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NOTÍCIA
Documento traz orientações e ferramentas para fomentar a cultura de autorreflexão relacionada à equidade, diversidade e inclusão
Publicado em 20/01/2025
Com o objetivo de apoiar as IES brasileiras na tarefa de diminuir as barreiras que as mulheres enfrentam no mundo acadêmico, o Consulado Britânico publicou o Marco referencial para a igualdade de gênero em instituições do ensino superior. A iniciativa insere-se no “Programa mulheres na ciência” da entidade, criado para aproximar instituições do Brasil e Reino Unido na realização desse objetivo.
A publicação foi inspirada no Athena Swan Charter, um framework criado na Inglaterra há vinte anos, atualmente referência no mundo, que incentiva o avanço das mulheres nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia, matemática e medicina (STEMM). No Brasil, foi elaborado após workshops com IES brasileiras e britânicas participantes do edital Women in science: UK-Brazil gender equality partnerships. Na versão local, estão no foco o enfrentamento das desigualdades de gênero e raça, sobretudo a sub-representação que mulheres negras, indígenas, quilombolas, entre outras, enfrentam em STEMM.
De maneira mais ampla, a utilização de orientações e ferramentas contidas no marco referencial pode fomentar a cultura de autorreflexão relacionada à equidade, diversidade e inclusão, com base em evidências, por meio da coleta e análise de dados quantitativos e qualitativos. A tarefa não é fácil, mas necessária.
A desigualdade de gênero é um desafio no mundo todo. No relatório Progresso nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: O Panorama de Gênero 2024, divulgado em setembro de 2024 pela ONU Mulheres e o Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas, aponta avanços, porém, evidencia que nenhum dos indicadores e subindicadores do ODS 5, relativo à igualdade de gênero, foi alcançado até agora.
Entre os avanços, o fato de as mulheres já conseguirem ocupar cadeiras nos parlamentos na proporção de uma mulher para quatro cadeiras. Outro dado, o de que o número de meninas e mulheres vivendo em extrema pobreza decresceu 10% na última década. Entretanto, os mesmos dados apontam o vagar com que a sociedade avança: a paridade de gênero nos parlamentos talvez não seja alcançada sequer na segunda metade deste século – a ONU menciona a impossibilidade até 2063. E meninas e mulheres poderão todas sair da pobreza em absurdos 137 anos.
O marco referencial é um apoio para a construção de uma política, um programa para a igualdade de gênero. A implementação, entretanto, tem muitos desafios. “Um dos primeiros requisitos para a implementação, seja de política de igualdade de gênero, seja de política antiassédio, que faz parte da política de igualdade de gênero, é ter apoio institucional da alta liderança. Não é só um ‘ok’, tem de ser uma liderança alinhada e ativa, que tem agência para implementar. Não precisa de fato implementar a política, mas tem de estar pronta para as mudanças que vão acontecer”, explica Roberta Gregoli, consultora internacional em gênero, inclusão social e direitos humanos.
Apoio institucional da alta liderança é fundamental nos programas para igualdade de gênero, afirma Roberta Gregoli, consultora internacional
Doutora pela Universidade de Oxford, mestre pelo programa Erasmus Mundus Crossways in Humanities da União Europeia e graduada pela Unicamp, Roberta trabalhou por dez anos em Brasília, atuando em diversas esferas do governo local, como no Observatório da Mulher contra a Violência do Senado Federal e a coordenação da Rede de enfrentamento à violência contra as mulheres do governo do Distrito Federal.
Foi consultora em órgãos internacionais como a ONU Mulheres, é uma das especialistas, junto à Cuidemos Consultoria e Treinamento, pela elaboração final deste marco referencial do Consulado Britânico.
Roberta alerta para as “políticas de vitrine”, em que instituições aderem a programas em função das demandas sociais ou porque “está na moda”. “Por exemplo, tem de ter uma política antiassédio, mas a instituição está preparada para implementar?” Sempre haverá resistência e mudar a cultura é um processo demorado. Especificamente as políticas antiassédio “envolvem questões muito delicadas, como exoneração ou demissão de pessoas, além de desgaste institucional. Eu até brinco que se estou trabalhando numa instituição e enfrento resistências é porque estou fazendo as perguntas certas.”
Apesar da complexidade, políticas antiassédio podem contribuir para a redução da violência contra a mulher. O último anuário da ONU Mulheres aponta que 51 mil mulheres foram mortas por seus parceiros ou membros da família em 2023. “Na Islândia, que é o país mais avançado em termos de igualdade de gênero, as mulheres ainda são mortas por serem mulheres.”
Roberta lembra que no Brasil há índices bons de acesso das mulheres à universidade e à educação em geral, entretanto, há um gap considerável no índice de desigualdade salarial. As mulheres brasileiras são maioria entre os mestres (56,8%) e doutores (55,6%), mas recebem 16,4% a menos, de acordo com a pesquisa “Brasil: Mestres e Doutores”, de 2024, divulgada pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), do Ministério da Ciência e Tecnologia.
“A grande questão é esta: as mulheres, no Brasil, são mais escolarizadas que os homens, têm mais anos de educação, conforme o IBGE, mas essa escolarização a mais não se reverte em remuneração igualitária.”
Para além de marcos regulatórios, são necessárias políticas públicas que deem conta dessas desigualdades, inclusive as específicas para o ensino superior. As barreiras são muitas. Em 2024, o CNPq alterou as regras para avaliação de projetos submetidos a bolsas em editais de pesquisa, concedendo o prazo de dois anos para cada parto ou adoção. Isso ocorreu após uma pesquisadora denunciar, em redes sociais, que foi reprovada em edital para bolsa produtividade com a observação de que “as gestações atrapalham”. À época, o CNPq admitiu o erro.
Uma pesquisa britânica, conta Roberta, detectou outros problemas. “Na Inglaterra, por exemplo, o trabalho administrativo recai mais sobre os acadêmicos e acadêmicas. E as mulheres acabam absorvendo mais trabalho administrativo nos departamentos. Elaborar minuta de reunião e outras tarefas administrativas não se convertem em progressão de carreira, nem mais financiamento, nem ganhos remunerados. Elas ficam com menos tempo para a produção acadêmica, o que de fato dará mais status e remuneração.”
O resultado de tantas dificuldades, que também se impõem a estudantes e pesquisadores negros – e com mais intensidade em direção às mulheres negras –, pode ser entendido por meio de um conceito: o cano que vaza. “ Há índices muito parecidos de mulheres e homens na posição de entrada, ou seja, na graduação quando se observa o ensino superior ou nos cargos mais baixos em empresas. Daí há uma inversão, o ‘efeito tesoura’, e no final, nos cargos de liderança, a maioria é homem.” O cano estava cheio de mulheres e no percurso elas “vazam”.
Saber onde estão os furos na universidade é uma importante pergunta que cada IES pode tentar responder para si mesma. “Já há um mapeamento. Normalmente é o primeiro filho ou na mudança do mestrado para o doutorado. Os pontos de fuga já estão mapeados e identificados”, finaliza Roberta. Resta vencer as resistências.
Conheça o Marco referencial para a igualdade de gênero em instituições do ensino superior.