Inovação

Colunista

Marina Feferbaum

Coordenadora do CEPI e da área de metodologia de ensino da FGV Direito SP

Bem-estar na educação

Levantamentos apontam para um adoecimento psicológico significativo na comunidade discente, podendo-se falar até mesmo em “crise” ou “epidemia”

Bem-estar dos alunos

Por Marina Feferbaum e Clio Nudel Radomysler

A saúde mental dos estudantes na educação superior não anda bem. Levantamentos apontam para um adoecimento psicológico significativo na comunidade discente, podendo-se falar até mesmo em “crise” ou “epidemia”. Ainda que a instituição de educação não seja um centro de saúde, ela precisa cuidar desse problema. Nesse sentido, a International Bar Association (IBA) lançou suas “Diretrizes Internacionais para o Bem-Estar na Educação Jurídica”. São diretrizes amplas, aplicáveis também a cursos não jurídicos.

O problema da saúde mental tornou-se grande demais para ser ignorado. Levantamentos da American College Health Association realizados em 2016 já apontavam que, no ano anterior à pesquisa, 60% dos estudantes sentiram ansiedade intensa e 40% apresentaram sintomas depressivos [1]. Números bastante expressivos que também se relacionam com outra realidade, qual seja, de que estudantes da educação superior sofrem mais de problemas de saúde mental que a população em geral [2].

Além do problema em si, o adoecimento psicológico também afeta a concentração e o engajamento discente, comprometendo a qualidade da formação. Os efeitos são ainda mais agudos nas minorias raciais/étnicas, pois experiências de discriminação contribuem negativamente para saúde mental, aumentando, portanto, a quantidade de fatores de adoecimentos psicológicos [3].

 

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Há, ainda, um crescente desconforto no convívio. Um relatório recente da Constructive Dialogue Institute revela que 45% dos estudantes têm medo de expressar suas opiniões por receio de ofender colegas ou serem “cancelados” [4]. Do ponto de vista do sentimento de ofensa, o relatório indica que 25% dentre os estudantes universitários se sentem ofendidos pelas perspectivas compartilhadas por seus colegas. Esse cenário destaca a necessidade de promover um ambiente de convivência respeitosa e inclusiva, onde diferentes perspectivas possam ser debatidas sem medo de represálias, em que o dissenso não discriminatório é reconhecido e valorizado como um aspecto central do espaço universitário.

Ciente da gravidade do problema, a IBA elaborou suas “Diretrizes Internacionais para o Bem-Estar na Educação Jurídica” [5]. Baseados na pesquisa e no relatório inovador da Comissão de Bem-Estar da IBA em 2021, as diretrizes compreendem dez recomendações para promover o bem-estar nos cursos de direito, a seguir adaptadas para outros cursos da educação superior:

(i) reconhecer a importância do bem-estar na educação e promovê-lo ativamente; (ii) abandonar a visão de que questões de bem-estar devem ser vistas como sinais de fraqueza; (iii) promover a conscientização sobre as diferentes maneiras de abordar e priorizar o bem-estar na educação superior; (iv) comprometer-se com mudanças duradouras e baseadas em evidências para enfrentar os desafios de bem-estar na educação superior; (v) avaliar continuamente a eficácia das mudanças e iniciativas projetadas para promover o bem-estar; (vi) garantir que políticas e procedimentos dentro da educação superior reflitam a importância do bem-estar dos alunos, professores e funcionários; (vii) promover um diálogo aberto entre alunos, professores e funcionários, incentivando uma cultura de confiança e inclusão; (viii) comprometer-se a enfrentar problemas sistêmicos, como competitividade excessiva e falta de empatia; (ix) reconhecer as interseccionalidades, incluindo os benefícios para o bem-estar ao abraçar a igualdade, diversidade e inclusão; e (x) compartilhar exemplos de boas práticas em um diálogo contínuo, tanto internamente quanto externamente.

 

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A visão da IBA sobre o assunto é principalmente estratégica: fomentar o bem-estar da comunidade universitária para garantir uma formação de qualidade e, por conseguinte, formar profissionais melhores. Suas recomendações, que não se restringem a cursos de direito, podem ser seguidas por todos. Um dos primeiros passos para a academia enfrentar esse problema, sem dúvida, é cuidar de sua comunidade.

 

Referências

[1] ALBRIGHT, J. N., & HURD, N. M. Activism, social support, and trump-related distress: Exploring associations with mental health. Journal of Diversity in Higher Education, 16(1), 1, 2023

[2] LUU, Xuan; KEILAR, Christa; PARAS, Lorraine; TAVENER, Meredith; JAMES, Erica L.; JOHNSON, Natalie A. How do setting-level changes in universities affect mental health and wellbeing? A systematic mixed studies review. Mental Health & Prevention, v. 34, 2024. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.mhp.2024.200338

[3] ALBRIGHT, J. N., & HURD, N. M. Activism, social support, and trump-related distress: Exploring associations with mental health. Journal of Diversity in Higher Education, 16(1), 1, 2023

[4]  CONSTRUCTIVE DIALOGUE INSTITUTE. Free Speech and Inclusion: How College Students Are Navigating Shifting Speech Norms, 2023. Disponível em: https://constructivedialogue.org/articles/collegesurvey. Acesso em: 02 de set. 2024

[5]  IBA, 2024, https://www.ibanet.org/The-IBA-Professional-Wellbeing-Commission-launches-International-Guidelines-for-Wellbeing-in-Legal-Education

Por: Marina Feferbaum | 17/10/2024


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