudor em escrever ou falar em salvar o negócio, pois estamos vivenciando uma crise financeira e política no contexto da Covid-19. O cenário é preocupante e o futuro é incerto. Conseguimos projetar o amanhã, ou mesmo a próxima semana. Para qualquer setor da economia, enfrentar a pandemia e a crise política representa um esforço de reflexão e planejamento sem precedentes.

ensino superior cooperação
College of Saint Benedict compartilha cursos, bibliotecas, gestores, responsáveis por matrícula e pelo financiamento estudantil

Os que tomam as decisões nas IES estão utilizando as medidas provisórias e outras legislações para rever salários, jornada de trabalho, entre outras atitudes que se justificam. Todavia, a reflexão sobre mudanças acadêmicas efetivas como respostas à atual realidade desfavorável é incipiente e está quase ausente dos nossos debates cotidianos. Não há discussões consistentes. Temos gestores que, finalmente, vão investir no mundo da educação virtual, outros vão ampliar o uso do EAD de 20% para 40%, e há os que, provavelmente, ainda não possuem um plano.

No momento em que a pandemia foi evidenciada no Brasil, passamos do ensino presencial para o ensino emergencial remoto. Provavelmente, vamos partir para um ensino remoto mais planejado e resiliente. Mas o que isso significa? Muitos não sabem responder. Aprendi com meus erros que não basta planejar o modelo de ensino e aprendizagem. O planejamento da aula é uma etapa posterior à transformação da concepção acadêmica da instituição. Modificar o modelo da aula é fazer uma mudança incompleta, com pouca sustentação de longo prazo.

O que proponho? A efetiva cooperação, uma atitude que representa disrupção, pois o gestor está acostumado a pensar “na minha IES”. Proponho que as instituições pensem na fusão de alguns setores administrativos e acadêmicos que possam desempenhar a mesma função para uma, duas, três ou mais IES. Proponho que paremos de fazer compras individuais e passemos a fazer compras coletivas. Sugiro o imediato compartilhamento de disciplinas e bibliotecas virtuais.

Provavelmente, há vários mantenedores pensando em como vão pagar as contas de forma isolada. Podemos estar planejando investimentos em tecnologias, em elaboração de conteúdos virtuais ou na contratação de alguma empresa ou consultoria que traga as soluções demandadas. Parem com isso! Façam parcerias com outras instituições de ensino superior, cooperem.

É óbvio que cooperação e fusão dependem da revisão do modelo de negócio e da criação de confiança entre as pessoas envolvidas. Esse é o momento de repensarmos o modelo de negócio e criarmos a confiança necessária. Não é mais possível sonharmos com o retorno do período anterior à pandemia, dos tempos da abundância do Fies ou das altas taxas de matrícula. É preciso apertar o botão reset.

Quando comecei a estudar gestão do ensino superior, uma das primeiras lições que aprendi foi: tome decisões a partir das evidências. É uma lição aparentemente simples, mas de difícil incorporação em nosso setor educacional. O que importa aqui é afirmar que há evidências de que fusões e redes de cooperação realmente funcionam.

Leia: Consultoria em tempos de pandemia: o primeiro passo para enfrentar o problema é criar um comitê de crise

instituições de ensino superior cooperação
Saint John´s University: reexaminar tudo que era feito em momentos de abundância de recursos (foto: Shutterstock)

A rede de cooperação Sistema Universitário da Geórgia é formada por 26 instituições de ensino superior e foi constituída em 1931. Em 2018, matriculou mais de
320 mil estudantes. O vice-chanceler do Sistema, John Funchko, afirmou que foi preciso, de maneira forçada, reexaminar tudo que era feito em momentos de abundância de recursos. Não há um Provost ou CFO ou CIO para cada instituição. Houve um ganho de eficiência que permitiu, inclusive, a fusão de IES, a diminuição do pessoal administrativo e diversos compartilhamentos, tudo ao mesmo tempo, e o sistema investiu em Big Data para melhorar as análises de performance. Para Funchko, a crise (diminuição dos investimentos públicos, baixa captação de novos estudantes, aumento dos custos operacionais, entre outros fatores) trouxe oportunidades de fazer transformações que os tempos normais não exigiriam. Para ele, os resultados efetivos devem-se aos líderes do sistema educacional, que foram capazes de enxergar as mudanças que estavam por vir. Em 2018, o resultado da economia foi de US$ 32 milhões.

College of Saint Benedict e Saint John´s University são duas instituições católicas, de Minnesota, com infraestruturas separadas, mas que compartilham cursos, bibliotecas, gestores responsáveis pela matrícula e pelo financiamento estudantil.

As IES estão avançando no compartilhamento do backoffice, que dá suporte aos cursos de graduação e pós-graduação. As duas instituições desenharam as estratégias para 2020 de forma conjunta, com o objetivo de melhorar a oferta acadêmica e tornar os serviços e as próprias IES sustentáveis financeiramente, com capacidade de sobreviverem em um contexto de crise.

The Claremont College é um consórcio que nasceu em 1925. É formado por sete instituições privadas de pequeno porte. O conjunto das instituições não possui mais que 8 mil estudantes e 3,6 mil professores e técnicos administrativos. São instituições focadas na qualidade e flexibilidade acadêmica, no relacionamento cuidadoso com os estudantes e em atividades que tenham impacto na sociedade. Há compartilhamento de serviços de saúde, de telecomunicações, de laboratórios e outras infraestruturas, de gerenciamento patrimonial e, obviamente, cursos que permitem a mobilidade de estudantes. Em toda a região de Claremont, o consórcio gerou um impacto de mais de US$ 700 milhões na economia.

Há diversos exemplos de sucesso de redes e consórcios. O fato é que não basta cortar custos e rever contratos no dia de hoje ou de amanhã. É preciso, ao mesmo tempo, construir o futuro da instituição. Então, desenhe e planeje a sua instituição para o que está por vir, mesmo que sejam cenários. Tenha em mente um modelo institucional sistêmico nas dimensões administrativa e acadêmica. Não se deixe levar pelo vento. Seja protagonista da mudança em tempos de incertezas. Para ter mais chance de sobreviver às diversas crises que estamos enfrentando, valorize os seus talentos, planeje fusões no que for possível e participe de redes de cooperação.

Eu acredito em redes e sugiro que as instituições de ensino superior se integrem a projetos como a MetaRed Brasil, o Consórcio Sthem Brasil e as Redes de Cooperação do Semesp. E que façam a adesão se acreditam na cooperação efetiva, não apenas para divulgar que estão em uma determinada rede.

*Fábio Reis é diretor de Inovação e Redes do Semesp, secretário executivo da MetaRed Brasil, presidente do Consórcio Sthem Brasil e professor do Unisal.

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Autor

Fábio Reis


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